Mostra Cearense no 19º NOIA | Sufoco – Pontinhos vermelhos em meio ao caos

Sufoco: ato ou efeito de sufocar-se; dificuldade de respirar. Situação muito difícil, atemorizante ou penosa, em que se é pressionado, cobrado, perseguido. Contexto de aflição ou ansiedade; angústia. Todos esses significados se atribuem ao filme de Pardo, o qual revela, por meio de metáforas poéticas e visuais, as inquietações vividas pelo realizador impulsionadas durante o Isolamento Social, ocasionado pela Pandemia do novo Coronavírus.

O curta trata-se de um desabafo, um desejo de colocar em tela os seus anseios, na tentativa de livrar-se desse peso invisível que o encurrala em seu íntimo e lhe toma o ar dos pulmões. Mas também poderia tratar-se de um diário de bordo que registra a sua sobrevivência na selva de pedra, que é a cidade, ou na sua própria selvageria intrínseca.

Através da janela do seu apartamento, observamos uma Cidade Esquizofrênica, que parece zombar da personagem ao ostentar uma certa liberdade cuja mesma não consegue usufruir. A escuridão parece respirar todo o ar que o rodeia, à medida que escutamos o ronco do mar e a brisa noturna. A dualidade trabalhada pelo realizador, faz com que nós, espectadores viventes dessa catástrofe, nos identifiquemos com a armadilha em que o narrador se encontra, pois o ar que a escuridão respira é pestilento e dentro do apartamento a personagem se perde em enfermidades mentais. Não há saída, espaço ou encaixe para ele.

Mais ao longe, vistas de cima, nosso observador se atenta à algumas figuras destacadas em cores quentes nas paredes e alguns vultos que vagam calmamente pelas ruas vazias. Em alguns momentos, a solidão da personagem se assemelha ao vazio das ruas: Ele observa as figuras, elas o observam de volta.

“Todo dia de vida é mais um dia de morte”

No silêncio do seu apartamento, a personagem se encontra acompanhada apenas consigo mesmo, perdida em suas angústias internas e reflexões externas, lançadas em quarenta graus de medo e cinco andares de depressão atravessadas por paredes melancólicas de corredores frustrados. Enquanto o mundo gira lento lá fora, sua mente gira hiperativa e hipocondríaca, em isolamento. Seria ele um produto do mundo que não o cabe ou vice versa?

A dicotomia entre vida e morte, respiração e asfixia, tristeza e euforia são conceitos que foram bem explorados no som do filme. Inicialmente, escutamos a ventania do lado de fora fazendo oposição mais na frente com o efeito da taquicardia, como se o próprio filme fosse um organismo vivo em busca de refúgio.

Dentro do apartamento, escutamos batidas fúnebres, posteriormente contestadas com um plano da personagem dançando sozinha, enfrentando à vida em uma batalha silenciosa de resistência. Pelo menos, de acordo com o narrador, até as quintas-feiras, que é quando ele chora por si mesmo a cada “morte” sua, pois se faz generoso consigo. Se ele chegar às sextas-feiras, é sinal de que sobreviveu mais uma vez, e uma nova jornada irá começar.

Em suma, o filme se constitui de uma sensibilidade bastante atual para o contexto o qual estamos inseridos, gerando uma certa empatia para com a personagem que se encontra nesse não lugar cheio de inquietações. É certo de que nós não estávamos preparados para viver em tempos como esse, e nunca estaremos. A cada dia que passa, todas as chances estão contra nós e os obstáculos parecem cada vez maiores; os abismos, mais fundos. Mas vale lembrar que ainda nem tudo está perdido, o jogo não acabou e tudo pode mudar.

É preciso dar um porre na vida. É preciso ter coragem para viver.


Para saber mais sobre o 19º NOIA – Festival do Audiovisual Universitário, clique aqui.

Leia os textos de Elvio FranklinEric Magda e Thiago Henrique Sena, que fizeram parte do Júri da Crítica do festival como membros da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema) aqui.