Estamos numa época boa para produções asiáticas, aquecidas principalmente após o Oscar de Melhor Filme do fenômeno Tudo Em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo (Everything Everywhere All at Once, 2022) ano passado e a invasão de k-dramas (doramas coreanos) e j-dramas (doramas japoneses) nos streamings, gerando produções interessantes com alvo no público jovem. Existe um subgênero com uma leve alta que está em evidência atualmente em Hollywood ajudando nesta propagação, é o gênero dos filmes e séries sobre descendentes de chineses que nasceram ou mudaram para os EUA nos dias atuais.
Enquanto o elogiado filme Vidas Passadas (Past Lives, 2023) resgata através do drama e romance a história de um casal que se separou na infância e se reencontrando anos depois em terras norte americanas. A série A Jornada de Jin Wang (American Born Chinese, 2023), do Disney+, é uma fantasia que traz um adolescente descendente de chineses que precisa ajudar um amigo que na verdade é um lendário Deus chinês que está se escondendo na Terra.
E ainda temos a excelente série de ação Warrior (2019 – 2023), da Cinemax, que é baseada nos escritos de Bruce Lee e conta a história de um chinês no começo do século XX que chega a São Francisco para viver numa comunidade chinesa buscando uma nova vida. Estou falando tudo isto, para trazer mais uma série dentro deste subgênero, Irmãos Sun (The Brothers Sun, 2024), nova série de ação da Netflix que conta a história de dois irmãos que se reencontram após anos nos EUA depois que uma sucessão de assassinatos coloca a família deles em risco.
O seriado criado por Brad Falchuk, Amy Wang e Byron Wu possui todos os elementos almejados pelos fãs de ação: trama bem amarrada, conspiração entre máfias, sequências de porradaria com direito a muito sangue, além de uma produção caprichada. Estas características são todas apresentadas no “Piloto” (1×01), que leva o assassino Charles Sun (Justin Chien) a Los Angeles para encontrar e proteger sua mãe Eileen Sun (Michelle Yeoh) e seu irmão mais novo Bruce (Sam Song Li) após uma tentativa de assassinato do patriarca da família Big Sun (Johnny Kou) em Taipei.
A narrativa consegue equilibrar bem bom humor e ação desde início, e é isto que torna Irmãos Sun tão atrativa. Enquanto acompanhamos a vida normal de Bruce na faculdade de medicina não tendo ideia do legado de sua família, vemos a chegada de Charles Sun revelar toda uma grande trama que coloca em risco do clã Sun. Revelar mais estragaria as surpresas, mas o que você precisa saber é que a série trabalha bem o choque de culturas a transformando num produto cheio de personalidade e carisma.
Os episódios “Favor for a Favor” (1×02) e “Whatever You Want” (1×03) trabalham com um desenvolvimento acelerado com episódios que intercalam aprofundamento da relação entre Charles, Bruce e Eileen, além de colocar um arco em paralelo fazendo a conspiração para destruir as máfias de Taipei uma ameaça constante durante a temporada não deixando a série cair no marasmo em nenhum momento.
O legal é ver uma série que sabe se apoiar no talento do seu elenco, pois o grande trunfo aqui é a química entre os personagens de Justin Chien, Sam Song Li e Michelle Yeoh, enquanto o primeiro vende carisma e impressiona em várias sequências de ação espetaculares, o segundo é o alívio cômico com coração, sendo que Yeoh é a ponta que une trio de uma forma que todos os conflitos passam e transitam na órbita de sua personagem que tem uma linha de crescimento muito boa de acompanhar.
É seguindo neste ritmo que os episódios “Square” (1×04) e “The Rolodex” (1×05) fazem de Irmãos Sun uma série especial, pois além de nos privilegiar com ótimas sequências de ação, a narrativa abraça a cultura chinesa e mostra como as comunidades estão bem inseridas no seio da cultura estadunidense, gerando conflitos de geração entre Charles e Bruce, o primeiro encantado com a comida e estilo de vida dos norte americano, o segundo com dificuldade de entender diálogos em mandarim por estar completamente inserido nesta sociedade ocidental.
O texto aproveita estas discrepâncias para trazer um contexto social que poderia ser até mais aprofundado principalmente no impacto que isto está causando nos descendentes de chineses atualmente, mas a série prefere focar no entretenimento em prol da ação usando a família como fio condutor de uma trama que na maior parte do tempo sabe aproveitar muito bem as qualidades que tem.
Quando citei o elenco, não tenha dúvidas que o episódio que sintetiza o quão boa é a série é “Country Boy” (1×06), mostrando Charles, Bruce e aliados se escondendo na casa de ator famoso numa sequência engraçada, descompromissada e bastante divertida. Fica claro que a química entre Justin Chien e Sam Song Li é um acerto enorme não só pelo carisma, mas pelo fato de fazerem outros personagens brilharem junto como a excêntrica June (Alice Hewki), a impiedosa Xing (Jenny Yang), a carismática Grace (Madison Hu) e a bela promotora Alexis (Highdee Kuan).
E tudo isso fica ainda melhor com Michelle Yeoh tendo um grande destaque na segunda metade da trama. Seu breve arco em Taiwan é magnífico e mostra a versatilidade da vencedora do Oscar em transitar entre gêneros brilhando bastante em cenas dramáticas dando um peso narrativo inesperado para uma série que surpreende por não se contentar em ser um produto descartável.
Outro ponto alto são as sequências de luta, algo que o seriado consegue fazer com que seja o principal atrativo para os fãs do gênero. Com episódios bem dirigidos, temos principalmente cenas de ação com Charles Sun entregando porradaria de respeito, com destaque a sequência do clube de golfe que é muito bem coreografada e dirigida, sendo só um exemplo de como a série consegue resgatar a vibe dos filmes chineses de máfia dos anos 80 e 90 que fica ainda mais evidente no excelente “Gymkata” (1×07), um episódio repleto de ação e reviravoltas.
De uma forma geral, Irmãos Sun é uma série divertida, daquelas para sentar e não desgrudar os olhos da tela, com uma narrativa que equilibra ação e drama, com conflitos familiares bem dosados e personagens carismáticos, temos aqui uma das grandes surpresas do começo do ano. O episódio “Protect The Family” (1×08) é o final de temporada ideal para deixar aquele gostinho de quero mais de um universo cheio de mitologia, que entrega o que se espera e até um pouquinho mais, mostrando que produções asiáticas com grana ocidental, podem ser tão boas ou até melhor que as produções estadunidense atuais.
VEJA TAMBÉM
Vidas Passadas – A saudade do que poderia ter sido, mas não foi
Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – A essência do cinema num multiverso de possibilidades
Engenheiro Eletricista de profissão, amante de cinema e séries em tempo integral, escrevendo criticas e resenhas por gosto. Fã de Star Wars, Senhor dos Anéis, Homem Aranha, Pantera Negra e tudo que seja bom envolvendo cultura pop. As vezes positivista demais, isso pode irritar iniciantes os que não o conhecem.