Crítica | The Last of Us – 1×06: Kin

Três meses se passaram em The Last of Us (2023 -) após os eventos trágicos que se seguiram em Kansas City. As estações do ano mudaram, e Joel (Pedro Pascal) e Ellie (Bella Ramsey) vagam pelas vastas planícies e rochosas montanhas de Wyoming em meio a um rigoroso inverno, ainda à procura de Tommy (Gabriel Luna) e, consequentemente, dos Vagalumes.

Este texto contém spoilers. Continue lendo por sua conta em risco.

Logo no início do episódio, somos apresentados a um casal nativo americano já de certa idade, interpretados por Graham Greene e Elaine Miles, que conseguiram se manter, não só geograficamente afastados, como também alheios de todas as problemáticas dessa sociedade pós apocalíptica. Nossos protagonistas os rendem para obter informações de localização e qualquer pista útil sobre o paradeiro das pessoas que procuram. Uma cena de abertura muito interessante porque, ao mesmo tempo em que tracei um paralelo entre essa cena com um certo momento da gameplay de The Last of Us parte II, em que essa mesma estratégia de interrogatório, de separar os interrogados para ter certeza de que suas respostas coincidem, é usada, também me deparei com o contraste de tom entre esses dois momentos.

No jogo, Ellie explica sobre essa técnica em um momento muito mais chocante e brutal. Aqui, a sequência é leve, até mesmo cômica. Não há uma tensão palpável ali, um verdadeiro risco de Joel machucar aquelas pessoas, um momento de respiro muito bem vindo depois de tudo que passamos até aquele momento, mas também é uma consolidação, se somarmos esse momento à hesitação de Joel em finalizar o velho atirador do episódio anterior, do desenvolvimento de um personagem que se mostra muito mais humano do que sua contraparte do primeiro jogo da franquia. O que considero ser uma escolha acertada, devido a diferença entre as mídias e dos contextos em que elas foram lançadas, respectivamente.

Entretanto, essa aparente “calmaria” é interrompida quando nossa dupla de protagonistas descobre que o que os espera em sua jornada ao oeste é a morte certa. Logo depois disso, o medo de ter falhado novamente em proteger quem ama faz Joel sentir uma espécie de ataque de pânico, mesmo que ele tente convencer Ellie e a si mesmo de que não é nada demais. É um aceno para nós de que este capítulo vai se debruçar mais sobre os conflitos dele, reunindo tudo o que já nos foi pincelado até aqui.

Durante as cenas que se seguem, duas coisas vão ficando nítidas: a primeira é que o relacionamento entre Joel e Ellie evoluiu bastante durante esses três meses que eles passaram viajando, há mais momentos de intimidade, aproximação e química entre eles. A segunda, é que a série tem aproveitado toda e qualquer oportunidade que aparece para acrescentar e até mesmo preencher lacunas do universo dos jogos, criando prenúncios do segundo jogo que ainda deve ser adaptado na próxima temporada. Esses elementos de conexão entre as mídias não são exatamente o que se convencionou chamar de “easter eggs” porque geralmente estes são só uma piscadela da produção para a audiência, muitas vezes jogados de maneira gratuita, sem nenhum desenvolvimento posterior. Aqui, todas essas coisas parecem introduzidas já para uma sequência mais do que confirmada, mas não se limitando a isso, somente. Quando Joel e Ellie conversam ao redor da fogueira sobre o que cada um gostaria de fazer depois que ambos alcançarem seus objetivos, pode até parecer só papo sendo jogado fora, mas é um diálogo cheio de nuances e subtextos, que valoriza também o que não está sendo dito, que, muitas vezes, chega a ser mais importante do que o que está sendo, de fato, posto pra fora.

No dia seguinte, Joel e Ellie continuam sua jornada e encontram uma represa. Não muito tempo depois disso, os dois se veem cercados por uma patrulha montada e armada. Uma das pessoas ameaça a dupla com um cão farejador capaz de identificar um infectado e os dois são colocados à prova. Primeiro Joel e em seguida, Ellie. Sabemos que apesar de imune, os scanners da zona de quarentena mostram como positivo a infecção da garota, mas não temos como saber o resultado se o cachorro vai sentir algo ou não, se essa situação vai escalar ou não.  E, nesse momento faz todo sentido que a câmera foque no rosto de Joel, intensificando a tensão, nós sentimos a impotência e o desespero juntos, porque sabemos tanto quanto ele.

Depois que se comprova que Joel e Ellie não são ameaças, os patrulheiros nos levam a Jackson, uma comunidade autossuficiente muito bem protegida, escondida e organizada. Tal qual dois forasteiros chegando a uma pequena cidade de velho oeste, Joel e Ellie olham ao redor da vila e se impressionam com a estrutura da mesma, de árvore de natal à cinema. E é nesse verdadeiro oásis de civilização que finalmente alcançamos o objetivo que perdurou por cinco episódios, encontramos Tommy. Imediatamente, uma pergunta nova se forma: e agora?

Entretanto, as coisas se complicam um pouco mais. Somos apresentados a uma nova personagem, Maria (Rutina Wesley), que promete ser muito importante daqui para frente, não só ela parece possuir um poder de decisão dentro daquela comunidade como também descobrimos que ela forma um casal com Tommy e somente isso já seria suficiente pra mudar as dinâmicas que se esperavam encontrar, mas posteriormente descobrimos que, para completar, Maria está grávida de Tommy. Maria não confia em Joel por conta de seu passado violento, consequentemente Ellie, na defensiva, também não confia em Maria. Mas agora eles são família, então precisam seguir em frente apesar de tudo isso.

O sucesso de Tommy em Jackson amplifica a sensação de fracasso generalizado que atormenta Joel há 20 anos, se manifestando aqui através dos ataques de pânico. Por uma fração de segundos, ele quase se convence de que está vendo a filha falecida, ou talvez presenciando uma vida que ela poderia ter tido, uma realidade que poderia ser a dele. A culpa de ter falhado em proteger Sarah (Nico Parker) lhe causou um trauma profundo que ele nunca conseguiu processar por completo, e a cada nova falha, mais a culpa o assola. Tess (Anna Torv), Sam (Keivonn Woodard), Henry (Lamar Johnson), até mesmo não conseguir ficar acordado para vigiar enquanto Ellie dorme ou ficar sem ação enquanto a vida dela corria perigo no cerco com a patrulha de Jackson, tudo isso comprova o pensamento persistente de que ele não é bom o suficiente para levar Ellie até os Vagalumes e implora para que Tommy o faça. Ele tem certeza de que vai falhar outra vez e teme não suportar o peso de perder outro alguém que ama, embora ele ainda não consiga admitir para si mesmo que essa já é a sua relação com ela.

Ellie escuta Joel e Tommy conversando e se sente rejeitada. Assim, nos encaminhamos para uma das cenas mais importantes e marcantes do primeiro jogo: a discussão entre Joel e Ellie, em que ela deixa claro que só ficará mais assustada se tiver que continuar a viagem com outra pessoa. E talvez por ser um momento tão importante na história e um ponto de virada crucial para o arco de Joel, essa parte do episódio foi um tanto quanto decepcionante para mim. Não a cena da discussão em si, que em termos de fidelidade foi quase quadro a quadro, mas a resolução da mesma, literalmente na cena seguinte um conflito que deveria pesar de verdade para o público, se resolve. Antes mesmo de sentirmos ansiedade de separação ou qualquer incerteza, já estávamos nos despedindo de Tommy e pegando a estrada. Faltou tempo, faltou deixar a massa respirar pra trabalhar nela de novo, o ritmo foi quebrado e tornou o episódio como um todo meio desbalanceado, com uma primeira parte que constrói bem, uma segunda parte tão cheia de informação e conflito que te deixa meio atordoado –  e a cada reassistida, mais detalhes apareciam! – para depois de uma resolução rápida, deixarmos a cidade meio que deixando todas essas pontas soltas para amarrar depois e nos preocuparmos com outro ponto de chegada, que é o laboratório dos Vagalumes, na Universidade do Colorado.

Depois de descobrirem que a princesa estava em outro castelo os Vagalumes foram para outro lugar, Joel e Ellie são interceptados por um trio de saqueadores, Joel mata um deles, mas sai gravemente ferido. Por pouco, a dupla consegue fugir à cavalo dos outros dois saqueadores e se distanciam da Universidade. Mas, Joel está visivelmente fraco e incapacitado de continuar. Sem forças, ele desmaia na neve e Ellie se desespera.

Na cena final, vemos Ellie debruçada sobre o corpo desacordado de Joel, tentando socorrê-lo de alguma forma, a câmera se afasta e ouvimos novamente a música Never Let Me Down Again, do Depeche Mode, que ouvimos no final do primeiro episódio. Só que, desta vez, em uma versão mais melancólica. Dentro do código de comunicação de Bill e Frank, músicas dos anos 80 significavam problemas. A resolução desse problema, porém, nós só poderemos ver no próximo episódio. Então, nos vemos lá!


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