Um homem bonito à porta de um Estúdio em Hollywood e a busca por uma oportunidade de atuar em qualquer produção, realizando assim o sonho de uma carreira como ator. É assim que começa Hollywood (2020), série roteirizada e dirigida por Ryan Murphy e Ian Brennan. A princípio acreditamos que esse homem não terá nenhum problema para conseguir o que deseja, visto que faz o tipo “galã” e sabemos que para a tela (de cinema ou de TV) aparência é muito importante. É então que nos deparamos com a seguinte frase de uma assistente de casting que surge à porta: “Não basta apenas ter um rostinho bonito para ser ator.” E cai por terra a nossa crença inicial (ou senso comum).
A partir daí, acompanhamos Jack Castello (David Corenswet) e descobrimos que, na verdade, ele é casado e enfrenta dificuldades financeiras. Nesse contexto, a esposa Henrietta (Maude Apatow) lhe cobra que trabalhe para ajudar também nas despesas da casa. Nesse conflito entre seguir tentando ser ator e arranjar um trabalho para bancar as contas, ele conhece Ernie West (Dylan McDermott) e é então que tudo muda.
Ernie é dono do posto Golden Tip (e ator frustrado) e se orgulha de oferecer a melhor “troca de óleo” (perdão pelo trocadilho) a seus clientes. Jack fica contrariado a princípio com o tipo de serviço que precisará prestar, mas devido às circunstâncias, acaba topando levar clientes para a “Terra dos sonhos”. Nesses encontros, ele conhece pessoas de dentro da indústria cinematográfica e faz importantes conexões com o objetivo de realizar o sonho de ser ator em Hollywood. No desenrolar da trama, novos personagens são apresentados, primeiro individualmente e depois conectados com os demais, inseridos dentro da estória (não vou detalhar para não dar spoilers).
A série trata de temas muito presentes hoje, mas na época, praticamente inexistentes ou abafada. Homofobia, racismo, assédio sexual, machismo. E, embora recorra ao humor em certos momentos, não deixa de fazer forte crítica ao preconceito existente em Hollywood e na sociedade como um todo. Visto que a narrativa se passa nos anos 50, menciona a segregação racial ainda existente na Los Angeles da época. Fato que fez com que uma atriz negra (Hattie Daniel, interpretada por Queen Latifah) indicada ao Oscar de atriz coadjuvante anos antes, fosse impedida de entrar no Teatro onde a cerimônia acontecia. Esse é um dos fatos reais que a série traz em meio à ficção.
A hipocrisia é bastante recorrente na narrativa. Seja pela necessidade de esconder a própria sexualidade para não “prejudicar” a sua reputação, seja pelos casamentos “de faxada”. Henry Willson (Jim Parsons) é um agente de atores que abusa de seus clientes sob o pretexto de ajudá-los a conseguir papéis. Um dos personagens que mais causa repulsa no espectador. E ele, como outros, de fato existiu. Não à toa, mais recentemente chegou a conhecimento público tantas denúncias de assédio e abuso sexual em Hollywood. Grande parte delas feitas por atrizes, porque mulheres ainda são a maioria a sofrer esse tipo de violência. Mas não é incomum que homens, especialmente homens gays, sofram também.
Na série, Murphy opta por não abordar esse assunto da perspectiva das mulheres. Aliás, com exceção do racismo encarado pela personagem Camille Washington (Laura Harrier), as mulheres na série estão sempre se mostrando superiores ou em nível de igualdade com os homens: Henrietta esposa de Jack, que é a responsável por manter a casa (a provedora), Avis Amberg (Patti LuPone) que assume o papel de Presidente da Ace Studios e toma diversas decisões que levam ao sucesso da Produtora, do qual ela se vangloria, Ellen Kincaid (Holland Taylor) que demonstra uma habilidade incontestável para aperfeiçoar atores e a própria Camille Washington que atua excepcionalmente!
A narrativa é toda atravessada pela produção de um filme. Então podemos acompanhar as etapas dessa produção, com suas implicações: aprovação do roteiro, seleção dos atores, aprovação do orçamento, ensaios dos atores, gravações, montagem e distribuição, são algumas que ficam mais evidentes. Para os amantes de Cinema, em especial os que já tiveram a oportunidade de produzir, é algo que encanta! Quando o filme fica pronto e você vê as pessoas assistindo e gostando, a sensação de realização é maior do que toda a dificuldade envolvida.
No fim, Ryan Murphy nos dá motivos pra sorrir. Embora a gente não espere por isso, visto tudo o que é apontado pela trama. E, assim como em “Meg”, que antes era “Peg”, o roteirista toma a decisão de mudar o final da estória para aquilo que ele considera ideal. Um fim que, se de fato tivesse acontecido nos anos 50, talvez não precisássemos exigir hoje o que é justo: Representatividade!
Bacharela em Cinema e audiovisual, adora maratonar séries e salvar vários filmes na lista da Netflix. Ama filmes clássicos e estórias com reflexões profundas. Às vezes escreve sobre audiovisual!