Não sei se alguém aqui já passou por isso, mas, há alguns meses, sinto uma dificuldade muito grande, uma limitação mesmo, de assistir filmes novos (por novos, quero dizer inéditos para mim). Desde a escolher o filme até a me interessar, parar o que eu estou fazendo e me concentrar para assisti-lo todo. São muitas as possíveis razões para isso, como o pouco tempo, os dias atarefados, a ansiedade mais aflorada, o cansaço de fim de ano e porque não um pouco de preguiça. À contramão, a vontade de rever filmes está cada vez mais presente.
Me sentia frustrada por isso, afinal cinema sempre foi um apoio, uma válvula de escape, um objeto de extremo interesse para mim. Até que, depois de um tempo, passei a parar de me cobrar por algo desse tipo e perceber que tudo bem, não tem problema rever os filmes que marcaram minha vida até aqui. Aliás, não só não tem problema, como tem um valor inestimável.
E essa lista de 10 cenas mais marcantes no cinema veio para selar o quanto faz bem revisitar momentos tão especiais e o quanto o cinema pode impactar na nossa trajetória de vida.
Ressalto que foi uma lista muito intuitiva, ou seja, escolhi àqueles que vieram imediatamente à memória, que foram verdadeiramente inesquecíveis.
Eu não sou uma grande apreciadora de comédias românticas, mas, ao mesmo tempo, alguns filmes específicos do gênero me marcaram mais do que qualquer drama (meu gênero preferido) ou super produção. A primeira lembrança pra essa lista veio de De Repente é Amor (A Lot Like Love, 2005) e, inclusive, esse texto está sendo escrito com a trilha sonora ao fundo. O filme narra uma sequência de idas e vindas de um casal interpretado por Ashton Kutcher e Amanda Peet e uma das cenas que mais me marcam, de todos os filmes da minha vida, é a de Oliver aparecendo na casa de Emily, anos depois do último encontro, tocando e cantando – muito precariamente, diga-se – I’ll be there for you, do Bon Jovi (e a escolha da música tem todo um contexto no filme).
A atitude de tentar algo, já que o personagem não tem mais nada a perder, independente de ter sido um fiasco, às cegas, sem saber se Emily já partiu pra outra, é contagiante. Sempre me emociono e sorrio ao mesmo tempo com essa cena.
Vocês podem se indignar com uma fã de Godfather escolher, dentre uma sequência grande de genialidade nos filmes I e II, uma cena do terceiro filme que, para muitos, foi desnecessário. Bom, não vou entrar muito nesse mérito, de fato é um filme controverso. Mas ele existe e sela a derrocada da família mais famosa da máfia italiana retratada nos cinemas, com uma espécie de castigo de Deus, ou carma, ou lei do retorno, com o assassinato de Mary Corleone (Sofia Coppola), retratando, ainda, o desespero de Michael (Al Pacino) ao ver sua filha morrer no seu lugar.
Um filme duro e doloroso. Mas genial. A Lista de Schindler (Schindler’s List, 1993) mostra uma das fases mais trágicas do nazismo com um noir realístico que te dá a impressão de estar assistindo a um documentário, a cenas capturadas nos campos de concentração e na Alemanha Nazista. E, dentre tantos momentos marcantes, o expectador é surpreendido por uma criança de vestido vermelho (em meio a todo o preto-e-branco), tentando se proteger do massacre feito por soldados da SS em um gueto judeu. Esse momento marca a mudança de perspectiva de Schindler (Liam Neeson), inicialmente um empresário alemão que lucra com a mão de obra barata dos judeus, para o ser humano que começa a compreender o tamanho da tragédia que está por vir.
Taxi Driver (1976) foi o filme que proporcionou a paixão que sinto pela dobradinha Scorsese-De Niro. E a cena escolhida (apesar de a cena final ser também muito marcante) foi a que mostra a transição de Travis (Robert De Niro), do cara meramente estranho, insone, com pouca desenvoltura em socializar com mulheres, para o cara visivelmente perturbado. As razões para a mudança não são tão claras, mas a atitude de violência cresce de forma vertiginosa e o personagem passa a se preparar para um momento crucial. A cena possui uma trilha sonora que remete a um terror e que traz em si a ansiedade de Travis, introduzindo a carnificina do desenrolar da trama.
Não consigo pensar muito como descrever a sensação causada pelo final de Cães de Aluguel (Reservoir Dogs, 1992), senão com “What the f*ck?!”. O fato é que, enquanto primeiro filme de maior visibilidade de Quentin Tarantino, ele veio pra mostrar que o diretor não iria poupar sangue e, principalmente, violência imotivada (além dos diálogos marcantes, que geralmente ocorrem no meio do caos).
E pra não quebrar a sequência de um dos meus diretores preferidos, essa foi uma cena que me veio de imediato à mente quando soube da ideia dessa lista. É arrepiante, principalmente quando vista em um cinema, e brinca com a sua própria noção de moral e humanidade, ao causar aquela sensação que você não costuma expor em público de irrestrito apoio ao que Shoshana (Mélanie Laurent) faz (calma, não sou psicopata). Fora a beleza da direção da cena, com uma coreografia característica do diretor, acostumado a promover uma matança em meio ao caos. Não importa quantas vezes eu assista, sempre vou me arrepiar.
Já mostrei com essa lista um gosto um tanto quanto violento. De fato, amo filmes de máfia e histórias reais de guerra. Mas, sem dúvidas, o meu gênero preferido sempre será o drama. Magnólia (Magnolia, 1999) é um dos filmes da minha vida. Contudo, de forma contraditória, não o assisti mais de uma vez e até o evito, pois é de um peso grande que agrava a melancolia dos dias. Mas, não pude deixar de fora dessa lista a sequência que se passa sob o som de Wise Up, de Aimee Mann, e mostra os personagens da trama nos seus “fundos do poço” pessoais. É triste e tocante, mas inesquecível.
E depois do temporal de Magnolia, voltamos às comédias românticas, com uma cena de Tudo Acontece em Elizabethtown (Elizabethtown, 2005) que tem uma mensagem que muito me representa e acompanha na vida: “Você tem 5 minutos para mergulhar na tristeza profunda. Aproveite-a, desfrute-a, descarte-a e siga em frente!”. Esse é um filme que, em toda a sua simplicidade e pieguice característica do gênero, me ajuda em momentos ruins a respirar fundo e perceber que as fases muito ruins não tendem a permanecer. Fora isso, tem o que eu considero a melhor trilha sonora de todas as comédias românticas que já vi.
Digo sem pestanejar que os filmes Antes do Amanhecer (Before Sunrise, 1995), Antes do Pôr-do-Sol (Before Sunset, 2004) e Antes da Meia Noite (Before Midnight, 2013) (este, em menor proporção), formaram parte do meu caráter. Difícil eu não ser passional ao falar desses filmes, com diálogos tão cotidianos e reais, sobretudo na sua segunda parte, que traz uma Celine (Julie Delpy) com a qual tanto me identifico. A beleza dessa cena final é de uma singeleza contagiante, na qual a personagem encontra com o seu amor de juventude no seu apartamento bagunçado, que muito representa a vida nos seus 30 e poucos anos, ao som de Just in Time, com direito a uma dancinha charmosa e uma imitação cômica de Nina Simone.
Por fim, com uma quebra grande de gênero, escolhi a cena final de O Exterminador do Futuro (The Terminator, 1984) por ser este um filme com uma bagagem emocional importante. Me remete à infância e pré-adolescência, em que eu já mostrava o meu amor por cinema, mas, enquanto filha única, sempre tive como companheira a minha mãe para assistir os filmes na TV e os alugados nas locadoras. Nunca foi muito fácil, porque ela sempre dormia… mas eu insistia. E esse era um dos poucos filmes que ela conseguia terminar e reassistir todas as vezes que passava. Amo a história de Sarah Connor (Linda Hamilton) e tenho uma memória afetiva grande com esse final.
Formada em direito pela UFC e em medicina pelo Grey’s Anatomy, Larissa é canceriana e dona de um gato maluvido chamado Jimmy. Adora Beatles, Amy Winehouse, viajar e acha o Artpop uma obra de arte. Nunca recusa um bom café e uma boa conversa sobre cinema, contanto que não tenha spoiler.