O Mundo Sombrio de Sabrina: Parte 3 – Paganismo, viagem no tempo e drama adolescente

Em sua terceira parte, a série O Mundo Sombrio de Sabrina (Chilling Adventures of Sabrina, 2018 -) trouxe de volta a bruxa adolescente Sabrina Spellman (Kiernan Shipka) em mais uma jornada ao lado de sua família e seus amigos. Depois da descoberta sobre sua verdadeira linhagem de sangue, e como herdeira de Lúcifer (Luke Cook), Sabrina vem tentando encontrar uma forma de entrar no Inferno para resgatar o seu namorado – Nick Scratch (Gavin Leatherwood).

A série volta com um episódio seguindo a jornada de Sabrina e seus amigos mortais através do Inferno, com referências bem macabras ao clássico O Mágico de Oz. É neste mesmo episódio onde são revelados pontos importantes nos quais a temporada se aprofunda ao longo de seus oito episódios. Um dos enredos importantes dessa temporada se trata de quem sentará ao trono no Inferno, mesmo com a temporada anterior se concluindo com Lilith (Michelle Gomez) sendo coroada rainha.

É desnecessário ressaltar o quanto a personagem Lilith é um dos pontos mais fortes da série em seu terceiro ano seguido. Dessa vez, a atriz Michelle Gomez faz jornada dupla atuando como Lilith e também como a professora humana de Sabrina – Mary Wardwell. A segunda foi retornada dos mortos pela ‘rainha’ do Inferno ainda no final da temporada anterior e termina se mostrando uma adição bem fraca numa temporada já recheada de personagens. 

Durante sua jornada no Inferno a herdeira de Satã faz inimigos, dentre os quais está Caliban (Sam Corlett) – o príncipe do Inferno feito de areia. Toda a jornada da jovem bruxa abordando o trono do Inferno e sua ‘competição’ com Caliban pelo trono se tornam um plano de fundo para dramas muitas vezes desnecessários da temporada. Mesmo assim, é interessante explorar mais a mitologia do inferno e também a relação de todo esse espaço e seus poderes com a religião cristã. 

Enquanto a protagonista passa por seus dramas pessoais, seu coven enfrenta grandes problemas quando os poderes de todas as bruxas passam a enfraquecer até sumirem. Os problemas ocorrem devido à traição, especialmente da família Spellman, ocorrida durante o final da segunda temporada quando se voltaram contra Lúcifer. Responsável pelo Coven, ou o que havia restado dele, Zelda Spellman (interpretada pela magnífica Miranda Otto) é em quem essa narrativa mais reflete.

Desde o primeiro ano da série, a personagem é tida como a mais fiel às normas da Igreja da Noite e isso fez parte do seu arco durante as duas primeiras partes. Zelda foi a mais relutante quando Sabrina começou a demonstrar sinais de rebeldia contra o Senhor das Trevas e os ensinamentos satânicos (lembrando, na série o satanismo apresentado não possui relação de verdade com o satanismo praticado na vida real). A personagem de Otto passa por uma longa transformação quando no ano anterior da série se mostrar veementemente disposta a ir contra Lúcifer para proteger Sabrina. 

O arco pelo qual Zelda Spellman passa a consagra como uma forte mulher e bruxa, crescida dentro de meios onde suas capacidades nunca seriam tão apreciadas como a de homens bem menos capazes – como mostrado através do Padre Blackwood (Richard Coyle). A mensagem passada pela trajetória da personagem, em especial nessa temporada, é de valorização do feminino, que traça também uma interessante ponte entre a magia das bruxas e uma entidade mais fiel a elas do que o egoísta Lúcifer.

Dentre os muitos personagens presentes nessa temporada é interessante ressaltar o quanto o enredo de Prudence (Tati Gabrielle) melhora em comparação ao do ano anterior. Ainda cercando a sua relação com seu pai, Padre Blackwood, a jovem bruxa começa a temporada num caminho de vingança para eliminar o responsável pela quase morte de suas irmãs, Dorcas (Abgail Cowen) e Agatha (Adeline Rudolph), na temporada anterior. Ao lado de Ambrose Spellman (Chance Perdomo), outro personagem prejudicado pelas manipulações de Blackwood na temporada dois. 

A aventura dos dois desde a última parte da série os levou a muitos lugares, os fazendo cruzar com a personagem interpretada por Skye Marshall, Mambo Marie. Os dois bruxos negros criados nos costumes da Igreja da Noite tem, no início da temporada, contato com a magia vodu e Mambo Marie termina fazendo um retorno para auxiliar o coven mais tarde na temporada. 

É interessante pensar como as trajetórias tanto de Ambrose e Prudence foram marcadas pela dor e pela busca de aceitação de um homem branco durante a segunda parte da série. Ao mesmo tempo o elenco regular da série nos trás Jaz Sinclair como Rosalind Walker, a melhor amiga de Sabrina. Após ter sua visão restaurada na temporada anterior – a mesma onde ela havia perdido a visão, ela ajuda na viagem de Sabrina ao inferno e as duas se juntam as líderes de torcida da escola. Mesmo assim a temporada falha em aprofundar mais ou desenvolver a personagem, num determinado momento apenas a colocando como um obstáculo entre Sabrina e seu ex.

Após meses juntos buscando Blackwood o envolvimento dos dois, Prudence e Ambrose, aparentemente se aprofundou, mesmo eles já tendo sido mostrados tendo relações sexuais desde a primeira temporada da série. A relação deles com Blackwood os coloca como alvos para um dos antagonistas da série, o próprio Padre, assim como também os envolve numa trama relacionada a viagem no tempo.

Falando em viagem no tempo, a temporada termina usando de ‘magia do tempo’ para criar alguns problemas e resolver outros. O enredo foi previamente apresentado pelo Padre Blackwood, para quem passaram anos em vez de meses desde o final da segunda temporada da série. Viagem no tempo já é algo bem difícil de se trabalhar em narrativas, mas a mistura com magia torna o conceito bem mais confuso e a série termina o utilizando mal. No final a temporada termina seguindo a lógica de ‘Guerra Infinita’ em seu penúltimo episódio e ‘Ultimato’ em seu final.

Os antagonistas principais da temporada são ‘os Pagãos’, personagens que montam um circo na cidade e na verdade são criaturas místicas inimigas da Igreja da Noite e seus bruxos. No meio de várias tramas muito importantes, os Pagãos terminam ecoando como um aviso de um perigo prestes a se concretizar. A busca deles é por um sacrifício virgem, algo nada original quando se trata de filmes de terror e rituais macabros. No final eles não se sustentam muito como vilões, seja dentro da narrativa ou em um combate contra os protagonistas. 

Muito se bebe da mitologia grega se tratando dos Pagãos, com a presença de entidades como Pan, uma górgona e até Circe (Lucie Guest). Os personagens não são nem um pouco aprofundados e nem sua relação com sua religião, terminam sendo muito mais jogados como inimigos poderosos – até a trama não precisar que eles sejam tão poderosos. É através do arco deles e sua busca por um sacrifício virgem que o envolvimento dos amigos humanos da Sabrina se aprofunda mais. Mesmo com um romance extremamente bonito de se ver entre Theo (Lachlan Watson) e Robin (Jonathan Whitesell), garantindo momentos de fofura, o núcleo humano permanece sendo uma das partes mais fracas da narrativa.

A relação dos adolescentes volta a ser algo massante como na primeira temporada, envolvendo tanto Sabrina fazendo besteiras por causa de algum garoto, quanto momentos de ciúmes e coisas do tipo. O enredo pega todo o personagem construído ao redor de Nicholas Scratch na segunda temporada e o torna um completo babaca com fito de dar razão para o relacionamento entre ele e Sabrina acabar e liberar caminho para a possível trama enfadonha de Sabrina com Harvey Kinkle (Ross Lynch).

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