Trolls 3: Juntos Novamente – Que saudade das boybands

Se em 2016 alguém tivesse me dito que a franquia Trolls se tornaria um dos carros chefes da Dreamworks e que depois de me decepcionar muito com o primeiro filme eu não só iria gostar das sequências como também ia estar aqui escrevendo esse texto, eu com certeza não acreditaria, mas é 2023 e aqui estamos nós!

Mas antes de falarmos sobre o novo filme da franquia, vou fazer uma pequena recapitulação dos filmes anteriores.

Trolls (2016) estreou com uma ideia simples, uma nova franquia para o estúdio de animação, com uma pegada mais infantil baseado em uma linha de brinquedos dinamarquesa inspirada no folclore escandinavo de bonequinhos descabelados – que até chegaram a aparecer em alguns Toy Story -, muita cor, muita música e muita fofura. Inclusive, fica a curiosidade, já tinha sido tentado emplacar uma animação inspirada no brinquedo, uma animação bem esquecida, mas que tenho quase certeza que assisti chamada Trollz (2005 – 2006) que foi uma tentativa não muito disfarçada de copiar as Bratz.

O filme foi um sucesso, apesar de alguns tropeços, na minha opinião. Eu gosto especialmente das texturas que Trolls trás, eu me sinto realmente brincando em um mundo de feltro, mas o final do primeiro filme com uma mensagem um tanto controversa sobre como conquistar a felicidade me deixou com um gostinho amargo na boca e uma vontade nula de voltar a assistir qualquer coisa desse universo.

Porém, como eu obviamente não sou todo mundo, Trolls ainda rendeu dois especiais para televisão Trolls: Vamos Festejar (Trolls Holiday, 2017) e Trolls: Celebrando em Harmonia (Trolls Holiday: Days in Harmony, 2018) e duas séries animadas, Trolls: O Ritmo Continua! (Trolls: The Beat Goes On!, 2018 – 2019) e Trolls: TrollsTopia (2020 – 2022), que eu não assisti por ter entendido que a franquia não era para mim, mas tenho reconsiderado a ideia.

Veio então o novo longa, Trolls 2 (Trolls World Tour, 2020), que sofreu por conta da pandemia, teve pouco tempo de salas de cinema e logo foi para o digital. Eu só assisti a esse filme esse ano por conta de um vídeo no TikTok de uma moça preta falando que Trolls 2 tinha sido a melhor animação que falou sobre racismo que ela tinha assistido nos últimos anos. Pensei que a moça era louca, mas não. Trolls 2 praticamente ignora seu primogênito e é um filme forte ao mesmo tempo que é incrivelmente fofo, e fala sobre racismo, preconceito, xenofobia, diferenças culturais e aceitação, eu não esperava gostar tanto desse filme, mas eu o recomendo para todo mundo.

E agora chegamos aqui, com o terceiro longa Trolls 3: Juntos Novamente (Trolls Band Together, 2023), tornando Trolls a quinta franquia da Dreamworks a se tornar uma trilogia e o oitavo filme da empresa a ter uma protagonista feminina, dentre seus 45 títulos até agora.

Em Trolls 3, temos uma espécie de retcom. Novas informações que antes não tínhamos são introduzidas na história. Descobrimos que Tronco antes de ver sua avó ser devorada e ter perdido suas cores, foi parte de uma boyband com seus 4 irmãos, a BroZone, mas que acabou sendo desfeita por uma briga entre os participantes.

20 anos depois e alguns meses após os outros filmes, estamos no casamento de Bridget e rei Gristle, Poppy e Tronco são oficialmente um casal e tudo está bem, até que o irmão mais velho de Tronco reaparece pedindo sua ajuda para reunir a banda para salvar um dos seus irmãos de uma dupla de irmãos cantores malvados.

O filme é dirigido por Walt Dohrn e Tim Heitz, ambos já com alguns filmes da empresa no currículo e tendo trabalho no Trolls de 2016. O roteiro é de Elizabeth Tippet, que fez parte do roteiro do segundo filme, Jonathan Aibel e Glenn Berger que fizeram parte dos dois anteriores e outros do estúdio. A trilha sonora é de Theodore Shapiro, que tem um currículo cheio de obras famosas, incluindo o segundo filme da franquia e a de Yellowjackets (2021 -). E claro, o filme conta com uma música nova do ‘N Sync, “Better Place”, primeira do grupo em 22 anos que pode estar anunciando um possível retorno, muito bem colocada já que Justin Timberlake é um dos protagonistas dos filmes.

De termos técnicos, o filme é impecável, a animação é linda, colorida, explora muito bem as texturas e a música dá o toque final. Agora com movimentos de câmeras mais ousados e algumas experimentações como uma sequência psicodélica inspirada em Yellow Submarine (1968) que dão um contraste divertido com o 3D da obra.

Um destaque também para os novos lugares apresentados com novos habitantes desse mundo, uma ilha cheia de fantoches, uma cidade grande cromada repleta de bonecos que fazem referência a boneca Betty Spaghetty e uma personagem única que parece ser uma referência aos Gonks, um outro brinquedo parecido com os trolls. Cada uma das novas espécies com novas texturas e novas técnicas de animação aplicadas para seus movimentos, tornando esse mundo cada vez mais diverso.

O elenco de voz original mantém seus nomes dos filmes anteriores e dá as boas vindas para novos, então Justin Timberlake e Anna Kendrick estão de volta, agora com Camilla Cabello e Troye Sivan estreando em animações e ainda Eric André, Kid Cudi, Daveed Diggs e Amy Schumer, entre outros.

A dublagem do filme está incrível e também mantém as mesmas vozes dos anteriores, com Jullie e Hugo Bonemer, com Larissa Manoela se juntando como star talento ao time de dubladores que conta com Duda Ribeiro, João Cappelli, Yuri Tupper, Marcelo Garcia, Karen Padrão e direção de dublagem de Andrea Murucci.

As músicas divertem, algumas foram traduzidas, outras não, algumas ficam no meio do caminho com alguns trechos em português e outros em inglês. Nossos artistas locais tem oportunidade de cantar em diversos momentos enquanto outros mantém o áudio original, o que considero um diferencial, já que dificilmente em musicais onde as músicas não são adaptadas nossas vozes locais tem oportunidade de cantar.

Primeiro acho que vale salientar que o compromisso com os anos 2000 foi tanto que atualmente está no ar um site da BroZone, – https://www.brozoneband.com/ – que é o puro suco da nostalgia.

Partindo do princípio, depois do flashback com Tronco e seus irmãos, temos o casamento de Bridget e Gristle, como já mencionei, mas esse momento de preparação para o casamento há alguns elementos bem especiais. Enquanto uma música é cantada, muitas bandeiras de arco-íris são colocadas para enfeitar, e quem casa nossos noivos é uma figura sem gênero definido que no áudio original tem a voz de ninguém mais ninguém menos do que RuPaul. O filme não chega a dizer nada claramente, mas considero um posicionamento bem significativo para um filme infantil que pode gerar choro de alguns conservadores.

Entrando em mais detalhes, Floyd, um dos irmãos de Tronco está sendo mantido prisioneiro por Veludo e Cotelê, uma dupla de irmãos cantores que está extraindo o talento do pequeno troll para se tornarem cantores de sucesso. Então John Dory, o irmão mais velho, vai até Tronco para que eles encontrem Spruce e Clay, seus outros irmãos, para então irem até Floyd e poderem cantar uma perfeita harmonia em família, o único modo de quebrar a prisão de diamante em que Floyd está preso.

Não vou mentir para vocês, esse filme fala muito sobre irmãos, todo mundo tem irmãos, levando a piada quase até o limite, mas o fato do próprio filme fazer piadas sobre isso faz perceber que esse elemento não foi levado a sério desde o princípio e o exagero é proposital.

Essas relações são então exploradas com três núcleos, os BroZone que se separaram por quererem coisas diferentes e o irmão mais velho exigir muito deles, Veludo e Cotelê, nossos vilões que tem uma relação tóxica e Poppy e Viva – sim, o rei Pepe continua escondendo coisas – que precisam desenvolver confiança apesar da afinidade. A mensagem final acaba sendo sobre respeito para não prejudicar suas relações familiares e sobre perceber que a família pode sim ser danosa para você, mesmo que não intencionalmente.

Apesar disso, é um grande roadmovie, filme de estrada divertido e engraçado, com momentos psicodélicos, coreografias nostálgicas e uma boa homenagem para as saudosas boybands, com direito até à algumas piadinhas mais adultas para os pais.

A temática da reunião da banda acaba inclusive sendo muito atual para nós brasileiros com tantas bandas retornando como Restart e RBD e até mesmo o filme nacional Chocante (2017) já parecia prever essa comoção.

No fim é um filme divertido e gostoso, perfeito para assistir e um domingo com seus irmãos e irmãs e vai agradar muito as crianças. Não vai trazer grandes reflexões, fazer você chorar ou mudar vidas, mas vai ser uma experiência legal que talvez te faça reassistir alguns vídeos de músicas dos anos 90 e 2000.

Trolls 3 é feito com propósitos mais comerciais, talvez tenha de certo modo sido um filme encomendado para promover essa volta do ‘N Sync, colocar a franquia de volta no mapa e conseguir o dinheiro que o segundo filme não pôde conseguir, sem deixar de ser divertido e introduzir novas coisas para esse universo. Não é forte como o segundo, mas serve pra trazer luz para ele, presta homenagem as boybands e fala sobre respeito entre familiares de modo raso, mas que não vai para lugares errados, como o primeiro.

Trolls provavelmente é uma franquia que ainda vai durar bastante, e não parece cansada ainda, como outras que vieram antes como Hotel Transilvânia ou Meu Malvado Favorito que praticamente se tornaram paródias de si mesmas, discutindo sempre o mesmo assunto, esquecendo de evoluir verdadeiramente seus personagens.

Além do mais, só com suas músicas a franquia pode se sustentar por um bom tempo, mas enquanto estiver criativa e divertida ainda vai valer a pena, especialmente se aproveitarem bem a oportunidade para discutir temas como foi feito no segundo filme.


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