Halloween Ends – Marasmo, mas com fanservice

Desde sua estreia, Halloween: A Noite do Terror (Halloween, 1978) teve uma porção de continuações. Entre elas, como era de se esperar, algumas prometiam ser o derradeiro encontro entre Michael Myers – esse ano interpretado pelos atores Nick Castle e James Jude Courtney – e Laurie Strod (eternizada por Jamie Lee Curtis). Algumas vezes a gente pensou que isso pudesse ser verdade, como em Halloween H20: 20 Anos Depois (Halloween H20: 20 Years Later, 1998). Mas sabemos como Hollywood funciona: nada se perde, nada se cria, tudo vira uma franquia que vai ser sugada até não ter mais o que se inventar a partir daquilo.

Acontece que, entre mortos e feridos, Halloween voltou para mais uma saga. Dirigida por David Gordon Green, a trilogia “derradeira” de Michael e Laurie teve início em 2018, com  um filme que repetia o título do original, e se encerra este ano, carregando um título nada enigmático: Halloween Ends (2022).

Mais uma vez acompanhamos a antiga baby-sitter, que já é uma avozinha, tentando reconstruir a vida depois dos acontecimentos de Halloween Kills: O Terror Continua (Halloween Kills, 2021). Continuação direta, nesta história se passaram quatro anos depois da fatídica noite de 31 de outubro, segunda noite (nesta cronologia) dos assassinados perpetrados por Myers – a primeira teria sido ainda em 1978.

Ainda superando as perdas que teve no segundo filme, Laurie e a neta, Allyson (Andi Matichak) moram juntas em uma casa no meio da cidade, sem grades, sem cercas e (quase) sem paranoias. O que não acontece com o resto da cidade. Haddonfield continua vivendo à sombra de seus massacres e o nome do assassino é proferido a todo momento, inclusive nos programas de rádio. Os populares perseguem Laurie e a culpam no meio de rua, a plenos pulmões, por tudo que aconteceu. Não dá pra ter uma vida completamente normal quando você mesmo tem complexos com a sombra de alguém que tentou te matar algumas vezes, tirou sua família e ainda tem que lidar com desconhecidos, que te culpam por tudo que aconteceu.

É daqui que partimos – mas, não exatamente, já que a primeira cena do filme se passa em 2019 e mostra um acontecimento que se tornará essencial pro desenvolvimento de toda a trama. E talvez seja aqui que mora o problema: a trama de Halloween Ends é lenta, tem um desenvolvimento um tanto enrolado e, boa parte do tempo, soa como muitas coisas, menos como um filme de terror.

Há aqui uma tentativa de “se passar o bastão” e, acredito, talvez uma bem-intencionada forma de nos mostrar como a crueldade de uma população, que sofre com a mais pura falta de empatia, pode destruir tanto o psicológico de alguém a ponto dessa pessoa tentar se tornar o pior mal que já foi apresentado a ela.

E eu digo bem-intencionada porque acredito nessas boas intenções por parte da direção, que, sempre tenho fé, quer nos entregar boas histórias. Mas não consegui me conectar com a que foi contada aqui. 

Então fui eu que me vi sentindo um mínimo de empatia pelo personagem apresentado, Corey (Rohan Campbell), que sofre um bullying desenfreado dos playboys da cidade e, justamente por isso, acaba sendo acolhido por Laurie e Allyson. Mas os 2 primeiros atos do filme são arrastados e mornos. Com uma história pouco cativante e sendo insuficiente naquilo que mais se espera de filmes de terror slasher: sangue, perseguição e mortes. A não ser por um ou outro jumpscare, Halloween Ends me pareceu um drama insosso.

Há mais uma escolha criativa que me pegou aqui: essa tendência de nos apresentar sempre as pessoas que serão assassinadas como completos babacas. Uma marca que se tornou tão característica, que acaba tornando óbvias todas as personagens que perderão a vida e, pior, que tenta testar nossa consciência, como se quisesse nos fazer sentir bem com essas mortes – quase que justificando “esse merecia mesmo morrer”. E aqui eu não consigo entender se o autor quer pôr em xeque nossa compreensão de “maldade vs bondade” ou se ele simplesmente se recusa a matar pessoas que nós consideramos que mereçam viver (e talvez essa seja a verdadeira questão: acreditar que podemos escolher quem vive e quem morre, pela nossa própria medida de gostar menos ou mais de determinado indivíduo).

Talvez o terceiro ato do filme seja o que de melhor ele tenha a oferecer. Existe uma tenção criada desde o final do primeiro filme. Um encontro pelo qual esperamos e que muitos de nós sentiu falta em “Kills”. O embate final entre a mocinha e o vilão – o “bem” e o “mal”. E, aqui, se houve algo que eu considerei  que foi bem entregue, foi justamente este embate.

Repleto de reviravoltas e mini plot twists, o terceiro ato prega várias pequenas peças no expetador, que sempre que espera que algo aconteça, tudo se faz “ao contrário”. Então, se você viveu e acompanhou a saga exclusivamente por esta expectativa, você será bem servido.

Não posso dizer se isso será suficiente pra salvar o filme inteiro (isso fica por sua conta), mas, certamente, me trouxe bons momentos: frases feitas, violência, a sensação de “dar o troco” e, como o título realmente promete, um devido e merecido final pra saga de Laurie Strode. 

Embora eu não tenha considerado este o melhor filme da trilogia, saí da sala de cinema com esta sensação de missão cumprida, de alma lavada. Isso porque gostei do que entregaram para a personagem principal. São mais de 40 anos interpretando, aqui e acolá, a mesma protagonista, sempre fugindo do mesmo assassino. Já havia passado da hora de pôr um fim nesta relação, demasiado abusiva. Achei um fim justo, para Laurie, para Haddonfield, para a própria Jamie Lee Curtis e até mesmo para Michael Myers.


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