Apesar de já ter uma carreira que conta com dez anos na direção de longas – iniciada com A Enviada do Mal (February, 2015) –, todos no campo do terror, Osgood Perkins, filho do lendário protagonista de Psicose (Psycho, 1960) Anthony Perkins, somente chamou a atenção do grande público ano passado com o controverso Longlegs – Vínculo Mortal (Longlegs, 2024), um misto de suspense policial com horror satanista que homenageia profundamente O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs, 1991) e que ficou marcado pelo visual e pela interpretação bizarros de Nicolas Cage.
Apesar de parte dos espectadores não ter abraçado totalmente o estilo do diretor – que é muito focado em resgatar o cinema de horror de décadas passadas, principalmente dos anos 1970 –, o filme fez sucesso suficiente para que os novos projetos de Perkins atraíssem uma curiosidade que normalmente não teriam, além de uma agilidade incomum na realização e lançamento dos filmes do diretor, que estreará duas obras somente este ano. Isso nos leva a este O Macaco (The Monkey, 2025), primeiro desses filmes – o segundo é Keeper (2025), já em pós-produção e previsto para o segundo semestre – e também a primeira vez que Perkins trabalha diretamente com uma adaptação, neste caso, do conto homônimo de Stephen King. Ainda que Maria e João – O Conto das Bruxas (Gretel & Hansel, 2020) não seja uma história original do diretor (obviamente), também não foi adaptado de nenhuma versão específica do conto de fadas, diferentemente deste O Macaco. Talvez por isso Perkins se mostre tão pouco à vontade aqui.
Em O Macaco, temos a história dos gêmeos Hal e Bill (Christian Convery na adolescência e Theo James na fase adulta), bastante diferentes entre si, com Hal sendo mais tímido e introvertido enquanto Bill é mais desbocado e age como um bully contra o irmão. Ambos vivem com sua mãe, Lois (Tatiana Maslany, completamente subaproveitada), após terem sido abandonados por seu pai (Adam Scott), um piloto de avião que era responsável por guardar o macaco de brinquedo do título, encontrado acidentalmente pelos irmãos no porão da casa em que vivem. Ao cederem à curiosidade e darem corda no brinquedo, eles descobrem que mortes horríveis (e aparentemente aleatórias) ocorrem quando o macaco para de tocar o tambor que o acompanha. Após uma tragédia que os atinge, só voltamos a ver os irmãos na fase adulta, distantes um do outro há anos, quando são obrigados a se reunirem com o ressurgimento do macaco e, consequentemente, das mortes.
Ao tentar casar seu estilo bastante particular, presente em todas as suas obras, no qual busca uma encenação rígida do horror, com enquadramentos bastante calculados, e um clima que pretende causar mais incômodo que o susto por si, com uma premissa típica do autor que adapta, cujo trabalho busca o horror no ordinário, o diretor se mostra indeciso sobre qual tom seguir, alternando entre o horror e a comédia de forma pouco orgânica, sendo parcialmente bem sucedido no primeiro – os sustos e, principalmente, todo o gore do filme são bem filmados – e extremamente equivocado no segundo. Não estou, com isso, dizendo que a junção de comédia com horror é problemática por si, ou que essa história em específico é prejudicada por essa escolha. Pelo contrário, a premissa de um macaco de brinquedo amaldiçoado, uma espécie de gênio da lâmpada do mal e voluntarioso, se presta a essa forma de enxergar a narrativa, visto o absurdo da situação. No entanto, Osgood Perkins não é Sam Raimi, só para citar um dos diretores que ele “homenageia” aqui (há uma sequência claramente inspirada no trabalho de Raimi, quando vemos a perspectiva do brinquedo em primeira pessoa). Suas tentativas de humor são constrangedoras, com piadas que parecem ter sido retiradas de um manual de como contar piadas (ruins) em um almoço de família. O mais estranho de tudo é que em nenhuma outra obra do diretor (que, como em todos os seus filmes, aqui também assina o roteiro) sinalizou para algo desse tipo, e se poder se reinventar é uma caraterística louvável, ter bom senso para saber até onde sua própria arte consegue ir também o é.
Se O Macaco não chega a ser um desperdício total isso se deve à dois elementos: o teor inesperado e criativo das mortes, essencial para este tipo de filme, com “acidentes” que trazem muito da atmosfera absurda da franquia Premonição; e a atuação de Christian Convery. Este, principalmente, saído do sucesso Sweet Tooth (2021 – 2024) da Netflix, consegue elevar a narrativa com atuações que dão vida aos gêmeos de forma bastante distintas, nos fazendo acreditar completamente que cada um é um indivíduo por si só. Infelizmente, sua presença só ocupa metade do filme. Quando é apresentada a fase adulta dos personagens, Theo James assume os papéis em um trabalho esforçado, mas bastante medíocre. O restante do elenco, à exceção de Tatiana Maslany, também fica à mercê do tom irregular do filme e, por isso, entregam performances esquecíveis. Maslany, como a atriz superlativa que é, consegue, ao lado de Convery, injetar um pouco de humanidade na história, trazendo à tona um dos temas caros ao diretor: as relações mãe-filho(s) e a ausência paterna. Entretanto, até essa abordagem soa falha e pouco coerente, ainda que seja apresentada como essencial para entendermos os protagonistas e seus problemas entre si.
Ao final, em função de seus problemas, o que poderia ser um horror marcante tanto por seu gore quanto por seu humor macabro, ao estilo Arrasta-me para o Inferno (Drag Me to Hell, 2009), por exemplo, torna-se apenas um passatempo esquecível e mais uma adaptação de Stephen King cujo potencial é desperdiçado.
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Cineasta e roteirista, formado em Letras e graduando em Cinema, respira literatura, filmes e séries desde que se entende por gente. É viciado em sci-fi e terror, e ama Stephen King, Spielberg e Wes Craven. Tem mais livros em casa, e séries e filmes no computador de que seria humanamente possível ler e assistir, mas não vai desistir de tentar. Não consegue lembrar o que comeu ontem, mas sabe decorado os vencedores do Oscar de melhor atriz do últimos trinta anos (entre outras informações culturais inúteis).