The Archies – Juventude, rebeldia e músicas na luta por justiça

Filmes musicais são um dos gêneros mais celebrados da sétima arte, não é à toa que no período do Oscar sempre tem algum filme deste tipo concorrendo na premiação. O gênero, que normalmente é bastante de nicho, costuma furar a bolha quando traz histórias mais leves e jovens, capazes de chegar na massa através de produções caprichadas e talentos promissores. Como exemplo temos o recente Matilda: O Musical (Roald Dahl’s Matilda the Musical, 2022) que estreou em dezembro do ano passado, além de outros normalmente atrelados ao selo Disney, como a trilogia “High School Musical”.

É seguindo neste caminho que venho falar do novo longa musical indiano da Netflix, The Archies (2023), narrativa que conta a história de sete amigos que vivem na fictícia cidade de Riverdale e precisam se unir para evitar que um parque famoso da cidade seja destruído por empresários que querem construir um shopping no lugar.

Se você achou a trama simples e previsível, é porque é isto mesmo que o longa dirigido por Zoya Akhtar tenta emular nesta adaptação de Bollywood dos quadrinhos da Archie Comics, que traz a história de Archie Andrews (Agastya Nanda), Betty Cooper (Khushi Kapoor), Reggie Mantle (Vedang Raina), Veronica Lodge (Suhana Khan), Jughead Jones (Mihir Ahuja), Ethel Muggs (Aditi Saigal) e Dilton Doiley (Yuvraj Menda) numa nova roupagem que se passa no interior da Índia dos anos 60.

É usando o formato de musical que somos levados a uma trama que consegue capturar bem a alma dos quadrinhos norte americanos, trazendo um ar de narrativa de época regada a muito charme numa estrutura bastante convidativa. É claro que inicialmente nota-se uma estranheza, que será percebida principalmente pelos leitores dos quadrinhos originais, ou dos fãs da série Riverdale (2017 – 2023) da CW, pois temos algo completamente mais alegre e despretensioso nesta obra indiana.

Talvez o mais difícil para o roteiro aqui seja conseguir capturar a aura do universo de Archie e companhia ao mesmo tempo que adapta a linguagem para o público indiano, soando também universal para o público alvo da Netflix. Devo dizer que o roteiro escrito por Ayesha DeVitre consegue, na maior parte do tempo, fazer com que realmente a cidade de Riverdale tenha nascido na Índia dos anos 60, criando um vínculo da comunidade local com a própria história indiana e inglesa.

A partir do momento que o filme se estabelece, tudo contado pelo ponto de vista de Archie, o primeiro ato ganha vida ao explorar a vida desses jovens de 17 anos, cheios de sonhos e desafios. A sensação aqui é de estar vendo um filme norte americano dos anos 60 e 70, no maior estilo Grease: Nos Tempos da Brilhantina (Grease, 1978) ou Hairspray: E Éramos Todos Jovens (Hairspray, 1988), com um toque do cinema Bollywoodiano explorando várias danças, várias canções que tornam tudo muito agradável de acompanhar.

É claro que ao abraçar esse lado ocidental, falta aquela liberdade de Bollywood que fizeram filmes como RRR: Revolta, Rebelião, Revolução (RRR, 2022) se tornarem fenômenos mundiais. Ao invés disso The Archies navega numa zona de conforto para contar sua história tornando o filme menos ousado e mais comum dentro do gênero, não trazendo grandes novidades.

Ainda assim, é fato que ao menos o filme sabe ser divertido consigo mesmo, principalmente quando abraça seu lado musical. Se tem uma coisa que a narrativa se sai bem é quando os personagens começam a cantar e dançar em cena, mérito da diretora com suas tomadas fluídas e dinâmicas na execução das sequências, destaque para a abertura  com a canção “Sunoh” apresentando os personagens, além das cenas no baile com a canção “Va Va Voom!” e outra cena maravilhosa na escola com a música “Everything is Politics”.

No quesito produção, gosto muito da direção de arte e dos figurinos, bem como a fotografia com paletas mais douradas e vívidas. No que diz respeito ao elenco, em sua maioria com atores novatos, devo dizer que estão operantes dentro da proposta, vendendo bastante carisma, com destaque para os atores Khushi Kapoor e Yuvraj Menda, respectivamente Betty Cooper e Dilton Doiley.

De uma forma geral, The Arthies é uma grata surpresa, daquelas que servem como bom passatempo de final de ano no melhor estilo filme “Sessão da Tarde”, leve, agradável e sem grandes pretensões. Apesar de achar que poderia ser um pouco menor (o filme tem 143 minutos), principalmente porque na parte final do segundo ato o drama toma conta e sentimos falta das músicas que ficam um pouco escassas, só voltando na parte final, onde o filme se movimenta para fechar a trama de uma forma satisfatória deixando um gostinho de quero mais. 

Talvez falte também ao longa abraçar a Bollywood dentro de si, inclusive o idioma deveria ser 100% em hindu, não intercalado em inglês como acontece, mas isto não torna a produção menos interessante, possuindo momentos maravilhosos que irão fazer o expectador abrir um sorriso de satisfação. Um filme sobre juventude, sobre conhecer a si mesmo e encontrar seu lugar no mundo, com boas lições esta produção indiana é uma caixinha de presente no período natalino, deixando seu coração quentinho repleto de ternura.


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