Estando presente em qualquer atividade diária que fizermos, o smartphone serve como escape para aquela festa chata, em outros casos, inserimos o aparelho até em ocasiões em que necessitamos de se desconectar por um tempo — como a assistir a um filme, almoço, reunião —, e ainda que alguns o tenham para coisas básicas, boa parte já se encontra na praticidade que os aplicativos desenvolvidos conseguem ofertar: terapia, receitas, notícias, controle de exercício físicos, cronograma de estudo gratuito, etc. Agora imagine um aplicativo que pudesse informar o momento exato da morte do usuário, o buzz seria alto por conta da curiosidade. Essa é a premissa de A Hora da Sua Morte (Countdown, 2019), que não consegue entregar além da mesmice que o terror detém.
Falando assim parece que teremos uma pegada no estilo Premonição (Final Destination, 2000), mas Countdown já abre mostrando que o tempero aqui será “diferente”, ainda que disponha de uma atmosfera interessante pra isso. E para acompanharmos mais do aplicativo que tá no boca a boca, Quinn Harris (Elizabeth Lail) não resiste e baixa o então pavoroso app, apenas para descobrir que tem dois dias e algumas horas de vida. Quem vai acreditar no que um aplicativo diz?
O roteiro escrito pelo também diretor Justin Dec segue a risca a tabelinha para movimentar o longa: Quinn não acredita até receber um sinal dos infernos para temer por sua vida. Em seguida, vem as pesquisas que apontam que o app Countdown é mesmo sinistro e que ela precisa fazer algo a respeito se quiser sobreviver. Assumir esta fórmula ao mesmo tempo que aplica uns jumpscares que só confirmam o quão acomodado o filme se desenrola, é a prova que as escolhas duvidosas inseridas para um longa que realmente pretendia trazer um frescor na sua proposta, não o favorece.
A atmosfera que começou competente no início se perde com os artifícios fáceis para tornar a produção aterrorizante, erra feio por estarmos familiarizados até com a forma que o susto fácil surge. No entanto, a mitologia sobre o aplicativo que decreta uma sentença de morte ganha força pelo tom debochado e descontraído que Dec preferiu tratar as vítimas e às maneiras desesperadas que arriscaram para saírem ilesos. E para maior divertimento, vale a convocação para o sobrenatural envolvendo rituais que dão um adendo satisfatório com o terror que estava brincando com a própria ideia.
Apesar dos êxitos, A Hora da Sua Morte se estabelece nessas idas e vindas (não no bom sentido) que abandona as sequências de acertos para requentar facilitações que só quebram o ritmo e a boa sacada que conseguiu encaixar com carisma do elenco. O pior é que a conveniência foi usada a favor de um arquétipo dramático desnecessário, forçado e incapaz de convencer. A partir disso, Dec achou que seria a brecha ideal para ir direto ao ápice, que termina por manchar a lógica por trás do aplicativo, assim como desfazer da forma banal e incitante que a ameaça se fazia presente. Ou seja, o primeiro ato não foi inteligente, o segundo quis ser uma coisa a mais e o terceiro tratou de ser que nem o começo: estragar tudo.
No meio de todo o alvoroço, Countdown combinou dois pontos no seu enredo: criticar, já desconcertado, como instalamos aplicativos sem nem ler os termos (e quem lê?), depois, não deixar escapar a relevância de um arco sobre assédio (que inclusive rende outra acerto momentâneo pro terror), e isso, numa trama muito inconsistente para se sustentar. Por fim, A Hora da Sua Morte é mais um título nessa leva de filmes de terror que insiste em trazer o demônio para a internet, os smartphones e seus intermediários. E como os demais, Justin Dec não conseguiu elevar o bom conceito além do que a mesmice pode promover.. Dentre os remakes e reboots que a desbravam, a tecnologia no horror sobrenatural ainda não encontrou seu upgrade.
Ama ouvir músicas, e especialmente, não cansa de ouvir Unkle Bob. Por mais que critique, é sempre atraído por filmes de terror massacrados. Sua capacidade de assistir a tanto conteúdo aleatório surpreende a ele mesmo, e ainda que tenha a procrastinação sempre por perto, talvez escrevendo seja o seu momento que mais se arrisca.