Pudor. Palavra lembrada quando se trata de impor limites éticos, morais ou vistos como tabu na sociedade, e foi a primeira coisa que veio a mente enquanto assistia a esta película: se os produtores em Hollywood tivessem um pouco de pudor, teriam a vergonha de sequer escrever o roteiro de sequências, principalmente de filmes de terror. Em 2016, qualquer amante de terror foi atraído com a promessa de uma produção do gênero que prometia reinventar a roda no que dizia respeito a bonecos e bonecas. De fato, dando tiro no pé, Boneco do Mal (The Boy, 2016) conseguiu isso, para agora Brahms: Boneco do Mal II (Brahms: The Boy II, 2020) abraçar a contradição e ser tudo o que antecessor não quis ser: uma caixa de mesmice.
Com roteiro de Stacey Menear, quem voltou também para esta “continuação” foi o diretor William Brent Bell — e que não precise voltar mais vezes — fazendo (de novo) a promessa que teria algo assustador e inventivo por aqui, mas vejamos. Desta vez, acompanhamos uma típica família partir em uma mudança depois que Liza (Kate Holmes) e seu filho Jude (Christopher Convery) passaram por um trauma de violência na antiga casa, o que leva o pai Sean (Owain Yeoman) a considerar um novo lar. Precisa dizer para onde eles foram?
O engraçado aqui é a pressa que as coisas se organizam. Rapidamente o trauma: sem delongas o menino trata de achar o traste do boneco e ainda mais rápido coisas estranhas começam a acontecer em decorrência do bizarro Brahms estar com Jude. Não bastando as conveniências, apesar da falta de atmosfera tensa que só empobrece o filme, os jumpscares e a inserção de alucinações mal encaixadas, a coisa teve êxito de não ser chata de ser assistida. Mas um dos problemas no trajeto é que o público já conhece a história, ou ao menos, achava que sim.
No predecessor, um dos acertos foi espalhar a dúvida em Greta (Lauren Cohan) enquanto o público também só via o mesmo que ela. Aqui, o espectador vê o que Liza não vê, mas que Jude garante estar acontecendo. O bom do roteiro de Stacey é como a psicologia é usada em prol do terror de maneira inteligente, mas que infelizmente tem o infortúnio de ser sabotada antes do segundo tempo. No filme, vemos ser inserida a forma como o boneco pode ajudar Jude com o trauma sofrido e até a sugestão de que Brahms seria reflexo do menino, isto é, estaria o objeto de porcelana e característica medonha sendo culpado por reações que Jude vem expressando? Em outro dado momento é afirmado até que Brahms surge para pessoas mediante um choque emocional… O público poderia comprar isso se antes dos 30 minutos de duração já não tivéssemos certeza que tinha algo sobrenatural com o boneco.
Assim, seguimos essa estrutura de que Jude nada tem a ver com o que o boneco tem feito. Um acredita na inocência, outro não… história fortemente batida e é isso: estabeleceram regras, e depois quebraram, abandonando todo o conceito enfatizado anteriormente de que The Boy não era mais um derivado de brinquedos possuídos para ser o que se renegaram. O pior é que decidiram reformular, recriar a origem para cair no óbvio. Ao menos o elenco principal convence em meio a loucura genérica que se desdobra, e propositalmente escalaram um garoto semelhante ao boneco, enriquecendo essa tratativa de uma criança se unindo a psicopatia seguida de um trauma. Nos tornamos o que não negamos quando achamos uma faísca para o incêndio?
Mesmo ignorando a personagem de Greta do registro histórico de vítimas do Brahms, William Brent apelou para o final com reviravolta como se a história estivesse lá com essa moral e força para ser aplaudida. Se ainda não ficou claro pro cineasta após a recepção de antes, o fato é: plot twists não fazem um filme bom. Utilizar o recurso de câmera lenta (de novo) e uma bizarrice visual para elevar o conceito, não estava em sintonia com a ruindade que a produção é como um todo.
Em suma, Brahms: Boneco do Mal II só constatou o desespero hollywoodiano em apostar em sequências desnecessárias que não se conciliam. O que alivia o gosto amargo é ver que não colocaram uma cena pós-créditos indicando que o boneco voltará numa terceira trama forçada esquecendo o que já foi feito. Seria Boneco do Mal protagonista de uma analogia que quer ostentar por reviravolta?
Ama ouvir músicas, e especialmente, não cansa de ouvir Unkle Bob. Por mais que critique, é sempre atraído por filmes de terror massacrados. Sua capacidade de assistir a tanto conteúdo aleatório surpreende a ele mesmo, e ainda que tenha a procrastinação sempre por perto, talvez escrevendo seja o seu momento que mais se arrisca.