His Dark Materials: Fronteiras do Universo – 2×05: The Scholar

Já perigosamente perto do final da temporada, chegamos a um episódio bem diferente e importante, que acabou sendo um pouco complicado para mim. Essa temporada claramente se propôs a se aprofundar na Sra. Coulter (Ruth Wilson) de um jeito que não acontece nos livros até então. Era evidente que esse episódio ia investir nela e sua estadia em nosso mundo, afinal, a maior parte do conteúdo original da série a envolve, primeiro para fazer valer o salário de Ruth Wilson e para mostrar mais da personagem e suas limitações, tanto porque talvez o próprio Phillip Pullman não tenha percebido o potencial da personagem quando a criou.

Minha impressão inicial era de que o episódio tinha muitas barrigas e se focava em preencher os momentos de qualquer jeito, precisei de um tempo para entender o que tinha assistido e percebi que na verdade eu estava com receio, porque muitas coisas importantes e muitas vezes não tão fáceis de perceber foram construídas nesse mísero episódio de uma hora, que eu tenho medo que sejam desperdiçadas no fim das contas. Mas isso só o tempo dirá.

Novamente Leanne Welham está na direção assim como nos dois episódios anteriores e Francesca Gardiner, que escreveu roteiros para Medici: Mestres de Florença (Medici, 2016 – 2019) e O Homem do Castelo Alto (The Man in the High Castle, 2015 – 2019) e colaborou no roteiro do segundo episódio desta temporada. É o primeiro episódio da série escrito e dirigido por mulheres, sem nenhum homem para dividir as funções, e assistindo o episódio é possível entender o por quê.

O episódio tem um bom ritmo, as cenas possuem o tempo necessário para cada uma, tivemos ótimos momentos de humor e ao contrário do que eu temia e pensei logo de cara, nada nele é gratuito, tudo está ali por uma razão. Apesar de achar que alguns momentos têm sim suas barrigas, mas imagino que isso se dê porque o episódio adapta literalmente um capítulo do livro, enquanto o anterior adaptou três e de ter percebido alguns erros de continuidade nas feridas de Will (Amir Wilson) que melhoravam e pioravam do nada, mas pode ter sido impressão, não reassisti o episódio para ter certeza.

O elenco segue maravilhoso e já sabemos que Ruth Wilson é incrível, mas esse é um episódio feito para ela brilhar e um detalhe que eu finalmente percebi depois de Giacomo Paradisi (Terence Stamp) ensinar Will a cortar as aberturas é que as linhas/fios na abertura são as divisões entre os mundos literalmente, não só um modo de mostra-los de longe. Por incrível que pareça, temos até pouco de Lyra (Dafne Keen) e Will nesse episódio. Will começa observando e praticando com a faca, sua nova responsabilidade, e fica frustrado por não conseguir cortar uma janela, no fim ele ainda precisa de prática para usar a faca sem a orientação de Giacomo. E sua ferida ainda sangra, ainda dói, mesmo com os cuidados tomados. Ele e Lyra começam a traçar um plano para roubar o aletiômetro, que obviamente, vai depender muito da faca, para que tudo seja feito de modo rápido e fácil. Adoro a ironia dramática de enquanto isso também acompanharmos o outro lado e sabermos que esse plano vai dar errado.

Quando Pantalaimon (Kit Connor) fala sobre uma equivalência dos mundos, os dois decidem testar e treinam um pouco. Will vai pegando o jeito com a faca, abrindo facilmente algumas janelas, ele se anima e sorri, mas já quase se esqueceu de fechar uma janela, Lyra é quem o lembra de fechar, mostrando o quão fácil é simplesmente deixar uma ali e acredito que já nos preparando para o momento em que ele vai esquecer alguma janela importante aberta. Nessa brincadeira eles descobrem que sim, realmente os mundos se correspondem. No meio da exploração, reencontram Angelica (Bella Ramsey) e Paola (Ella Schrey-Yeats) que acabaram de encontrar Tullio (Lewis MacDougall) que, como vimos no episódio anterior, foi pego pelos espectros. Ao vê-los, Angelica já sabe que são os responsáveis e os acusa, ela sabe da faca e do poder que ela teria para a proteção dela e de outras crianças, e por mais que Will e Lyra tentem se explicar, ela não quer ouvir, os dois praticamente mataram seu irmão e ela vai se vingar por isso. Essa conversa deixa Will em conflito, o que rende mais uma conversa em um banquinho entre ele e Lyra. Os questionamentos são muitos, por que a faca o escolheu? Ele não queria, ele não precisava dela, nem dessa responsabilidade, o instrumento seria muito mais bem utilizado pelas crianças de Citagazze. Ele se sente  mal por ter feito o que fez e condenado Tullio ao que aconteceu, e decide que não quer mais machucar ninguém. Por fim, decidem continuar estratégicos, realizar o roubo durante a noite e Lyra se oferece para distrair Boreal (Ariyon Bakare), ela quer muito enrolá-lo na conversa.

Mas o que realmente interessa nesse episódio é a Sra. Coulter. Agora em nosso mundo, na nossa Oxford, ela parece intrigada e observa tudo a sua volta, afinal é um mundo bem diferente. Até que algo capta sua atenção. Uma mulher que enquanto trabalha em seu notebook, está com um carrinho de bebê, cuidando da criança. Um ótimo exemplo de uma mulher moderna do século XXI, mas também um ótimo exemplo do que Marisa gostaria de ser e vai ser esse o seu arco da semana. Porém não posso deixar de mencionar que eu perdi tudo com o macaco dourado usando cinto de segurança, eu queria um para mim naquele momento.

Boreal chega e está muito realizado com a companhia da mulher e fala que nosso mundo tem uma cultura de consumismo e não de fé, deixando claro seu desprezo para como nós vivemos aqui. Ele ligou seu modo sedutor e tenta lançar seus encantos sobre a Sra. Coulter, mas na verdade ele está sendo um grandissíssimo chato. Teoricamente Marisa está em suas mãos por estar em um mundo diferente que não é familiar para ela e que ele domina, conhece as regras e costumes, mas o que ele não percebe é que ela não se permite em momento algum ficar presa na armadilha dele nem deixar que ele pense que ela está presa, ele só acha que está no controle porque ela quer que ele pense assim.

Chegando à mansão, temos mais um momento de soberba de Boreal, sua linda casa, seus objetos raros e etc, se sentindo incrível enquanto a Sra. Coulter está tudo menos impressionada, chegando até a tirar sarro dele em alguns momentos, já que o real interesse dela é a filha, mas precisa passar por esse date ruim para chegar até ela. Descobrimos então como Boreal fez fortuna. Enquanto Jopari (Andrew Scott) prosperou no mundo de Lyra por seu conhecimento e habilidades, Carlo é um contrabandista, levando objetos de seu mundo, como ele mesmo menciona sobre sua primeira coleção moscovita e vendendo aqui, por valerem muito mais aqui. Assim como os alquimistas de Citagazze, ele está roubando de outros mundos para benefício próprio.

Os dois tem uma conversa um pouco repetitiva para o espectador sobre como ele pegou o aletiômetro e para piorar o date, os dois vão ouvir música e conversar sobre caixas de som. Que divertido.  A Sra. Coulter está claramente aborrecida com toda a situação e não esconde, contudo Boreal ainda tem sua dose de esperteza e a conhece bem, ele pode não saber onde Lyra está ou quando vai chegar, mas sabe sobre a pesquisa de Mary Malone (Simone Kirby), que quando mencionada já faz os olhos de nossa vilã brilharem, ainda mais com a certeza de que as mulheres tem mesmo outros papéis por aqui.

Já que aquele lugar está – por falta de palavra melhor – um saco e ela não aguenta mais se fazer de boazinha e fingir para Boreal que não está só o usando ela decide visitar Mary, tanto para saber de Lyra quanto porque o Pó é sua área de estudo, ela precisa ver esse lugar. Carlo conta que ela precisa vestir roupas dessa época e vamos para um quarto onde ele comprou diversas roupas femininas para a chegada dela (o que com certeza não é nada estranho nem preocupante, de jeito nenhum) e temos um momento da Sra. Coulter olhando enojada um jeans. A cena é engraçada, mas achei longa demais. Porém, a grande tensão vem quando ela sai do quarto, tranca o macaco dourado e sai sem ele! Eu quase não consegui acreditar. Ela desce as escadas linda e moderna, mas obviamente Boreal estranha a ausência do daemon, ao que ela responde apenas dizendo que é como as feiticeiras. Vaga e misteriosa, não sabemos bem o que isso significa, ela passou pelo ritual das feiticeiras ou desenvolveu essa habilidade sozinha? Enquanto o macaco surta dentro do quarto, porque a clara diferença entre ele e os daemons de feiticeiras é que eles não os trancam por ai, Marisa diz que Carlo deveria ficar caso Lyra aparecesse. Eu só não entendi como ela pegou a chave do caríssimo Tesla elétrico de Boreal e saiu dirigindo. Tudo bem, no mundo deles existem carros, mas com certeza nenhum parecido com aquele, Marisa é inteligente, porém fica difícil de engolir que em pouco tempo ela já sabe dirigir aquele carro e usar um GPS.

Chega o momento de mais uma interação inédita. Sabe-se lá como, a Sra. Coulter conseguiu chegar ao escritório de Mary, lotado de relatórios e livros, já que depois daquele papo com a caverna ela agora está ainda mais interessada em assuntos sobre consciência. Quando chega ao escritório, Mary é hostil com Marisa, afinal a última pessoa que apareceu em seu escritório daquele jeito não era boa coisa, mas quando descobre que se trata da mãe de Lyra, desperta certo interesse. Mary começa a elogiar Lyra e a Sra. Coulter fica impressionada, Lyra sabe disso? Ela fez isso? Quando as duas estiveram juntas ela esteve tão preocupada em transformar a garota em quem ela achava que deveria ser que não se preocupou em descobrir quem a filha era. Quando ela diz que estuda teologia experimental, Mary pergunta onde a religião entra na ciência, ao que Marisa responde “onde não entra?” No seu mundo, onde tudo é comandado pelo Magisterium, tudo tem obrigatoriamente ligação com a fé. Teologia experimental é física, mas além de estudar matéria e energia, estuda também as entidades que as controlam, por isso não é heresia. Então como pode a teologia não entrar na ciência? Um clima tenso se estabelece entre as duas. Mary é um espelho muito difícil de olhar, as duas são cientistas e embora não saibam, ambas tem ligações semelhantes com religião e ciência. Marisa pensava que era muito influente, mas ela vê que Mary conseguiu tudo o que ela queria profissionalmente, chegou onde ela adoraria chegar e seu modo de reagir a isso é fugir. Lembrando que ela não fugiu de seu encontro com Lee Scoresby (Lin-Manuel Miranda), ela o encarou e ele falou coisas muito íntimas e pesadas, mas com Mary, ela sequer aguentou 5 minutos na mesma sala, aquilo ela não poderia encarar.

De volta à mansão, o macaco a espera, provavelmente solto por Boreal, mas ela claramente passou muito mais tempo fora, mas não é mostrada o que ela estava fazendo. A mulher e o daemon se encaram e conversam numa rápida troca de olhares, mas o que ela precisa mesmo é beber. Na sala de troféus de Boreal, os dois conversam sobre Mary. Para Marisa ela é livre, mas para Carlo é arrogante como a maioria das mulheres deste mundo. Nesse momento, ela começa a desabafar sobre o machismo que enfrentou em sua carreira, seu doutorado negado mesmo ela tendo as melhores notas da turma, os artigos que escreveu, mas que só poderiam ser publicados com o nome de um homem e como ela nunca teve escolha a não ser aceitar essas coisas. Ela comenta sobre o escândalo com Lorde Asriel (James McAvoy), que só para recapitular, os dois se envolveram quando ela ainda era casada, engravidou e quando a criança nasceu e não tinha nada a ver com o Sr. Coulter, disse que a filha morreu e a entregou para o verdadeiro pai, porque senão as duas estariam em perigo. Mas Edward Coulter descobriu tudo, foi atrás de Asriel e da criança, mas acabou sendo morto. Desde então ela não fala sobre o assunto. Quando ouve isso, Boreal pergunta “porque estamos falando sobre Asriel?” ao que ela responde que não estão. Estão falando sobre ela, sua filha, sua vida. Mais ainda, sobre a relação dela com homens, com o Magisterium, consigo mesma e com a sociedade, tudo voltado para como toda essa vivência construiu a relação que ela tem hoje com Lyra. Já indignada ela pergunta se Carlo teria sido mesmo o primeiro a atravessar uma janela. As ideias deste mundo seriam muito úteis no deles, mas ele ficou lá, colecionando trecos e a levou ali com a intenção de transformá-la em mais um tesouro, mas como ela diz, é muita areia para o caminhãozinho dele.

Fica então o questionamento: a Sra. Coulter é realmente a vilã dessa história? Ou seria todo o sistema opressor que a acompanha desde a primeira infância onde ela sofreu abuso dos próprios pais? Claro, não existe desculpa para ela sequestrar e mutilar crianças em nome da ciência, mas nos faz pensar no que ela própria diz, quem ela seria se tivesse nascido neste mundo? Ela poderia ser a Dra. Coulter. Ela poderia ter criado a filha sem maiores escândalos. Sua vida seria outra coisa.

Quando Lyra e Will colocam seu plano em ação e os dois principais núcleos se encontram é de longe o melhor momento do episódio. Como combinado, Lyra distrai Boreal na porta enquanto Will entra furtivamente na sala de troféus e pega o aletiômetro, eles só não esperavam a Sra. Coulter ali. Por mais que Will tente, o macaco dourado é mais astuto do que ele e estraga o plano. Lyra ouve a confusão na sala, sai correndo e então está estabelecido o confronto entre os quatro. Boreal quer a faca que está nas mãos de Will, Sra. Coulter quer Lyra que está na sua frente, Lyra e Will querem o aletiômetro nas mãos de Marisa e ninguém sabe direito como conseguir o que quer. Boreal e Will ficam em um impasse onde ninguém realmente se ataca, já que Will não quer mais machucar ninguém, mas pelo menos ele finalmente quebrou o boneco de barro que Marisa brincou mais cedo no episódio. Carlo, no entanto, é mais cruel e ameaça abertamente a mãe de Will. Enquanto isso a Sra. Coulter tenta seduzir Lyra com respostas, com poder, ela percebeu que a filha busca conhecimento como ela e tenta compra-la com isso, mas Lyra quer e sente que tem de ajudar Will, mas Marisa diz que Will não é confiável, não vale a pena ajuda-lo. Will não é confiável? Will que pega frutas do chão no meio da rua mesmo que não tinha ninguém lá e até agora só se preocupou com ela, ele não é confiável? Sra. Coulter apenas a machucou e magoou esse tempo todo, quem ela é para falar isso? Mas o ponto é que a mulher não está falando de Will, ela está falando de todos os homens que já passaram por sua vida, ela está falando sobre si mesma, não sobre Lyra.

No fim, acontece uma briga de daemons. Pan assume a forma de carcaju e avança no macaco dourado, numa clara referência a primeira temporada quando a Sra. Coulter faz o macaco avançar em Pan. É mais uma denúncia de maus tratos familiares e o mais interessante é que o macaco não reage, Marisa aguenta a dor sem atacar Lyra de volta, um fruto de sua conversa com Lee, talvez. Lyra pega o aletiômetro, Will abre uma janela, os dois correm e o macaco quase atravessa também, mas Will fecha a abertura a tempo e apesar de tudo, o roubo foi um sucesso. As crianças param para digerir o que aconteceu e os dois conversam sobre suas relações com suas mães, bem diferentes uma da outra e Lyra diz que gostaria de ser como Mãe Costa (Anne-Marie Duff) ou Lee, provavelmente as figuras paternas mais fortes que ela teve, mas Will diz que ela deveria ser apenas ela mesma, e que esses adultos é que adorariam ser como ela.

Coulter e Boreal também conversam, mas com um ar muito mais de agressivo. Eles precisam ir atrás das crianças, mas não é possível por conta dos espectros. Finalmente ele explica para ela o que são essas criaturas que só atacam adultos e uma lâmpada imaginária surge na cabeça de Marisa, ela parece ter entendido algo mais, já que os espectros são ao que parece atraídos pelo Pó e se alguém naquele lugar entende de Pó, é ela.

A única coisa que me preocupa nisso tudo é se essa chavezinha do machismo que foi virada na cabeça da Sra. Coulter vai levar a algum lugar. É difícil dizer, já que poder ter sido algo de momento e esquecerem isso rapidinho ou pode ser levado para a personagem daqui para frente e vai mudar completamente como ela pensa e ela como um todo de alguma maneira, eu não ficaria surpresa se ela estivesse planejando fugir para o nosso mundo se apossando da fortuna de Boreal e se tornasse a Sra. Latrom.

Voltando a Mary, quando Marisa vai embora eu amo que a primeira coisa que ela faz é jogar o nome dela no Google. Se não me engano, Lyra não chega a mencionar os outros mundos para ela. E quando na caverna, esta fala sem que ela pergunte algo e as perguntas que Mary faz não são respondidas. A voz de Xaphania (Sophie Okonedo), ou dos anjos, diz que ela precisa bancar a serpente, indicam um lugar para onde ela deve ir, que não vão falar mais naquele mundo e o equipamento simplesmente acaba. Esse é o poder dos anjos? Simplesmente destruir um trabalho tão difícil e caro em alguns segundos?

Eu prefiro como essa cena é no livro. A caverna dá as mesmas orientações, mas diz para Mary destruir o equipamento para que não caia em mãos erradas e ela o faz, acabando com suas próprias mãos com o trabalho mais importante de sua vida, tão séria é a situação. Mas bom, ela concorda e larga seu trabalho para seguir a missão que ela sabe que é importante. Chegando em casa ela lê uma bíblia (quando terá sido a última vez que Mary leu uma bíblia?) porque afinal, ela estava falando com anjos e a própria Sra. Coulter disse, onde a teologia não entra na ciência? Apesar de ter gostado, achei um foreshadowing muito forte. Em uma conversa com sua irmã ela desabafa de forma indireta e fala sobre férias, basicamente avisando que vai sumir para não deixar a família sem nenhuma satisfação. Depois, seguindo as indicações ela encontra um guarda e uma tenda. Facilmente ela joga um verde fingindo ter certa autoridade, o homem acha que ela é a Sra. Coulter e afinal, Mary vê uma janela para outro mundo pela primeira vez. Ela entra em Citagazze e eu entrei em desespero, porque ela não sabe sobre espectros, mas tudo bem, porque ela está sendo protegida por suas novas amizades.

Sobre o Magisterium temos uma cena só, mas ela consegue passar bastante informação. Para começar, todos que simpatizam com as ideias de Lorde Asriel estão sendo presos, o que levanta a pergunta: isso inclui catedráticos?  Para quem não lembra, as universidades tem uma espécie de privilégio que as permite questionar e estudar as doutrinas, além de dar asilo a pessoas, o famoso santuário escolástico que Asriel invocou para que o Reitor de Jordan (Clarke Peters) cuidasse de Lyra. Na temporada passada, a Sra. Coulter invadiu a universidade atrás da garota, dando a entender que o Magisterium não vai mais ser tão bonzinho. Agora com tudo isso acontecendo, o santuário escolástico ainda serve de alguma coisa? O conselho ali mostrado parece não saber ao certo o que fazer quanto à anomalia, eles podem até negá-la, mas ela está lá, então uma decisão precisa ser tomada. E como se isso já não fosse dor de cabeça o suficiente, questionam o agora Cardeal MacPhail (Will Keen) sobre onde está a Sra. Coulter e nisso chega a notícia do feito das feiticeiras, mataram diversos homens e atravessaram a anomalia, vem então a preocupação do que elas podem trazer de lá.

O Padre Graves (Sean Gilder) já diz que essa retaliação aconteceu por conta do ataque que MacPhail ordenou as ilhas das feiticeiras. Caso você ai tenha esquecido, Graves é o maior rival de MacPhail, ele ordenou o ataque as ilhas para não perder a eleição de Cardeals para ele. De início, MacPhail parece não saber lidar com tanta pressão, mas na verdade ele está mais severo e ferrenho. Diz que aqueles que morreram, morreram porque duvidaram da Autoridade, assim como Graves estava fazendo ali, então ordena sua prisão. Os que restam na mesa já entendem que não vão poder questionar o novo Cardeal sem nada acontecer.

Então, como o HBO Extras bem apontou, o Magisterium agora está começando uma inquisição, quem duvidar ou discordar deles, vai sofrer as consequências, porque a dúvida é a pior inimiga da fé. Até mencionam Copérnico, figura real que anunciou que a Terra girava ao redor do Sol , quando a igreja dizia o contrário. E a cena finaliza com MacPhail pedindo ao aletiometrista, Frei Pavel (Frank Bourke) para perguntar sobre o paradeiro da Sra. Coulter. Fica a dúvida se MacPhail ainda vai ser controlado por ela, ou se colocá-lo no poder foi maior tiro no pé que Marisa deu.

No ponto dos daemons, tanto Pan quanto o macaco dourado foram muito importantes para a narrativa e tivemos mais desse mistério de como a Sra. Coulter se afasta tanto de seu daemon, sem aparente dificuldade. Nesse quesito, ainda acho que a série, por não ter conseguido trabalhar tão bem assim a questão dos daemons na temporada anterior – tirando no último episódio que é simplesmente perfeito – ainda não consegue transmitir a gravidade dessa habilidade. Inclusive, a exclusão de uma cena do livro que se encaixaria no episódio anterior acabou fazendo falta, seria ótima para dar mais poder ao momento em que ela tranca o macaco e vai embora.

Originalmente durante a fuga de Lee e Jopari, um homem que ajudou a colocar o balão de Lee no ar acaba se desesperando um pouco e não solta a corda que segurava, o que o faz voar enquanto o balão decola, mas sua daemon terrestre, fica no chão. Depois de alguns segundos subindo o homem cai morto, por ter se afastado demais de sua daemon, o que Lee diz já ter presenciado algumas vezes.

Por outro lado imaginei qual seria a solução do roteiro caso não fosse introduzido desde a temporada passado a habilidade de Marisa de ficar distante do daemon , ela teria que andar com o macaco em uma mochila assim como Lyra fez com Pan. Mas o que ainda me irrita é como o macaco simplesmente some em certos momentos.

Momento comparação com o livro!

  • No livro, Will e Lyra tem um raciocínio bem mais rápido, já deduziram que os mundos se correspondem e testam isso um pouco. O máximo de planejamento que fazem é Will dizer que vai abrir uma janela para Lyra vigiar a porta da casa e uma para ele pegar o aletiômetro.
  • Quando Will e Tullio brigam, Tullio cai da torre e quando Giacomo está tratando suas feridas, Lyra vê Angélica e Paolo chegando até o rapaz, que é pego pelos espectros e morto na frente dos irmãos. Angélica vê Lyra no alto da torre e jura a garota de morte.
  • O contato de Marisa e Mary não acontece no livro.
  • O roubo do aletiômetro é completamente diferente. Enquanto Lyra vigia a porta por uma janela, Will abre uma na sala de troféus que está vazia e procura o aletiômetro, que não está mais no mesmo lugar. Lyra avisa que Boreal está chegando com Sra. Coulter (é a primeira vez que a vemos no segundo livro) e Will se esconde em uma janela atrás do sofá. Marisa e Carlo tem um diálogo bem expositivo, mais interessante para quem lê do que para Will, conversam sobre tudo que aconteceu, o plano de Asriel, a guerra, os outros mundos e como Boreal pegou o aletiômetro. 
  • Basicamente tudo que foi dito nesse episódio, é dito apenas nesse momento no livro, até mesmo informações colocadas nos outros episódios. Os pontos mais importantes são quando ele conta que por causa do que Asriel fez com o polo magnético agora os mundos podem se conectar sem passar pela encruzilhada, Citagazze, ele tem atravessado direto de seu mundo para o nosso; ela fala sobre soldados que estão com ela, todos passaram pela intercisão então não possuem medo, imaginação, nem vontade própria e vão lutar por ela até sua morte; e comentam sobre a pesquisa de Mary. Não existe nenhuma conversa sobre machismo, até porque a Sra. Coulter parece ter acabado de chegar ao nosso mundo e sua voz encanta Will.
  • Para criar uma abertura, Lyra joga pedras nas janelas da mansão de Boreal, o que distrai os adultos e Will consegue pegar o aletiômetro, o macaco dourado vê e Will precisa tentar acertá-lo com a faca para que ele se afaste e a janela seja fechada. Will corre para a outra janela e vê Sra. Coulter, Boreal e o macaco dourado procurando por Lyra no jardim, até que a gata que salvaram em Citagazze e mostrou a primeira janela para Will aparece e chama atenção para que Lyra atravesse para junto de Will e a janela seja fechada. Lyra chega a comentar que por um instante a gata era a daemon de Will.
  • Como o encontro de Lyra e Sra. Coulter não acontece, também não existe a conversa sobre Mãe Costa e Lee.
  • Originalmente, Mary fala com a caverna uma vez só, ela inclusive tem uma suspeita do porque da “vingança”, mas por ser um possível spoiler vou deixar aqui de fora. No geral pouca coisa muda, as indicações para a janela são um pouco diferentes e no final é dito “a última coisa que você tem a fazer neste mundo é impedir que os inimigos tomem o controle. Destrua este equipamento. Faça isto agora mesmo e parta imediatamente.” Então Mary apaga HDs, quebra equipamentos e destrói aquele trabalho que se dedicou tanto, para que não seja usado de modo errado.
  • Temos um timeskip da destruição da caverna já para Mary indo até a janela com uma grande mochila pronta. Ela já se apresenta para o guarda com uma identidade falsa que ela fez com um cartão vencido de Oliver, porque ela já está expulsa do projeto, o segurança tem ordens de prender Mary Malone se ela aparecer. Então o guarda acha que ela é a Dra. Olive ou Oliver Payne e assim ela consegue atravessar, mas não sabemos para onde. Esta é a última vez que vemos Mary em A Faca Sutil.
  • No livro não temos a cena do Magisterium, porque não os acompanhamos até o terceiro livro.

 

Momento informação interessante do HBO Extras!

  • Para Phillip Pullman, nada se compara a Fronteiras do Universo. Ele não gosta de ser comparado com As Crônicas de Nárnia ou O Senhor dos Anéis, tendo já escrito um ensaio qualificando os livros de Nárnia como racistas e sexistas e já ter dito que Tolkein estava muito mais preocupado com mapas, planos, línguas e códigos do que na forma como os seres humanos adultos interagem.
  • O esqueleto de um australopitecos está na sala de troféus para mostrar que Boreal acredita no evolucionismo, não no criacionismo, que assim como a viajem entre mundos seria uma grande heresia para o Magisterium. Em outras palavras ele e a Sra. Coulter trabalham para a igreja, mas ele não acredita na religião.
  • O tráfico ilegal de antiguidades movimenta de 5 a 15 milhões de dólares por ano e coloca países e culturas em sério risco.
  • Na abertura da série, aquela primeira explosão mostra anjos feitos de matéria escura, desde a primeira temporada.
  • As escadas de Cittagazze foram inspiradas no trabalho de M. C. Escher, artista holandês que desenhava ilusões de ótica.
  • O pedaço do muro de Berlim que Boreal tem é uma metáfora sobre mundos iguais, mas muito diferentes, separados por uma barreira.
  • A produção da série viajou por toda Europa procurando objetos para compor a decoração de Citagazze.
  • O designer de produção contou que Pan toma a decisão de se transformar em panda-vermelho porque viu um desses animais na marca de refrigerante de Citagazze, que aparece no primeiro episódio.
  • As vestes de MacPhail estão com um ar mais militar.
  • Mary tem no seu escritório o livro A Natureza da Consciência, de David Chalmers, o autor fala no livro sobre a possibilidade de a consciência ser universal, estando presente em todos os sistemas e partículas.
  • Citagazze levou 6 meses para ser construída, criaram uma experiência imersiva, sem telas verdes, apenas o cenário real e Dafne Keen chegou a se perder algumas vezes no set.
  • Bella Ramsey já venceu um BAFTA.
  • O trecho que Mary lê na bíblia é gênesis 3:1.
  • A ponta da Torre degli Angeli além de parecer com a ponta da faca tem a intenção de parecer estar ferindo o céu, um anúncio de como Jopari disse, a faca seria importante para a guerra com a Autoridade.
  • Segundo o app, o macaco dourado não fala porque Marisa suprime seus sentimentos e emoções, essa desconexão impede a empatia, o que permite os níveis máximos de crueldade.
  • Marisa copia a linguagem corporal do macaco nesse episódio e em outros momentos da série.
  • É citado o Efeito Matilda, que consiste em não reconhecer as conquistas das mulheres cientistase cita as mulheres que descobriram o DNA, Rosalind Franklin, o pulsar, Jocelyn Bell Burnell e a fissão nuclear, Lise Meitner. Seus créditos e prêmios Nobel ficaram com Watson e Crick, Hewish e Otto Han. Além de muitas escritoras que fingiram ser homens para serem publicadas ou lidas como Amantine que assinava como George Sand ou Louisa May Alcott que assinou alguns livros como A. M. Barnard ou J. K. Rowling que no início da carreira tentou ser convencida a publicar Harry Potter sob um pseudônimo masculino. Ironicamente ao final desta série, escreveu sua série de livros de mistério sob o nome de Robert Galbraith.
  • Algumas pessoas comparam Cersei de Game of Thrones (2011 – 2019) com a Sra. Coulter, por serem mulheres fortes, mas impedidas por entidades maiores de alcançarem o que querem e viverem a sombra de seus amantes que representam tudo que elas desejariam ser.
  • A série deu um paradeiro para o quadro desaparecido O Concerto, de Johannes Vermeer. Roubado do museu Isabella Stewart Gardner, de Boston, está na sala de troféus de Boreal.
  • Dafne Keen estava de férias em Porto Rico quando os produtores da série lhe mandaram um e-mail, pedindo um vídeo de audição para aquela noite. Acabou que no mesmo dia ela foi picada por uma água-viva no rosto, o que deixou seu rosto bem deformado, mas mesmo assim ela gravou o vídeo que lhe garantiu o papel de Lyra.

No fim, foi um bom episódio, apesar de eu ainda achar que existem algumas conveniências estranhas e não termos notícias de Lee, Jopari ou das feiticeiras, a jornada da Sra. Coulter é muito interessante e espero que isso importe para a personagem daqui para frente.