Depois de começar com um dos melhores filmes de aventura dos anos 1990 – Parque dos Dinossauros (Jurassic Park, 1993) –, um verdadeiro marco tecnológico e também uma das obras mais marcantes da carreira de Spielberg, Jurassic Park seguiu ladeira abaixo com dois filmes que, apesar de divertidos, não tinham um décimo da inventividade e do impacto do primeiro. Quando Jurassic Park III (2001), apesar da melhoria de qualidade em relação ao segundo filme, estacionou em uma bilheteria muito aquém do esperado (ainda que não pudesse ser considerado um fracasso), imaginou-se que poderia ser o fim dos filmes da franquia. No entanto, nada em Hollywood permanece esquecido ou inexplorado por muito tempo, ainda mais uma série de filmes bilionária e, mesmo levando mais de dez anos para isso, Jurassic Park retornou aos cinemas em 2015, numa espécie de continuação/refilmagem (que passou a ser moda desde então), dessa vez rebatizado de Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros (Jurassic World, 2015).
Estrelado por um Chris Pratt recém-saído do mega sucesso Guardiões da Galáxia (Guardians of the Galaxy, 2014), o filme foi um sucesso de bilheteria muito além do que o estúdio imaginava, o que resultou na confirmação não apenas de uma, mas de duas continuações, que fechariam uma nova trilogia. Esse sucesso financeiro mostrou que o público estava sedento por voltar a esse mundo povoado de criaturas tão maravilhosas quanto distantes da nossa realidade, e só a saudade (do primeiro filme) e o fascínio por esses seres justificam o sucesso de Jurassic World, já que o filme pouco inova na abordagem desse universo, se limitando a seguir no limite da refilmagem os passos de Parque dos Dinossauros. Apesar da qualidade mediana, é um filme que diverte bastante e que nos proporcionou uma continuação muito superior, Jurassic World: Reino Ameaçado (Jurassic World: Fallen Kingdom, 2018), de semelhante sucesso, mesmo com uma recepção dividida, e Jurassic World: Domínio (Jurassic World Dominion, 2022), que chega agora aos cinemas com a intenção de fechar a trilogia e, por consequência, o arco dos personagens apresentados em Jurassic World (essa intenção até se cumpre, mas tenho plena convicção de que outros filmes virão).
Nessa pretensa aventura final do agora casal Owen (Chris Pratt, indo fundo na canastrice e na falta de expressão dramática) e Claire (Bryce Dallas Howard, fazendo o possível para salvar um papel raso, quando não está com cara de choro) vivem em uma cabana na floresta, onde escondem Maisie (Isabella Sermon), um clone humano, personagem introduzida no filme anterior. Nesse momento da história, já não existe mais nenhum parque que envolva dinossauros, que agora estão espalhados pelo mundo e são resgatados aos poucos por uma empresa de biotecnologia, a Biosyn, e colocados em uma reserva ambiental na Itália. No entanto, quando Maisie é sequestrada por contrabandistas de dinossauros, Owen e Claire partem em seu resgate e acabam se envolvendo em uma conspiração envolvendo a Biosyn e cruzando o caminho de Alan Grant (Sam Neill) e Ellie Sattler (Laura Dern), que investigam a empresa. Esses dois, juntamente do Dr. Ian Malcolm (Jeff Goldblum) representam o fator nostalgia, presente nos três filmes dessa nova trilogia, mas que em Domínio surge com mais força. São, também, um dos pontos altos de um filme altamente irregular, ainda que divertido.
Dirigido novamente por Colin Trevorrow – que dirigiu o primeiro Jurassic World e cedeu lugar na continuação à J. A. Bayona, que comandou Reino Ameaçado –, Domínio não alcança a qualidade de seu antecessor, que mesmo com problemas de roteiro, possui uma força visual e um equilíbrio de tensão e emoção que só um diretor da qualidade de Bayona poderia proporcionar. Trevorrow, por outro lado, é um diretor sem muita inventividade, mas, ainda assim, faz em Domínio um trabalho menos medíocre que no primeiro filme. De fato, ele comanda muito bem as várias cenas de ação, e consegue até mesmo injetar suspense e tensão, mesmo apelando para jump scare. Uma das melhores sequências do filme, a perseguição pelas ruas de Malta, é um bom exemplo do trabalho do diretor.
Outro dos pontos positivos do filme, e que é algo que vem sendo ensaiado desde o primeiro Jurassic World, é como há um desejo de mostrar as implicações sociais da presença de dinossauros em nosso mundo. Ainda que o propósito do filme não seja esse – e também não é a pretensa discussão sobre limites éticos da ciência que ele tenta nos fazer acreditar ser –, os momentos mais interessantes, para mim, são aqueles que lidam com essa questão, ou seja, quando, por exemplo, vemos trabalhadores de uma madeireira parando tudo para observar o despertar de animais gigantescos ou quando vemos um mercado clandestino de venda de dinossauros, entre outras situações. Isso se soma a outra questão, que Trevorrow lida muito bem: o maravilhamento que nos causa a existência de seres que deveriam ter desaparecido há milhões de anos. Por mais que os personagens desse mundo já devessem estar acostumados a vê-los, esse deslumbramento é bem-vindo e sugere ao público que deveríamos ter o mesmo tipo de visão a respeito dos animais do mundo real, muitos também à beira de desaparecerem.
Por outro lado, e apesar das qualidades citadas, o filme soa irregular, tanto pela direção, como já foi dito, mas também por um roteiro que não consegue esconder as soluções fáceis (e que pede uma suspensão de descrença para além dos limites do aceitável) para a maioria das situações que cria, bem como pelas atuações fracas do elenco, onde somente se salvam o trio Sam Neill, Laura Dern e Jeff Goldblum, mais pelo carisma e qualidade dos intérpretes. Outro ponto questionável é que, apesar do filme tentar mostrar situações inéditas na franquia, tudo se resume a um clímax que envolve um local repleto de dinossauros à solta (parque ou reserva florestal, não importa), com os personagens tentando fugir sem serem devorados. São problemas que comprometem, mas que não tiram a diversão. No entanto, é um filme que falha naquilo que fez o Jurassic Park original ter o mesmo frescor de 30 anos atrás: mais que efeitos visuais de ponta e boas cenas de ação, são necessários bons personagens e uma história que não subestime a inteligência do público.
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Cineasta e roteirista, formado em Letras e graduando em Cinema, respira literatura, filmes e séries desde que se entende por gente. É viciado em sci-fi e terror, e ama Stephen King, Spielberg e Wes Craven. Tem mais livros em casa, e séries e filmes no computador de que seria humanamente possível ler e assistir, mas não vai desistir de tentar. Não consegue lembrar o que comeu ontem, mas sabe decorado os vencedores do Oscar de melhor atriz do últimos trinta anos (entre outras informações culturais inúteis).