Astrogildo acaba de completar 50 anos, e desde os 15 vive isolado entre as serras do Parque Nacional da Chapada Diamantina, Bahia. Bem-humorado, contador de histórias e sempre com as rimas na ponta da língua, acompanhamos um pouco de sua rotina no seu isolamento de 35 anos.
O documentário de Felipe Carrelli é o segundo de uma trilogia chamada “Trilogia da Chapada”. O primeiro, intitulado Feijão (2018) conta a história de Jânio Gleidson Souza Rocha, conhecido como Feijão, que é guia turístico nativo da Chapada Diamantina. Feijão também assina a produção de Castelo Abandonado (2020).
Assim como a primeira parte da trilogia, Carrelli capta belas imagens do cenário que serve de lar para Astrogildo. Flora em seus diversos tons de verde, a neblina rente ao chão, as cachoeiras beijando as enormes paredes rochosas. Uma fotografia bucólica bem explorada. Conhecemos a rústica casa de Astrogildo, com um rochedo servindo de abrigo e sustento para troncos e cordas que criam ambientes. Já nos primeiros minutos o homem conta como veio parar ali, entre versos. Aos poucos, o cotidiano atípico – perante o nosso – vai se confundindo o que é improviso e planejamento. Rapidamente, vem a tona uma das maiores habilidades que o ser humano tem como espécie: a capacidade de se adaptar aos diversos lugares, mesmo que seja no moldar do ambiente que o cerca.
Tudo isso se resolve logo nos primeiros minutos do documentário, o tornando um pouco enfadonho. Não porque a vida de Astrogildo seja (pelo contrário. A riqueza de seu conhecimento renderia até mesmo uma boa série ou um filme mais longo), mas porque o longa se escora no grande banco de imagens da linda Chapada, com um fabuloso som! A medida que discorre, a impressão é que a câmera se torna menos íntima de Astrogildo, distanciando seus pensamentos da narrativa, afastando seus gestos e sentimentos. Não há uma exploração para adentrar na “Diamantina” que é aquele homem, sobrando somente cenas dele andando sobre o belo cenário. O filme mostra que Astrogildo também recebe visitas, como o próprio guia Feijão, e o tempo anterior a esse que podia caminhar pela sua solitude é desperdiçado.
Nesse segundo momento, o agora não tão isolado homem segue uma caminhada com seus semelhantes e o que resta é só um amontoado de mais cenas diamantinas com ou sem a presença dos caminhantes. O documentário perde a oportunidade de achar uma problemática (que existe, se procurar) para criar dinamismo na narrativa. Também peca em aflorar as sensações e emoções além do belo bucolismo, mas exaustivo.
Castelo Abandonado poderia nos presentear com um pouco dos 35 anos de sentimentos dentro da solidão de Astrogildo da Diamantina e/ou entender os percalços que fazem raros homens em adentrar nos Desertos-Florestas que afastam dos conceitos de civilização urbana. Resta esperar que a última parte da Trilogia da Chapada supere tais lacunas e nos dê algo que saia dos padrões de um “National Geographic”.
Castelo Abandonado encontra-se disponível para assistir no Festival FICA e no YouTube
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Passolargo é um nordestino armorial. Escritor, produtor de conteúdo, anticoach fuleragem profissional. É o rei dos memes, não pode ver uma rede que já quer deitar, um brega funk que já quer dançar e é o maior fã de Harry Potter que você vai conhecer (embora ele não assuma). O cinéfilo local mais arengueiro da internet.