Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania – Muito grande para a trilogia e muito pequeno para o UCM

Peyton Reed se consagra como o primeiro diretor da Marvel a dirigir uma trilogia completa de um personagem (lembrando que os filmes do Homem-Aranha são da SONY e não Marvel Studios) com o terceiro filme do Homem-Formiga, Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (Ant-Man and the Wasp: Quantumania). O filme encontra o protagonista, Scott Lang (Paul Rudd), agora como um famoso super-herói, após ter salvado o mundo ao lado dos Vingadores em Vingadores: Ultimato (Avengers: Endgame, 2019). Enquanto lida com a fama, o verdadeiro arco e foco do nosso personagem é ser pai, na verdade sempre foi este o objetivo principal do mesmo em seus dois outros filmes. 

Cassie Lang – interpretada nos filmes anteriores pela jovem Abby Ryder Fortson e por Emma Fuhrmann em Ultimato, agora ganha um novo rosto na atriz Kathryn Newton – é provavelmente o elo mais fraco do filme, em nível de atuação e não em arco de personagem, a jovem cresceu e seguindo os passos de seu pai decide ajudar as pessoas. É algo fortemente referenciado ao longo do filme anterior a este, quando a jovem Cassie fala frequentemente sobre se tornar parceira do seu pai. Bem, o desejo de ajudar as pessoas de Cassie gera alguns problemas e termina arrastando a família toda para o Reino Quântico. 

É exatamente aí onde o filme de verdade começa. Mas antes de abordar sobre o filme preciso falar sobre atualmente termos de pensar em obras do Universo Cinematográfico da Marvel (UCM) como parte de um universo, assim como filmes dentro de sua própria narrativa. 

Finalizando essa trilogia da história de Scott Lang, quem passou dois filmes como um fugitivo da lei, como um presidiário, agora sendo mundialmente conhecido como um herói é extremamente interessante. Como mencionado anteriormente temos aqui a continuação do seu arco, pois a história de Scott nunca foi sobre ser o Homem-Formiga, mas sim sobre ser um pai para sua filha. É essa a razão de suas escolhas por boa parte de suas aparições, ou ao menos dentro da sua própria franquia. A relação de Cassie com Scott é também o combustível para o personagem de Paul Rudd lembrar-se de seu desejo de ajudar aos demais. Mesmo com a atuação insossa de Newton, o arco de pai e filha funciona muito bem ao longo do filme.

Agora vemos a outra personagem titular do filme, a Vespa, e não estou falando da personagem de Evangeline Lilly, mas sim de sua mãe. A personagem Janet Van Dyne (Michelle Pfeiffer), a Vespa original (na verdade a única quando a franquia foi lançada, considerando que Hope foi criada para o MCU baseada em uma vilã de outro universo), havia sido colocada na geladeira para aprofundar a história de Hank Pym (Michael Douglas), e a heroína acabou sendo o deus ex machina do segundo filme da franquia. Após ser salva do Reino Quântico depois de 30 anos, Janet emergiu do mesmo com poderes e habilidades não explicadas e não mencionadas de novo. E nesse filme não nos aprofundamos em tais habilidades, apenas no seu tempo e história ao longo dos 30 anos no Reino Quântico. 

Se a história do terceiro filme brilha na relação de pai e filha, ela falta muito com a família Van Dyne em desenvolver esses laços. Embora passem parte do filme juntas, a relação entre Hope e Janet não tem muito desenvolvimento para brilhar. Isso não muda o fato de Michelle Pfeiffer ser, de fato, uma das protagonistas do filme, fazendo sua presença ser sentida ao redor dos multiversos. Afinal, sua relação antagônica com Kang (interpretado pelo magnífico Jonathan Majors) é exatamente o que move a trama. Se torna incrível termos uma mulher grisalha tendo cenas de ação como podemos ver Pfeiffer ao longo desse filme, algo que a indústria cinematográfica nos nega há muito tempo.

O visual do filme é de tirar o fôlego, tanto pelo impressionante CGI, quanto pela imaginativa mente por trás da criação daquele universo, um mundo todo dentro de um microscosmo, com seres bem diferentes daqueles conhecidos (e alguns bem parecidos, sem explicação alguma). A obra consegue nos apresentar uma subtrama para o Reino Quântico e a desenvolve sem roubar o foco e sem jogar as coisas (como feito em Thor: Ragnarok no planeta Skaar). Há importantes momentos ali, sobre a importância de lutar e de resistir, sobre como nenhum conquistador é absoluto e sobre o poder estar nas mãos do povo. Não, o filme não é sobre isso, mas consegue através de poucas cenas estabelecer a trama, seus personagens, e parecer fluído. 

Agora preciso me deter um pouco nos vilões apresentados no filme, sejam eles na forma do M.O.D.O.K. (Corey Stoll) ou de Kang, o Conquistador. M.O.D.O.K. parece totalmente saído dos quadrinhos, com toda a personalidade do personagem, sua prepotência e sua aparência incrivelmente tosca. Infelizmente o personagem não tem o desenvolvimento necessário, mas possui uma despedida bem justa. É engraçado como o personagem de Darren Cross que nos quadrinhos não é nada além de Darren Cross, pelo menos até a estreia do primeiro filme, já virou dois inimigos do Homem Formiga nos Cinemas. A Marvel tá muito a fim de economizar em vilões juntando o máximo de personagens possíveis em um só. O personagem traz um certo humor para o filme, que funciona até ao menos o terceiro ato, mas a cena final consegue gerar boas risadas. 

Servindo aqui como a sua segunda aparição numa obra da Marvel, Kang consegue ser um vilão de verdade, algo não tão presente ao longo dos filmes do Homem-Formiga, especialmente no segundo, com um escopo bem fraco de antagonistas embora até recheado. Sua crueldade é muito bem explorada pela história e pela direção do longa, e aqui entendo melhor a razão de Jonathan Majors ter sido escolhido para interpretar o personagem. Sua capacidade de atuação tem um ótimo alcance, especialmente levando em consideração os flashbacks que vemos do personagem com Janet e ele no presente. É interessante assistir ao Conquistador, mas o terceiro ato em sua grande parte não faz justiça ao vilão construído ao longo do filme.

Existe muito no universo dos quadrinhos da Marvel, muito no universo do Homem-Formiga, e Peyton Reed consegue dirigir três filmes com energias extremamente diferentes. Não apenas isso, filmes ocupando diferentes subgêneros guiados pela alma cômica e também pela importância da família. As vezes sim, Homem-Formiga e Vespa: Quantumania se beneficiaria muito de menos piadas escrachadas, mas é injusto ir assistir a um filme e esperar algo totalmente diferente de seus antecessores. Se um quarto filme vier, será a hora da franquia realmente amadurecer e crescer mais um pouco. 

O UCM está atualmente acabando com o UCM e é importante pontuar isso nesse filme em especial, pois o maior inimigo de Kang é ele mesmo. A forma como o filme perde muito por comparações a todos os outros filmes da Marvel ou então seu peso para o grande plano sendo construído é frustrante. Mas isso não é culpa de uma audiência apenas, mas do próprio estúdio que não se mostra disposto a permitir a suas obras serem obras por si próprias e apenas grande partes de um quebra-cabeça. 

As reclamações sobre o filme são muito mais sobre como o filme não impacta ao UCM no geral ou como o vilão principal da atual saga não foi forte o suficiente. Mais uma vez , a saga do protagonista sempre foi sobre ser forçado a ser Homem-Formiga pelo seu desejo de manter a sua família. Aqui é onde ele mais brilha ao longo dos filmes, talvez com os perigos maiores deste filme e também uma ditadura acontecendo seria necessário sim maior seriedade, mas isso não muda o fato de que desde o primeiro filme Homem-Formiga carrega muita comédia.  

Sempre tentando conectar as coisas como um quebra-cabeça termina retirando muito a experiência de ir ao cinema, assim como esse hábito educa as pessoas a não serem capazes de aproveitar uma obra por si (ou franquias próprias por si) mas ficam no grande UCM em vez disso.


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