Psicose 60 anos – Um clássico do mestre dos clássicos

Há spoilers severos de um filme de 60 anos, mas se você ainda não viu Psicose o errado é você.

Para qualquer um que aprecia a Sétima Arte, há certos filmes que marcaram de alguma forma. Os favoritos são muitos, mas é inegável como conseguimos reconhecer a película apenas por um detalhe. Foram 78 takes e 52 cortes no processo — e que levou o documentário 78/52 ser lançado em 2017—, mas o resultado da cena de 45 segundos ao qual uma mulher foi esfaqueada enquanto tomava banho no chuveiro remete automaticamente a Psicose (Psycho, 1960), ainda que muitos não saibam sobre o que o filme realmente se trata — lembrou da cena ao som do efeito sonoro de Bernard Herrmann simulando as facadas? Era um violino.

Apesar de não ter sido seu primeiro trabalho, foi por conta do clássico de suspense psicológico que muitos passaram a conhecer mais o trabalho de Alfred Hitchcock. Bem além de ser aquele da cena do chuveiro, Psycho fez história ao restabelecer um conceito provocador, brutal cheia de nuances narrativas para o gênero do suspense, e a crítica não teve jeito senão abraçar o passo ousado do diretor.

A ideia para o longa veio depois que Alfred teve conhecimento da obra literária homônima de Robert Bloch, o qual trazia um personagem inspirado no caso do assassino Ed Gein. A partir daí, a confiança para meter a mão na massa era tanta que o cineasta adquiriu os direitos de adaptação por U$ 9,5 mil, ao passo que também ordenou comprar todas as cópias disponíveis do livro para que a história fosse totalmente surpresa no lançamento do filme. Mesmo com a Paramount tendo o pé atrás para investir na produção — afinal, topar o apoio a uma trama que a protagonista morreria no primeiro ato da narrativa, era arriscado — o diretor topou filmar o projeto com baixo orçamento e alinhar todas as técnicas possíveis para concebê-lo.

Câmeras e películas em preto e branco, 54 cortes memoráveis se tornaram traços fundamentais para a criação e reconhecimento do que o filme poderia transmitir. A história trazia Marion Crane (Janet Leigh), jovem mulher em fuga depois que decidiu roubar 40 mil da imobiliária no qual era secretária, para que assim pudesse pagar as dívidas do amante Sam Loomis (John Gavin). Ter se acomodado no único motel disponível na estrada foi a ideia mais agradável até decidir o que faria, porém o local contava com a administração tímida e otimista de Norman Bates (Anthony Perkins). A surpresa pior a moça recebeu ao ser esfaqueada enquanto tomava banho, ali mesmo, no seu quarto alugado. Por que a aparente mãe do rapaz agiria brutalmente contra alguém?

Assim, a narrativa que partiu de um ato calculado da secretária, tomava rumos diferentes ao causar no espectador indagações do que estaria acontecendo. Foi tudo muito rápido. Parecia bem simples: fugir ou ser pega, soava arrependida, mas foi atingida com o carma em pleno banho? Contudo, o que se revelaria ser o mote da discussão se via na sua reviravolta: a mãe não era a mãe e sim o filho, Norman.

Com isso, levou-nos a pensar: o que a timidez esconde? Se não se pode mais esperar bons exemplos de homens assim, como seria? O repouso de Marion no motel serviu como uma denúncia a uma versão ainda oculta do jovem rapaz que perdera a mãe há alguns anos e seguiu tocando o negócio que começaram. Para os moradores da região, os que o conheciam, ele era pacato, marcante pela gentileza. Mas longe do que poderia imaginar e superar tal aparência, Norman escondia o corpo da falecida mãe no porão do casarão que vivia, a qual ele mesmo matou. Porém, não só um defunto residia ali, mas a máscara para troca de personalidades que ele não dissociativa: por ciúme, “Norma” não permitia que o filho se envolvesse amorosamente com mulheres.

O que entrava a autorretratação comportamental da mãe, como se no profundo interior de se sua mente preservasse o caráter dominador e repreensivo materno, manifestado sempre que o elo que tinham como mãe e filho era ameaçado. Seria por esse motivo que decidiu não enterrar o corpo de Norma? Teria se fadado do controle dela a ponto de matá-la? 

Diante do retrato perturbador de Norman, Psicose se pôs a discutir os terrores por trás da mente humana, tão fundo que o limite não poderia estar sentado numa cadeira de balanço no porão. Com tanto potencial da obra, e o retorno na bilheteria que o estúdio subestimou, Alfred preservou o longa bem mais que as medidas anti-spoilers conseguiu, e sim consolidou o legado de um clássico.