Babilônia – O lugar mais mágico do mundo

Depois dos sucessos estrondosos de Whiplash: Em Busca da Perfeição (Whiplash, 2014), La La Land: Cantando Estações (La La Land, 2016) e O Primeiro Homem (First Man, 2018) é natural pensarmos Damien Chazelle como um dos grandes cineastas de uma jovem geração, e consequentemente, é também natural que sempre esperemos muito de sua próxima obra. Depois de ver seu mais novo feito, Babilônia (Babylon, 2022), não se pode negar a evolução do diretor e roteirista em sua forma de contar histórias, mas também de uma identidade autoral que vai se formando e ficando visível em sua filmografia.

Em Babilônia (Babylon, 2022) viajamos para a Hollywood dos anos 1920, que depois ficaram conhecidos como a Era de Ouro do cinema americano, com o surgimento dos grandes estúdios como a Warner Bros. (1923) e a MGM (1924), e o boom de produções estadunidenses megacomerciais, com o descobrimento da mina de ouro que era esta ainda muito recente forma de arte. É uma época que é lembrada através de uma névoa de muita fantasia, envolvendo não só os filmes feitos, mas especialmente seus bastidores e personagens, e é exatamente ao escolher explorar esse lado fantasioso que Chazelle acerta bem no meio do alvo. A história nos é contada pelo ponto de vista de três pares de olhos: Manny Torres (Diego Calva), um imigrante mexicano pobretão que surge como ajudante e “resolvedor de problemas” nas famosas festas de um magnata da nascente indústria cinematográfica, mas que sonha em estar num set de filmagens, fazendo o que for preciso; temos a bela e espalhafatosa Nellie LaRoy (Margot Robbie), uma jovem interiorana que segue para a cidade do cinema também em busca de seu sonho, o de ser uma grande atriz, em uma Hollywood que já começava a montar seu famoso Star System; e por último, do outro lado do espectro, o já famoso ator Jack Conrad (Brad Pitt), que está em seu auge de glória e já pensa em ultrapassar seus limites de possibilidades como ator, explorando ainda mais do que o cinema pode entregar.

É através desse protagonismo triplo, de personalidades bastantes heterogêneas e que eventualmente têm suas vidas entrelaçadas, que vamos sendo quase que literalmente levados a festas inacreditáveis, sets de filmagem extremamente conturbados, gravações megalomaníacas, premieres exorbitantes. O exagero é a ordem de comando no filme, o que poderia ser um fator negativo, mas nas mãos talentosas do diretor torna-se um caminho narrativo delicioso, e a escolha por compartimentar a história em cenas bem marcadas, quase como se fossem esquetes de humor, me parece também um acerto, fazendo com que as mais de três horas de duração do longa pareçam no máximo metade disso. Em muitos momentos parece que estamos assistindo aos sonhos mais ambiciosos de um Baz Luhrmann, em outros tudo o que Tarantino gostaria que tivesse sido seu Era Uma Vez em… Hollywood (Once Upon a Time in Hollywood, 2019). E tudo permeado pela já conhecida parceria com o incrível Justin Hurwitz, uma mistura de Jazz e Blues que já lhe rendeu alguns prêmios, e que dessa vez deve repetir o feito, já que a música acaba também fazendo parte da história que acompanhamos.

Isso porque atravessamos no filme um período de enorme transformação para o cinema, a chegada da possibilidade de som nos filmes, em substituição às cartelas do chamado cinema mudo, fato que vira completamente os caminhos dos três protagonistas de formas diferentes, mas complementares. Os altos e baixos dos três ainda são reforçados por vários outros personagens de importância e interpretados por um elenco que é tão sublime quanto o principal, como a escritora de tabloides Elinor St. John (Jean Smart sempre incrível), o músico e depois ator Sidney Palmer (Jovan Adepo), e o histérico assistente de direção Max (P.J. Byrne), além de participações rápidas mas marcantes como Eric Roberts, Katherine Waterston e Tobey Maguire ente muitos outros.

Para dar sentido a essa miscelânea de acontecimentos e personagens seria necessário um design de produção, figurino, cenários, maquiagens e penteados que fizessem jus às histórias, e afirmo sem medo de estar exagerando que neste quesito técnico o filme não foi menos que impecável. É clara a preocupação com todos os detalhes possíveis, mesmo os que poderiam passar rápidos ou despercebidos, cada cor e objeto mostrado parece ser um complemento à overdose audiovisual que estamos experimentando, coroando o visual com a experiente fotografia de Linus Sandgren, outra parceria com o diretor, que já rendeu bastante e merecido reconhecimento em premiações.

Babilônia é, claro, uma ode ao cinema. Mas não apenas uma homenagem sentimental e nostálgica, mesmo que tenha algo disso em alguns momentos, mas principalmente como forma fílmica de uma arte/indústria que a cada dia vem coroando a si mesma como a mais popular entre todas, praticamente uma espécie de metalinguagem, e mesmo que tenha minhas dúvidas sobre a necessidade dos últimos minutos do filme, contraditoriamente não consigo imaginá-lo sem eles. Babilônia é um espetáculo, em vários sentidos que esta palavra pode ter.


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