Eis que todos os caminhos traçados nos trouxeram até aqui. Eu nunca sei muito bem o que dizer sobre o final de The Last of Us. Foi assim com o jogo e foi assim com a série também. Às vezes as coisas pesam tanto que só o silêncio é forte o suficiente para arrematar e pra mim esse final é um desses momentos, a minha reação é sempre trocar um olhar com as pessoas que estão vendo comigo e concordar com a cabeça, embora nada tenha sido dito, ou talvez até um palavrão bem baixinho. Poderia ser a justificativa pra não ter escrito essa análise assim que acabou o episódio ao invés de estar aqui na porta de um feriadão cristão me voltando para a série, mas não é, é realmente o que eu sinto em relação ao fim da viagem de Joel e Ellie, ou melhor dizendo, o encerramento desse capítulo específico: um vazio difícil de explicar.
É evidente que existe um esforço na condução desse episódio em colocar Joel (Pedro Pascal) e Marlene (Merle Dandridge) como faces opostas da mesma moeda. Quando na cena de abertura Marlene é colocada no momento de nascimento de Ellie – cuja mãe é interpretada por Ashley Johnson, a dubladora da própria Ellie nos jogos e curiosamente muito parecida com a Bella Ramsey – a relação que ela tem com aquela criança pode ser comparada com a de Joel. Não necessariamente tem a mesma força e o mesmo peso, mas são relativamente equivalentes. E ambos, Joel e Marlene, serão egoístas à sua própria maneira e para a sua própria causa, anulando um possível posicionamento claro entre certo e errado. Como tudo o que foi apresentado até aqui, esse último dilema também é dúbio. Mas, o que me faz voltar sempre para essa história, quase como no mito de Sísifo, que é também uma tragédia perfeita, não é exatamente a pergunta “o que você faria no lugar do Joel?”, que muitas vezes norteia as discussões a respeito da franquia. Não, eu sempre acabo querendo mais desses personagens tão quebrados e tão condenados a continuarem quebrados porque, para mim, esse final anticlimático causa uma mistura de desapontamento e alívio muito difícil de equilibrar emocionalmente, que me força a ficar tentando de novo, de novo e de novo.
Ok, Ellie está viva e estamos felizes com isso, ou pelo menos a maioria de nós que sentiu ao longo do jogo e agora, ao longo da série, esse apego pela personagem e não só entende o que Joel faz para protegê-la como as justifica. Mas, ao mesmo tempo, dá pra sentir que não é um final feliz e heroico e que bom que a série acertou perfeitamente no tom ao adaptar esse pedaço, porque é uma parte muito importante e francamente, uma das minhas grandes preocupações quando a adaptação foi anunciada era que a TV pintasse demais o Joel como uma figura a ser seguida. Felizmente, não acredito que isso tenha sido feito aqui. Ellie sabe que há algo de errado, nós também sabemos e o último momento que temos com eles é o momento em que ela finalmente se decepciona com ele, depois de defendê-lo contra as acusações de Maria (Rutina Wesley), depois de confiar cegamente e segui-lo até o final.
A partir desse diálogo em que ela simplesmente finge acreditar nas mentiras que ele contou, essa relação não será mais como antes e o vazio se dá justamente por não termos tido um número suficiente de momentos felizes antes disso se quebrar, não temos um punhado de boas memórias pra onde a gente possa voltar. Esses personagens nunca tiveram a oportunidade de se consertarem totalmente, há uma sensação de desapontamento, de desperdício quase. Craig Mazin e Neil Druckmann repetiram o efeito do último capítulo do jogo em Look for the Light, e não nos deixaram satisfeitos. E é isso que eu acho genial nisso tudo.
Nós temos as girafas e os trocadilhos, mas queremos mais, merecemos mais, não só nós como eles também, que já passaram por tanta coisa no passado e mais coisa ainda depois de se encontrarem e seguirem viagem juntos. É por isso que, ao perceber que ainda há brilho no olhar e inocência em Ellie, ali enquanto alimentam uma doce girafa, urge um sentimento de preservação em Joel e ele tenta convencê-la a deixar tudo pra lá e apenas viverem suas vidas. Joel sabe que precisa disso, nós sabemos que ele precisa disso e acima de tudo, sabemos que Ellie merece isso também. Mas, nós também estamos condenados a apenas observar e sentir, sem poder fazer nada para ajudar ou impedir, enquanto esses personagens que amamos seguem presos em seu próprio mito grego. É trágico e também vicioso. E que venha a segunda temporada para que a gente continue a dividir esse fardo juntes.
Que temporada! Eu não mudaria nada.
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Roteirista e podcaster bacharel em Cinema e Audiovisual. Ex-potterhead. Escuta música triste pra ficar feliz e se empolga quando fala de The Last of Us ou Adventure Time. É viciado em convencer as pessoas a assistirem One Piece, apreciador dos bons clássicos da Sessão da Tarde e do Cinema em Casa e, acima de tudo, um Goonie genuíno.