Alien: Romulus – Um frescor para a franquia

Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que eu sou obcecada pela franquia Alien. É um dos meus impérios romanos, especialmente o modo como ela se liga à franquia Predador. Então como toda pessoa fã de Alien, nos últimos anos eu sofri mais decepções do que satisfações e estava com as expectativas mais baixas possíveis para Alien: Romulus (2024). Tinha alguns problemas com o diretor Fede Alvarez e o primeiro teaser me pareceu muito genérico então nem fiz questão de assistir aos trailers, mas ainda queria muito assistir ao filme. E depois de assisti-lo na cabine de imprensa eu peço o perdão pelo palavrão, mas que filme foda!

Primeiro gostaria de dizer que você pode tranquilamente assistir a esse filme sem ter conhecimento prévio nenhum da história. Basta gostar de uma história de terror com monstros no espaço que sua diversão é garantida.

De onde viemos e para onde vamos?

Agora, como introduzir uma das minhas franquias de filmes favoritas? Vamos partir dos primórdios. Tudo começou com Dark Star (1974), uma ficção científica que hoje é considerada cult, mas que talvez não valha o seu tempo, apesar de ser o primeiro filme dirigido por John Carpenter, tem uma pessoa lutando com um alienígena que mais parece uma bola de praia a vassouradas. Nossa pessoa de interesse no entanto é Dan O’Bannon, que fez parte do roteiro e atuou no filme.

Nosso querido imaginou como seria Dark Star, sem a comédia, então chamou o amigo Ronald Shusett e alguns tratamentos depois tinham um roteiro ótimo que foi engavetado, mas depois de Star Wars: Episódio IV – Uma Nova Esperança (Star Wars: Episode IV – A New Hope, 1977) a 20th Century Fox – hoje 20th Century Studios – quis correr atrás do prejuízo e lançar mais aventuras espaciais, já que levaria três anos para o próximo Star Wars, e colocou o roteiro engavetado para acontecer. Obrigada, George Lucas

Ridley Scott foi chamado para dirigir e H.R. Giger para fazer os designs e assim nasceu Alien – O 8º Passageiro (Alien, 1979), icônico filme de terror, espetacularmente dirigido, cheio de metáforas, subtextos interessantes e, porque não dizer, até mesmo um flerte comunista ao colocar uma grande corporação como a verdadeira grande vilã. Tempos depois uma continuação foi encomendada com James Cameron na direção, e aí veio Aliens: O Resgate (Aliens, 1986) que é um filme ótimo, mas joga o terror pra longe e é na verdade um filme de ação. Depois, ainda tivemos Alien 3 (Alien³, 1992) e Alien: A Ressurreição (Alien: Resurrection, 1997) que têm algumas coisas interessantes, mas na verdade foram grandes palhaçadas que serviram apenas para garantir o pagamento dos boletos de Sigourney Weaver.

Uma fagulha de esperança para a franquia veio quando Ridley Scott demonstrou interesse em explorar o passado daquele universo, partindo do misterioso “Space Jockey” do primeiro filme. Surgiu assim Prometheus (2012), um filme visualmente lindo que se inspira na teoria pseudocientífica dos astronautas antigos – aquela que diz que os humanos foram criados por alguma raça alienígena que passou por aqui. Partindo dessa baboseira, mas que até faz sentido pra história da franquia, temos um filme muito nada com nada cheio de cientistas burros que não entrega – imagine só – nada. Nem a nave caída ou o planeta são os do primeiro filme, são duas horas de tramas que não vão para lugar nenhum, apenas, com um diálogo cortado que salvaria muita coisa. 

Então tivemos Alien: Covenant (2017), que talvez trabalhe melhor algumas questões filosóficas e religiosas de Ridley Scott, mas no fim são só boas cenas de ação com cientistas ainda mais burros que desperdiçaram o Michael Fassbender, mas a coleção de curtas que foi feita para promover o filme é até bacana. Com o fracasso de Covenant o terceiro filme que Ridley JURA DE PÉS JUNTOS que conectaria finalmente essa trilogia com os outros filmes, nunca foi realizado.

As histórias de Alien continuam em quadrinhos e livros lançados até hoje que expandem o universo, mas eu ainda não comecei a ler e tem alguns jogos, sendo o mais famoso Alien: Isolation (2014), sobre o qual temos um texto escrito por Lena Rodrigues. O jogo pode ser adquirido na Steam e está em promoção para acompanhar a estreia do novo filme. Alien também rendeu um sistema de RPG muito legal que eu mesma já mestrei e que mesmo para quem não gosta de RPG de mesa, pode ser interessante dar uma olhada pois toda a situação geográfica e política da galáxia está descrita lá, além de detalhes sobre o ciclo de vida dos Xenomorfos.

Chega de enrolação, vamos falar de Alien: Romulus!

Novidades, finalmente!

O que mais me agradou neste filme foi o frescor que ele trouxe para Alien. Começamos de cara em uma colônia da Weyland-Yutani. Apesar de Aliens: O Resgate se passar em Hadley’s Hope uma colônia de terraformação, quando a vemos, tudo já foi tomado pelos Xenomorfos, enquanto Jackson’s Star é uma colônia de mineração em pleno funcionamento, cheia de gente sendo explorada, poeira e fumaça.

Nossos protagonistas estão lá e são os cidadãos mais comuns possíveis, e jovens adultos, indo contra o protagonismo 30+ da franquia até então. Sim, são empregados da WY, mas são do mais baixo escalão possível, não viajam com naves, não são cientistas e estão sendo explorades até a morte. É aí que entra o nosso plot. Nosso grupo jovem até tem uma nave onde poderiam fugir para Yvaga, um planeta já terraformado onde poderiam voltar a ver o Sol, mas ela não tem câmaras de criogenia para sustentá-los durante a viagem de 9 anos. É descoberto então que a estação de pesquisa abandonada Renaissance está orbitando o planeta e decidem roubar suas câmaras de criogenia para poderem fugir, antes que ela se choque com o anel de asteroides do planeta e tudo vá para as cucuias.  

Um plano perfeito, não é mesmo? Seria, se a estação não tivesse recebido há uns 20 anos o Xenomorfo congelado que Ellen Ripley jogou no espaço e tivesse realizado experimentos com ele. Agora nossas crianças estão em uma nave que não conhecem, sem experiência de combate, sem conhecimento do que caralhos está acontecendo ali e muitos, muitos, muitos mesmo, queridos Xenomorfos.

Sim, temos nossa equipe que, é claro, traz uma nova Ripley, um novo Dallas, um novo Kane, um novo sintético – dessa vez um feito para mineração, parrudo, forte e resistente – isso tudo é de praxe, mas todas as relações são construídas de modo diferente do que estamos acostumades. Acho que essa seja a primeira vez que temos até uma personagem grávida no meio da bagunça.

Somos mais inteligentes do que cientistas com PhD

Outra coisa que me agrada é que Fede Alvarez e equipe não subestimam a inteligência das personagens ou a nossa. As ideias e ações fazem sentido, as personagens usam os elementos apresentados, tem ideias coerentes e não temos explicações desnecessárias como, por exemplo, Andy ser um sintético. Isso nunca é dito com todas as letras, uma pessoa sem muita bagagem da franquia pode facilmente acreditar à primeira vista que ele é uma pessoa com gagueira, ou algum problema motor, mas ele sangra aquele líquido branco, é chamado de lixo e pessoa falsa. Assim como a colônia tem pessoas de todos os tipos de todos os lugares da Terra, isso nos é mostrado com figurantes passando pela tela falando idiomas que não entendemos ou sabermos que o grupo está na mesma nave do prólogo porque quando o sistema MU/TH/UR 9000 inicia, vemos isso em uma tela exatamente como antes.

Uma personagem que não sabe atirar, não aprende magicamente. Ela encontra uma arma com mira automática que ajuda com o coice e mira sozinha, só precisa apertar o gatilho, que já apareceu na franquia e apenas voltou. Simples e genial.

Assim como temas sempre presentes neste universo

Homenagens e referências que se encaixam

É mais do que evidente ao assistir ao filme, que sua maior conexão e inspiração é o filme de 1979, mas não apenas por finalmente termos voltado às raízes do terror – sem esquecer o toque de ação – por falas ditas, referências visuais e até mesmo à trilogia fracassada mais recente contribui de alguma forma para a obra, não descartando o que Ridley fez por último, mas finalmente conectando de um modo interessante. 

Um equilíbrio perfeito entre agradar fãs velhes de guerra e fãs que estão chegando agora. Nos dando inclusive um novo motivo para a WY querer essa criatura, além de usá-la como arma biológica, que era o único até então. Um motivo ótimo que não vou spoilar, mas que é coerente com tudo que Ridley tentou construir com Prometheus e Covenant.

Usar animatrônicos e efeitos especiais/práticos junto com os efeitos digitais fortalece muito a atmosfera, além de remeter aos filmes anteriores. Tem aquele cheirinho de Alien raiz, contando com designs novíssimos de H.R. Giger adicionando mais ao ciclo de vida do nosso monstro favorito. Combinado isso com os momentos super criativos, como uma cena de gravidade zero com sangue ácido de Xenomorfo por toda parte e as mortes mais viscerais e inventivas – ótimas para atrair o público jovem – que já tivemos nos filmes até então, sem reinventar a roda, apenas aproveitando o que já existe e já foi feito.

Fede Alvarez? Nunca critiquei! 

Se eu odeio alguns filmes e escolhas criativas de Fede Alvarez anteriores a Alien: Romulus? Pode apostar, mas o tempo inocentou nosso querido vizinho uruguaio finalmente.

Alvarez (aqui evitando usar a palavra Fede pois não tenho maturidade) mostra uma direção inteligente e eficiente, que bebe muito de seus antecessores, criando tensão com maestria, com planos que já vimos parecidos, mas trazem uma camada a mais de desconforto e medo, trabalhando o silêncio tal como Ridley Scott, auxiliado pelo incrível trabalho de som de Benjamin Wallfisch. Ah, claro! Sem piadinhas indigestas que destoam de tudo ou tentativas de criar humor onde não deveria existir. Estou olhando para você, senhora Marvel.

As atuações não são magistrais, mas dão conta do que se pede e te seguram ali por duas horas sem perceber que o tempo passou, com destaque para David Jonsson que consegue manter a expressão de choro de Andy por todo o filme.

Podemos sorrir, fãs de Alien

Para finalizar este texto, gostaria de reafirmar que sim, o impossível aconteceu. Fãs da franquia Alien podem ser felizes novamente, podem comprar seus ingressos e se divertir com a história exibida na telona. Nós deveríamos ter visto os sinais, afinal tivemos O Predador: A Caçada (Prey, 2022) e nosso alienígena irmão de outra mãe não decepcionou, foi um bom presságio.

Que possamos então ter mais mãos jovens, criativas e vivazes trazendo novidades bem feitas para nossas franquias favoritas poderem se renovar e prolongarem sua vida indefinidamente.


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