A Home Box Office é famosa pela qualidade de suas séries. O fato do canal ter revolucionado a produção audiovisual para a TV com The Sopranos (1999 – 2007), Band of Brothers (2001) e Game of Thrones (2011 – ), transformou-o numa marca forte e com credibilidade no mercado. A emissora tornou-se conhecida pela liberdade oferecida na criação de suas séries, conquistando uma aura única entre o canais da televisão norte americana. Isso projeta no espectador a confiança de que qualquer programa feito com esse selo poderá ter todas as características estéticas e financeiras necessárias, além de conseguir tratar de temas polêmicos de um jeito que nenhum outro canal, aparentemente, teria coragem de abordar, afinal, It’s not TV, It’s HBO.
Com tantos sucessos no seu catálogo, novas produções sempre despertam certo interesse nos fãs do canal. É então que no segundo semestre de 2017, estreia a série The Deuce. O programa é co-criado por David Simon (The Wire e Treme) e conta a história do surgimento e legalização da industria pornográfica na Nova York do início dos anos 70, repleta de prédios abandonados, drogas, criminalidade e prostituição.
Pela HBO ser constantemente vista como um lugar onde sexo, nudez e violência podem ser retratados livremente, a produção de uma série dessas pelo canal chega a ser bem compreensível e, até mesmo, esperada. Entretanto, a nudez é essencial para a movimentação da história, sendo tratada com bastante naturalidade, semelhante ao que acontece em Westworld (2016 – ).
Na trama, acompanhamos os gêmeos Frankie e Vincent Martino (James Franco), um barman e um trambiqueiro que se envolvem com a máfia e, posteriormente, na indústria do sexo. Também vemos a história de Eileen Merrell (Maggie Gyllenhaal), a única prostituta sem cafetão da Times Square que se envolve na produção de filmes pornos devido a sua aptidão empreendedora.
A ambientação, fotografia, trilha sonora e figurino somados a inclusão de acontecimentos reais a trama, como a estreia do filme Garganta Profunda (Deep Throat, 1972), trazem ao seriado um senso de realidade e situa o espectador naquela época.
Nos seus 8 episódios, a série cria e desenvolve diversos núcleos, sempre dando uma visão de baixo para os acontecimentos. Somos inseridos de maneira orgânica em núcleos de prostitutas, cafetões, policiais, repórteres, universitários e mafiosos sem vilanizar nenhum deles. Os personagens são cinzas, diversos e complexos, muitos deles com subplots interessantes que acabam se cruzando com o decorrer dos episódios, mostrando o panorama geral tão bem elaborado do seriado.
A prostituição deveria ser uma profissão como qualquer outra, porem por estar a margem da sociedade as profissionais desse ramo sempre enfrentam certo julgamento e preconceito, sendo inferiorizadas pelo restante da população. A série mostra o dia a dia desta profissão, com pontos de vistas de diversas prostitutas nas noites de Nova York, suas relações com seus cafetões, como meninas jovens se envolvem nesse meio e como algumas desenvolvem uma síndrome de Estocolmo com o passar do tempo, algemando-se nesta vida para sempre, sem perspectiva de mudança.
O ponto alto da série é a abordagem das estruturas sociais corruptas retroalimentadas e do capitalismo sexual. Todos querem participar desta revolução do prazer que está acontecendo na cidade. Seja na forma de suborno para um prostíbulo continuar aberto, sexualização de garçonetes para aumentar o movimento do seu estabelecimento, comercialização do próprio corpo nas ruas, produção de filmes eróticos…o espectador é bombardeado a todo momento com cenas de sexo gay e hétero, chegando ao ponto em que estamos tão anestesiados com o ato que tratamos ele como uma cena qualquer e cotidiana, igual os personagens.
A série já foi renovada para uma segunda temporada e de acordo com James Franco, que inclusive é produtor e diretor de alguns episódios, o programa deverá ter 3 temporadas concisas, provavelmente chegando ao seu encerramento no final dos anos 80, com a industria pornografica já estabelecida.
Na sua primeira temporada, The Deuce demonstra ter um roteiro bem amarrado, boas atuações, personagens reais e consegue discutir sexo, poder, abuso e feminismo através de profissões marginalizadas. Isso tudo sem negar a violência e a sujeira que era sobreviver na Nova York dos anos 70.
Autodidata de Youtube e ex valentão da escola. Hilário adora mitologias em geral, astronomia e desenhos animados, mas seu passatempo favorito é irritar as pessoas, geralmente ele consegue. Sonserina orgulhoso, ariano, otaku reprimido e chaotic evil.