Stargirl: 1ª Temporada – Uma estrela que brilha forte numa ótima temporada

Não é de hoje que a DC Universe tem sido elogiada pela qualidade e diferencial narrativo de suas séries. Este braço da DC Entertainment começou sua jornada em 2018 em stream com a boa primeira temporada de Titãs (Titans, 2018 -), depois se mostrou acima da média com a primeira temporada impecável e envolvente Monstro do Pântano (Swamp Thing, 2019) e a primeira temporada da excêntrica e genial Patrulha do Destino (Doom Patrol, 2019 -), sem falar no elogiado desenho da Harley Quinn (2019 -). Ainda que neste ano a empresa esteja com seus dias contados, mesmo se mostrando superior a muitos produtos da DC em outros canais (cof cof CW), o selo teve tempo de lançar mais uma obra excelente com a primeira temporada da heroína Stargirl (2020 -).

A personagem Courtney Whitmore foi criada no final dos anos 90 por Geoff Johns e Lee Moder, uma clara homenagem a irmã mais nova de Geoff que faleceu durante um trágico acidente aéreo, onde um avião explodiu logo após decolar em 1996. A premissa da série segue basicamente a origem dos quadrinhos, com algumas poucas mudanças. Aqui Courtney (Brec Bassinger) se muda de Los Angeles com a mãe Barbara Whitmore (Amy Smart), o padrasto Pat Dugan (Luke Wilson) e seu filho Mike Dugan (Trae Romano) para a interiorana e misteriosa Blue Valley no estado do Nebraska.

O piloto de Stargirl é um ótimo cartão de visita, caso o expectador saturado de séries de super-heróis está desconfiando da qualidade da produção. O roteiro assinado pelo próprio Geoff Johns consegue estabelecer rápido os personagens, a atmosfera da cidade, os vilões e principalmente focando naquilo que interessa, a protagonista Courtney Whitmore se descobrindo heroína ao achar o cajado mágico cheio de personalidade própria do super herói Starman no porão da sua casa. 

A série trabalha muito com legado, se no começo do episódio vemos a Sociedade da Justiça da América (SJA) enfrentando os vilões da Sociedade da Injustiça da América (SIA) no passado, o presente foca em passar o bastão para uma próxima geração que aos poucos vai sendo moldada. Ao focar no surgimento de “Stargirl”, a narrativa é feliz em desenvolver os conflitos familiares de Courtney que foi criada pela mãe, sem a presença de uma figura do pai biológico e ainda que inicialmente tendo uma relação conturbada, começa a enxergar na figura do padrasto a única representação paterna.

Quando a história revela o passado de Pat como ajudante da SJA, cria-se aqui a possibilidade de Courtney descobrir mais sobre seu passado e sua possível ligação o com super-herói Starman, que pode ou não ser seu pai, e é neste momento que a narrativa ganha corpo. O importante aqui é que a trama consegue equilibrar bem o drama adolescente e seu lado ligado aos super-heróis, então, ao mesmo tempo que conhecemos a nova vida de Chloe e possíveis novos amigos na escola em Blue Valley, a trama consegue criar um clima propício para a personagem receber os poderes de forma empolgante a colocando para enfrentar seu primeiro vilão, o assustador Brainwave (Christopher James Baker).

Em termos técnicos, além do roteiro bem desenvolvido que merece ser elogiado, a direção precisa de Glenn Winter merece destaque ao conseguir balancear humor, ação e aventura tudo num episódio só. A fotografia dá um tom mais bem acabado a produção, que tem ares mais cinematográficos, por assim dizer, some-se isso a boas cenas de ação, ótimas reviravoltas e bons efeitos visuais, temos aí um ótimo episódio inicial.

Seriados como este costumam perder a mão nos episódios seguintes, porém “Stargirl” mantém uma linha bastante crescente e consistente. No episódio S.T.R.I.P.E (1×02) Courtney continua lidando com essas descobertas e o roteiro começa a trabalhar melhor sua relação com Pat, que se revela um possível parceiro da heroína. A trama nos dois primeiros episódios lida com o deslumbramento da personagem com seus novos poderes, enquanto no episódio Icycle (1×03) começa a tomar tons mais sérios ao introduzir o vilão principal da temporada e líder da Sociedade da Injustiça, Icycle, trazendo consequências inesperada para a protagonista que começa a perceber o peso de se tornar uma super heroína.

O seriado, como já citei antes, é muito sobre legado, Courtney aos poucos começa a entender que seu destino não é combater vilões sozinha, mas com auxílio de uma equipe. A trama de Stargirl começa a trazer novos rostos para se juntar a heroína em suas batalhas a partir dos episódios Hellcat (1×04) e Hourman and Dr. Mid Nite (1×05), introduzindo Yolanda Montez (Yvette Monreal), Beth Chapel (Anjelika Washington) e o esquentado Rick Tyler (Cameron Gellman). Em paralelo ao surgimento desses fortes aliados, a trama também aproveita para construir a narrativa dos vilões da “SIA” e seu plano de dominação global, ao mesmo tempo que os coloca em ponto de colisão com nossos heróis.

O mais interessante de Stargirl é a capacidade que a história tem de envolver os espectadores em suas tramas, seja através dos conflitos adolescentes, seja pelos dramas familiares, tudo isso utilizado de forma inteligente em constantes ganchos e reviravoltas que funcionam na maior parte do tempo, além das peripécias dos personagens em investigar o paradeiro dos vilões, isto mantém a história em evolução constante sem perder o ritmo dinâmico estabelecido no piloto. Tudo isso é muito bem dosado em arcos que ajudam a enriquecer a narrativa, trazendo um pouco de suspense e a sensação de perigo à espreita.

É claro que a série não escapa de alguns clichês do gênero e algumas obviedades características de tramas de super herói, mas é notável perceber o esforço do texto na tentativa de não parecer tão piegas, podemos notar isso nos episódios The Justice Society (1×06), The Shiv Part 1 (1×07) e The Shiv Part 2 (1×08), o primeiro que traz a equipe lidando com conflitos internos e enfrentando seu primeiro inimigo juntos, e os dois episódios seguintes que mostram a introdução de uma vilã esperta que quebra um pouco a visão do antagonista apático que se deixa enganar fácil pelo super-herói da vez. 

O melhor desta série é que ao invés de desacelerar sua trama na segunda metade, ela começa a ganhar mais fôlego em seu enredo de forma a moldar o arco principal para um inevitável confronto entre vilões e mocinhos. Nos episódios Brainwave (1×09) e Brainwave Jr. (1×10) temos um aprofundamento na mitologia dos vilões com o excelente arco envolvendo Henry King Jr. (Jake Austin Walker), além de proporcionar a oportunidade de enxergar a nova Sociedade da Justiça como equipe trabalhando em conjunto combatendo ameaças em sequências de ação de tirar fôlego.

Em Stargirl essa quebra de padrões é muito bem vinda numa narrativa que ainda mantém seu lado cartunesco (afinal temos um robô gigante em ação na série), ao mesmo tempo que é feliz em dar uma nova atualização ao gênero, dando peso as decisões do super-heróis e ainda criando uma justificativa bastante plausível ao plano nefasto dos vilões da “SIA”, nos fazendo questionar se os mesmos não tem certa razão em fazer o que estão fazendo, mesmo que a megalomania destes fique evidente como pode-se perceber no episódio Shinning Knight (1×11) que dá a série contornos decisivos característicos de retas finais de temporadas.

De uma forma geral, Stargirl é um grande presente, consegue trazer uma boa história, sem grandes exageros, equilibrando ação e aventura, se aproveitando do carisma de seus personagens que, na maior parte do tempo são bem desenvolvidos. A série tem outros atrativos como cenas de ação espetaculares (as coreografias são impressionantes e imprevisíveis), efeitos especiais acima da média e muita cena que remete bastante aos quadrinhos, além dos diversos easter eggs de personagens lendários da DC como Lanterna Verde e Doctor Fate. A trama na reta final traz um desfecho apoteótico no episódio duplo Stars and S.T.R.I.P.E – Part 1 (1×12) e Stars and S.T.R.I.P.E – Part 2 (1×13) conseguindo juntar tudo aquilo que deu certo nos episódios anteriores, com cada personagem tendo seu momento para brilhar, além de consolidar a figura de Courtney no papel de Stargirl. 

É notável que uma série conseguir ser tão consistente sem perder o ritmo (os treze episódios passam voando) durante seu primeiro ano inteiro, isto mostra a força das produções da DC Universe, que mais uma vez entrega um produto de qualidade que deixa um gostinho de quero mais. Levando em conta a boa recepção desta temporada e a renovação garantida, Stargirl garante aqui um começo promissor e respeitável, trazendo de volta aquele gosto de novidade de assistir uma série de super-herói novamente. Esta estrelinha brilhou forte e esperamos que a qualidade continue futuramente.


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