Alien: Isolation – Um jogo de terror à altura dos filmes

 

Alien: Isolation foi lançado em 2014, classificado como um jogo de stealth, survival horror e ação-aventura. Seguindo seu lançamento, apesar da recepção geral ter sido relativamente positiva, o jogo recebeu algumas críticas agressivamente negativas que inevitavelmente abalaram sua popularidade. Eu mesma não teria decidido jogar o jogo por conta própria, apesar de ser meu gênero favorito de game. Minha percepção de Isolation era de que o jogo seria demorado, repetitivo e desnecessariamente difícil, uma percepção formada a partir de alguns comentários e vídeos que assisti seis anos atrás, mas fico feliz de ter enfim dado uma chance ao jogo.

Vamos começar com o óbvio: Alien: Isolation é um jogo verdadeiramente apavorante. Pessoalmente, é difícil dizer se o medo aqui é consequência da experiência de jogo ou simplesmente do medo que carrego comigo desde a infância da figura do Alien.

Mas vamos por partes.

O jogo acontece pelo ponto de vista de Amanda Ripley, filha da Ripley original, que é mencionada de passagem em Aliens, o Resgate (Aliens, 1986). Amanda – como todo mundo no universo de Alien, aparentemente – trabalha para a Weyland-Yutani como engenheira mecânica, e sua jornada começa quando uma nave comercial supostamente localiza a caixa-preta da Nostromo – a nave do primeiro filme -, podendo conter informações sobre o paradeiro de sua mãe. Quem assistiu Aliens talvez se lembre que Ripley esteve à deriva no espaço por 57 anos, em stasis, e que quando ela acordou, sua filha já tinha morrido. Isso situa Alien: Isolation cronologicamente em um ponto anterior ao segundo filme da franquia – 15 anos depois de Alien, o Oitavo Passageiro (Alien, 1979), pra ser mais exata -, aproximando Amanda de Ripley em idade, personalidade e comportamento, o que cria uma sensação de familiaridade e empatia para os fãs da franquia.

Entretanto, Amanda Ripley tem seu próprio jeito de encarar a realidade: a personagem é retratada como uma pessoa inteligente, forte, resiliente e engenhosa, e onde a icônica personagem de Sigourney Weaver apresenta um certo nível de distanciamento emocional que permite a ela avaliar situações de forma prática, Amanda demonstra uma irritação agressiva direcionada a tudo e todos, fazendo com que ela atravesse uma crise depois da outra movida basicamente pelo ódio. Mesmo o medo da personagem tem um sabor de revolta, e suas interações com outros personagens são constantemente marcadas por seu temperamento cortante, tornando Amanda uma personagem extremamente interessante.

Seguindo uma breve cutscene de abertura que situa a narrativa no tempo e espaço, Isolation transporta o jogador diretamente para o centro do universo de Alien. A ambientação mantém viva de forma consistente a essência da ficção científica dos anos 80, reproduzindo e expandindo de forma magnífica o conteúdo apresentado nos filmes, com suas formas poligonais e volumosas e visual levemente deteriorado. Logo de cara é possível passear brevemente por uma nave que imita perfeitamente vários dos ambientes da Nostromo, mas ao longo do jogo também é possível observar uma série de pequenos elementos visuais familiares – pelo menos para os fãs – que geram ao mesmo tempo uma sensação de imersão e de nostalgia.

Durante as primeiras horas de jogo, Isolation é basicamente uma ode à Lei de Murphy: tudo que pode dar errado dá terrivelmente errado, e o jogador precisa encarar um obstáculo atrás do outro sem pausas pra recuperar o fôlego, mas até esse ponto da história, os únicos inimigos enfrentados são humanos e sintéticos. Os primeiros sinais da maior ameaça do jogo demoram pelo menos uma hora para surgirem, mas apesar de vermos seus rastros por toda parte, a estrela da festa demora quase duas horas para fazer sua primeira aparição oficial, e desse ponto em diante, o jogo se transforma em algo completamente novo.

No começo desse texto eu disse que Alien: Isolation foi classificado como stealth, survival horror e ação-aventura. É minha opinião pessoal que apenas uma dessas classificações se aplica. Em um primeiro momento – relativamente curto, considerando um total de 30-35 horas que se leva em média pra finalizar -, Isolation pode até ser confundido com um jogo de stealth, especialmente considerando os inimigos sintéticos com os quais o confronto é indesejado por serem extremamente difíceis de derrotar. Criar distrações e se mover silenciosamente pelas sombras, derrotando inimigos desprevenidos e escapando antes de ser detectado é o melhor jeito de encarar as ameaças comuns do jogo. Porém, a partir do momento em que o Alien faz sua primeira aparição e se torna um elemento constante na jornada, inimigos comuns se tornam o menor dos seus problemas.

A criatura de HR Giger habita os dutos de ventilação e cantos escuros do imaginário coletivo de ficção científica há 40 anos, e se sua aparência bizarra e perturbadora não for suficiente para causar pelo menos um pouco de pavor, o fato de se tratar de uma criatura virtualmente invencível definitivamente causa. Se existe algo a ser aprendido a partir de todos os confrontos entre Ripley e os Xenomorfos é que o único resultado possível é a morte. E é exatamente isso que se deve ter em mente ao iniciar o jogo.

Isolation eleva a perspectiva de jogos de survival horror a um novo patamar, colocando o jogador frente a frente com um inimigo incansável, implacável e imparável. Amanda tem uma chance relativamente alta de sobreviver aos inimigos comuns, mas encontros diretos com o alien quase sempre resultam em morte instantânea, e ruídos mais altos, movimentos bruscos, uma lanterna acesa, som de passos e até mesmo respiração podem atraí-lo não só para o andar/sala em que o jogador se encontra, mas para sua localização exata, seja escondido embaixo de uma mesa ou dentro de um armário ou mesmo na ventilação.

Tensão e imersão aumentam ainda mais com a ajuda de uma mixagem de som magnífica e extremamente frustrante. A Sevastopol – estação espacial onde o jogo acontece – funciona como uma velha casa assombrada, cheia de passagens secretas, atalhos e caminhos alternativos, mas principalmente cheia de ruídos. Portas e passagens de ventilação abrindo e fechando, aparelhos com funções misteriosas apitando, canos soltando fumaça, alarmes ao longe, chão rangendo: depois de algumas horas de gameplay, o jogador vai inevitavelmente se familiarizar com todos esses sons e se acostumar a parar e ouvir atentamente por algum indicativo da presença ou aproximação do alien, ou mesmo pelo bipe suave dos save points.

Entretanto, mesmo tomando todas as precauções possíveis, encontrar a morte pelas garras do alien pelo menos uma dúzia de vezes ao longo do jogo ainda é uma certeza: a inteligência artificial mantém suas aparições quase completamente aleatórias, aprendendo a partir do comportamento do jogador de modo a atualizar o comportamento da criatura baseado em fatores como o nível geral de ruído feito ao longo do jogo, o nível de proximidade entre personagem e criatura toda vez que a mesma entra em cena, os locais onde o jogador se esconde, etc. Eventualmente, molotovs e um lança-chamas são adicionados ao inventário, os únicos itens que podem ser usados com certo nível de eficiência contra o alien, mas nenhum dos dois é letal, e a criatura eventualmente se adapta e reage quando atacada diretamente, e pior, se torna ainda mais insistente em sua caçada.

A realidade é que o jeito mais eficiente de sobreviver é evitar o inimigo de todas as formas possíveis. Na prática, isso quer dizer andar abaixado e se mover de um esconderijo para o próximo o mais silenciosamente possível, observar dutos de ventilação, e ocasionalmente fazer uma pausa em algum esconderijo para avaliar a situação e planejar o próximo passo. Também ajuda observar e memorizar o layout das salas, uma tarefa que se torna fácil quando você precisa passar pelo mesmo lugar várias vezes em momentos diferentes do jogo.

Seguindo um formato que lembra muito Resident Evil 2 (1998), Isolation leva o jogador a dar várias e várias voltas nas mesmas áreas, evitando por muito pouco um inimigo persistente em perseguição constante, dependendo de saves manuais para proteger o lento e sofrido progresso, com a diferença de que no caso de Isolation, não existem salas seguras.

O problema é: dedicado a criar uma experiência absolutamente imersiva e verdadeiramente assustadora, Isolation perde um pouco a mão na medida de quantas vezes o jogador é capaz de repetir o mesmo procedimento sem se cansar e eventualmente perder a paciência. Os objetivos do jogo são atualizados com relativa frequência, mas quando você termina uma tarefa pra fazer outra exatamente igual, depois mais outra, e depois voltar pro começo e fazer mais uma tarefa extremamente parecida com as três anteriores, essas atualizações não criam um sentimento de progresso, mas sim de déjà-vu, e o jogador começa a se perguntar se esse pesadelo vai eventualmente acabar. Francamente, 30 horas de jogo é um tempo longo demais pra ficar constantemente ansioso e desesperado.

O gameplay também é desacelerado pelo fato de que o jogo em si não fornece informação suficiente para agilizar o progresso. A busca de uma imersão absoluta sacrifica ferramentas que são essenciais para tornar a jogabilidade confortável, como mapas ou qualquer outro mecanismo de orientação/direcionamento, uma indicação clara do que precisa ser feito e onde, ou simplesmente uma indicação clara do resultado de cada ação. Isolation abre espaço para que o jogador explore e descubra sozinho, e por mais que isso seja interessante para um determinado nicho que valoriza imersão acima de tudo, seria ideal que o jogo oferecesse opções de gameplay diferentes para faixas diferentes do público que querem aproveitar a experiência sem se sentirem frustradas ou desorientadas.

E pior: entre a primeira vez em que o jogador é levado a acreditar que o jogo está perto do fim e o momento em que ele de fato acaba existe um espaço de pelo menos seis horas de tarefas intermináveis. Em termos de roteiro, o desenrolar das horas finais de jogo são de tirar o fôlego, progredindo em termos de intensidade e absurdo até o ponto em que se pensa “essa situação não pode piorar” várias vezes, só pra assistir a situação piorando logo em seguida, mas por mais interessante que o roteiro seja, as repetições excessivas e fases intermináveis acabam quebrando um pouco do envolvimento do jogador.

Alien: Isolation veio para provar que o equilíbrio entre imersão e diversão em jogos de survival horror é bem frágil. Pender demais para um ou outro lado pode quebrar completamente a conexão com o gênero ou tornar o jogo cansativo e desnecessariamente complicado para o público geral. O jogo se propõe a criar uma experiência imersiva e aterrorizante, e é exatamente isso que faz. Se esse é o tipo de experiência que você procura, não vai ficar decepcionado. Para jogadores que, como eu, não ligam tanto para imersão, aqui vai uma dica: jogue no fácil, use fones de ouvido e faça pausas regulares para diminuir um pouco a tensão. O jogo é verdadeiramente empolgante, e honestamente vale o esforço.