Arlequina é definitivamente uma estrela em ascensão. Sua revista é uma das mais vendidas da DC Comics atualmente, com Esquadrão Suicida (Suicide Squad, 2016) a personagem caiu tanto no gosto do povo que ganhou sua continuação com o recente Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa (Birds of Prey: and the Fantabulous Emancipation of One Harley Quinn, 2020).
Mas não só de live actions vive a DC, então não demorou muito para surgir o projeto de uma série de animação da Arlequina para o DC Universe, a plataforma de streaming da empresa que tem contado com conteúdos originais que tem agradado muito o público, como Titãs (Titans, 2018 -) e Patrulha do Destino (Doom Patrol, 2019 -).
Usando então a pegada mais adulta que tem sido dada ao Universo de Filmes Animados da DC (sim, isso existe e é muito bom) e a outras séries da empresa para dar atenção ao público mais velho, mas a levando ao limite para ser uma série para maiores de idade, surge Harley Quinn (2020 -).
A premissa da série é a mesma dos quadrinhos e de Aves de Rapina. Arlequina e Coringa se separam e agora ela tem que se tornar uma vilã/mercenária independente, mas ao contrário dessas duas, em Harley Quinn o Coringa é um personagem recorrente, sempre mexendo com o psicológico de Harleen e seu objetivo de entrar para a Legião do Mal.
A série é pautada no humor ácido e na violência e, de cara, é possível perceber algumas referências como A Casa Animada (Draw Together, 2004 – 2007) e Ugly Americans (2010 – 2012) no que diz respeito ao gore e ao timing das piadas, até mesmo o ritmo que os personagens falam lembra essas duas séries, mas também á Os Jovens Titãs em Ação (Teen Titans Go!, 2013 -) quando se trata de tirar sarro do universo do Batman e da própria DC e eu diria até mesmo pegando um pouquinho de Lego Batman: O Filme (The Lego Batman Movie, 2017) quando é tratada a ideia de que o verdadeiro amor do Coringa é o Batman.
Os 13 episódios mostram uma clara evolução da Arlequina, cada um com um tema que irá fortalecer a personagem como independente. O término, a procura de uma equipe, a escolha de um covil e até a busca por um arqui-inimigo, sem nunca esquecer seu objetivo principal de fazer parte da Legião do Mal. Auxiliada pela Hera Venenosa e alguns amigos que faz ao longo do caminho.
Com o decorrer da série, Arlequina não apenas cria sua independência como também reinterpreta a si mesma, adotando os cabelos loiros com pontas coloridas e o colete rubro negro como nos quadrinhos e dizendo que sua história de origem não é mais quando ela cai no tonel de produtos químicos, e sim quando ela derrotou o Coringa e seus capangas quando terminaram. O clássico traje preto e vermelho da série animada agora é um símbolo da dominação do Coringa sobre ela e quem ela era com ele, algo que ela não planeja deixar que aconteça novamente.
A jornada da palhacinha é não apenas muito bem escrita como muito engraçada cheia de situações inusitadas, como a Arlequina estragando o bar mitzvah do sobrinho do Penguim ou quebrando o tempo todo a televisão e a mesa da Hera Venenosa. Sua inesperada equipe também tem seu charme, com um Tubarão Rei hacker, um Cara de Barro que sonha em ser ator, um Dr Psycho raivoso e misógino e diretamente dos quadrinhos o velho ciborgue Sy Borgman, a dinâmica entre eles flui muito naturalmente e logo você se apega a eles.
O elenco original se sai muito bem dando voz a seus personagens, deixando claro suas distintas personalidades. Kaley Cuoco se sai muito bem dando voz a Arlequina, claramente tendo referência em Tara Strong, a atriz que fazia a voz da Arlequina em praticamente todas as obras animadas até então.
Com seus palavrões e piadas ácidas, Harley Quinn consegue assim como Aves de Rapina, ainda falar muito sobre machismo e como é ser uma mulher em um mundo dominado por homens. O relacionamento dela com o Palhaço do Crime talvez nunca tenha sido retratado de modo tão real. Ele não aparece a espancando e tentando mata-la como geralmente acontece, ele a ofusca, ignora, esquece e depois faz juras de amor e joguinhos psicológicos que ainda a assombram mesmo depois de se distanciar dele.
Harley nutre ainda o sonho de se provar para a Legião e mostrar que é capaz de estar entre eles, já que os maiores vilões do mundo estão lá, sendo que desde sempre fica claro e é reforçado por Hera que aquele grupo é apenas um grande clube do Bolinha cheio de idiotas e que Harley não deve nada a eles.
A animação não é muito fluida, na verdade é um pouco travada, lembrando muito A Casa Animada nesse quesito também, mas cumpre seu propósito e existe uma atenção especial para as cenas de ação todas muito bem coreografadas e sangrentas, e quando se trata de cenários, a série não economiza, a cada episódio existem pelo menos dois novos cenários inéditos.
Harley Quinn ainda conta com um grande elenco de personagens do universo do Batman e da DC, contando tanto com grandes nomes como Superman, Mulher-Maravilha, Bane e Charada, como com personagens mais desconhecidos do público como o Homem Pipa e o Homem Calendário, seja de modo recorrente ou como participações especiais ou até mesmo aparecendo ao fundo para os fãs mais hardcore reconhecerem.
Mesmo tendo adorado a série, nada é perfeito. Apesar da parceria Arlequina e Hera ser incrível e um dos pontos altos da série, o resto da equipe da Dama do Delírio é composta de homens e a maioria dos personagens do seriado também o são. A série ganharia muito com a participação de mais personagens femininas, mesmo que pontuais para manter a vibe de Arlequina e Hera contra o mundo de homens. É possível ver ao fundo em alguns momentos a Mulher-Leopardo e Nevasca fazendo parte da Legião do Mal, e as duas falando com a Arlquina sobre como é estar naquele grupo teria sido um momento precioso.
Também sinto que foi perdida a oportunidade de se mostrar mais membros da Batfamília como Asa Noturna e Batgirl, mesmo que James Gordon e Batman sejam personagens recorrentes e o Robin faça uma participação especial. Além de parecer ter havido certo medo em tratar a relação Arlequina e Hera como algo além de melhores amigas, fazendo a eco-terrorista ter um romance um pouco forçado com um dos personagens recorrentes em um estilo que lembra o beijo do Capitão América com a sobrinha de Peggy Carter.
A temporada termina de um modo apocalíptico e cheio de ganchos e possibilidades para uma já confirmada próxima temporada, que promete ser ainda mais caótica do que a primeira.
Bacharel em Cinema e Audiovisual, roteirista, escritora, animadora, otaku, potterhead e parte de muitos outros fandoms. Tem mais livros do que pode guardar e entre seus amigos é a louca das animações, da dublagem e da Turma da Mônica. Também produz conteúdo para o seu canal Milady Sara e para o Cultura da Ação TV.