Magos – Uma viagem ao passado

Os Contos de Arcadia tem sido uma longa jornada que se iniciou em 2016 com Caçadores de Trolls: Contos de Arcadia (Trollhunters: Tales of Arcadia, 2016 -2018), passou por Os 3 Lá Embaixo: Contos de Arcadia (3Below: Tales of Arcadia, 2018 – 2019) e finalmente chegamos à terceira e última série da trilogia, Magos: Contos de Arcadia (Wizards: Tales of Arcadia, 2020 -) que acabou (spoiler!) não sendo o final de tudo, este vai acontecer, ao que tudo indica, com o filme previsto para o ano que vem Trollhunters: Rise of The Titans, algo como Caçadores de Trolls: A Ascensão dos Titãs, em tradução livre.

Agora vamos acompanhar Hisirdoux, ou Douxie para os íntimos, que até então era apenas um garçom que fazia aparições especiais nas outras séries e flertava um pouco com a Clara, mas que claramente escondia algum segredo. Douxie é um mago/feiticeiro, aprendiz de Merlin, que vinha estudando por conta própria junto com seu familiar, Archie, há 900 anos, já que seu mestre passou um tempo desaparecido e depois saiu em uma jornada com os trolls, como vimos no final de Caçadores.

Mas de repente, Merlin entra em contato com ele e o instrui a juntar os guardiões de Arcadia, mas por algum motivo ele não consegue encontrar nem os mutantes nem as alienígenas (Del Toro você me prometeu um crossover!), então, junto com Steve, Bobby e AAARRRGGHH!!!, eles vão para Camelot, que hoje é um castelo voador que serve de abrigo para alguns seres. Lá revemos Clara, Jim e Blinky, mas não nas melhores circunstâncias, já que Jim está gravemente ferido.

Para encurtar um pouco, o castelo é atacado por um grupo desconhecido e perigoso de inimigos e na tentativa de fugir, Douxie, Clara, Jim e Steve caem na Camelot da época do Rei Arthur e agora eles precisam dar um jeito de voltar para o presente sem prejudicar a linha do tempo.

Para aqueles que não lembram, o ciclo Arturiano foi um momento importante na história da série, foi nesse período em que aconteceu a batalha de Olha-a-Morte, quando Deya, a primeira caçadora de trolls prendeu Gunmar e os outros Gumm-Gumms nas Terras Sombrias, estando o próprio rei Arthur e Morgana na batalha.

Se você não assistiu Caçadores de Trolls esse último parágrafo provavelmente não fez o menor sentido para você, então é agora que eu anuncio que apesar de até dar para entender a história de Magos sem assistir as séries anteriores, você vai ficar bem perdide se não assistir.

Essa viagem no tempo faz com que Magos funcione ao mesmo tempo como prequel e sequel da história, nos mostrando o que aconteceu no passado e complementando o presente, é confuso, mas essa é a beleza da viagem no tempo. Sendo assim, até o episódio 7 dos 10 estamos no passado e só a partir do 8 começamos a concluir aquela história de perseguição do episódio 1.

Começando pelos personagens, os que já conhecíamos voltaram um pouco diferentes, Jim e Clara por exemplo passaram um tempo fora, muita coisa aconteceu e eles não são mais os mesmos, assim como outros como Morgana, Gunmar e Bular são o contrário, eles ainda não são exatamente o que vimos porque muito ainda falta acontecer com eles.

Agora, depois de tanto desconfiar dele, conhecemos Douxie mais a fundo. Aprendiz de Merlin há séculos, quer muito mostrar do que é capaz, mas Merlin sempre espera que ele falhe, então ele quer se provar, mas é apenas subestimado. Sua jornada acaba sendo muito mais uma jornada do mentor, já que conforme o tempo passa ele vai assumindo mais deveres e responsabilidades, ao invés de acumular feitos heroicos. Como sempre nos contos de Arcadia, nossos personagens são falhos e com o jovem (bem conservado para seus estimados 919 anos) gótico não é diferente. Desastrado e impulsivo, consegue quase sempre transformar uma boa ideia em um desastre, e seria esse o motivo da desconfiança de Merlin.

Quem divide mais o protagonismo com Douxie é Clara, que agora descobrimos também ser uma maga, teoricamente ela sempre teve poder mágico dentro de si, a magia das sombras que ela usava em Caçadores não estaria no cajado e sim nela, o objeto teria sido algo como um canal que a ensinou a usar aquele poder. Ela também tem muitos conflitos internos por se culpar pelo que aconteceu com Jim e estar ficando mais poderosa, temendo se tornar como Morgana se continuar usando a magia das sombras. Jim, apesar de ser mais um coadjuvante nessa série, tem sim um papel importante a desempenhar em uma trama com um pouco menos de destaque. E o que é possível ver nele é um herói cansado, que duvida de si mesmo, muito foi e ainda é exigido dele.

E acabamos aprendendo mais sobre o próprio Merlin, mesmo que muita coisa fique no ar. Ele sente certa culpa sobre o que aconteceu com Morgana, acredita ter falhado com ela e talvez seja isso e tantas outras coisas que não sabemos que dita suas ações com relação a Douxie.

Também temos é claro um bom número de personagens novos como Lancelot, Arthur e Callista, todos muito bem escritos e pensados para estar ali por algum motivo, assim como vemos personagens conhecidos em versões suas anteriores, podendo até mesmo rever alguns rostos que deixaram saudade como Vendel e Draal.

A história como já comentei é um complemento mais direto à Caçadores de Trolls, expandindo o mundo mágico. Assistindo vamos ver tudo o que aconteceu para culminar na batalha de Olha-a-Morte, a origem de Morgana e de onde veio sua raiva, como Merlin criou o amuleto do Caçador de Trolls e várias outras coisas. Acabei acertando quando previ que o passado nos magos não explorado antes seria aqui, temos todo uma história e desenvolvimento que até então tinha sido apenas mencionado, inclusive muita coisa da história dos trolls.

O tema principal é o preconceito, já que o rei Arthur tem se dedicado a segregar e, se possível, matar os seres mágicos. Ele declarou guerra contra a magia, mas vai ter que se unir com eles para combater um inimigo em comum. Gostei muito de como a magia foi trabalhada, cada feiticeiro/mago tem a magia de uma cor e existem modos diferentes de ser usada, podendo ser com as mãos vazias, com um bracelete como o de Douxie ou com os cajados. Até mesmo um pouco de ciência se mistura, usando jóias e runas, criando uma ótima mitologia para a série.

A narrativa continua igualmente madura, como nas suas antecessoras, existem momentos difíceis, situações complicadas, as decisões tem consequências e se os personagens se arriscarem demais eles vão sim se ferir e até mesmo morrer.

A qualidade da animação segue alta, com movimentos fluidos, cenas de ação bem coreografas, o uso da magia ficou dinâmico e a direção de arte sempre é um show a parte. E como sempre, ambos os trabalhos de voz, tanto no original quanto na dublagem brasileira tem uma ótima qualidade, inclusive é bom ouvir algumas vozes que só tinham aparecido a última vez em 2018 ou em alguns momentos específicos de Os 3 Lá Embaixo.

Mas apesar de bem escrita, Magos tem um ritmo muito apressado, o começo e o final tem muitas informações dadas muito rápido, não existe muito descanso ou tempo para digerir o que é mostrado. Fica a impressão de que a história tinha que acontecer o mais rápido possível e algumas coisas ficam rasas por conta disso. Acho que alguns minutos a mais por episódio ou mais dois ou três episódios poderiam ajudar a desafogar um pouco, porque algumas coisas chegam a se atropelar, não temos o tempo que temos nas séries anteriores para conhecer os personagens, enquanto a série corre temos que conhecê-los por pedaços. Furos também acabam sendo comuns, alguns justificados pela emoção que causa e outros porque, enfim, as séries têm alguns anos entre si, por mais planejadas que tenham sido, no meio do caminho algumas coisas vão acabar mudando.

E por menor que tenha sido, no final tivemos sim um crossover, onde ficamos sabendo algo importante: tecnologia akiridiana e magia se dão muito bem. Chuto que provavelmente isso vai ser a chave para o que vai acontecer no filme do ano que vem. Ao final de Magos, ganhamos muitas respostas, mas muitas delas levam a mais perguntas então ainda tem muito a se falar. Fiquei inclusive pensando que talvez esse passado pudesse ter sido mostrado de outro jeito, como numa história em quadrinhos, mas claramente a intenção maior é falar sobre como esses personagens são especiais e importantes, eles não fazem a diferença apenas no presente como no passado também, e sim, isso cria paradoxos, mais uma beleza da viagem no tempo.

Acaba que no fim, se Del Toro quiser ele pode explorar seu rico universo de Arcadia por anos em diversas mídias, como na verdade tem sido feito, já que existe uma série de livros e uma de quadrinhos ainda inéditas no Brasil, infelizmente.

Resta agora esperar 2021 e o filme que pode OU NÃO (nesse texto não confiamos mais em Guillermo Del Toro) concluir a história desses personagens tão queridos.


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