The Sandman – Não é proibido sonhar

Confesso que quando a Netflix anunciou a adaptação em live action de Sandman, obra-prima de Neil Gaiman, meu coração teve uma leve taquicardia. O histórico de adaptações de outras mídias não era favorável à locadora vermelha, vide as adaptações de Resident Evil (2022 -) e Death Note (2017). Porém, esse sentimento de frustração foi diminuído quando soube que o próprio Gaiman faria parte da equipe de roteiristas e produção.

Não que a visão do autor importe em um momento desses. Uma vez no mundo, a obra de arte foge dos braços de seu criador e vive na imaginação e na experiência de seu público. Mas ter Gaiman na equipe asseguraria que a Netflix não fosse Netflix demais, haveria um freio, um limite e isso é bem perceptível quando vemos a obra em si.

Adaptações foram feitas: é claro. Apesar de ter a faixa etária de 18 anos, a série é bem mais leve que o quadrinho, ônus de ser um produto midiático mais massivo e consequentemente menos subversivo (ainda mais se tratando de uma série Netflix). Contudo, a essência estava lá. Podemos considerar The Sandman (2022 -) uma boa adaptação, pois mantém o que é, ao passo que traz consigo elementos novos e necessários atualmente.

A mudança de etnia e de algumas ações dos personagens, amplamente criticado pelo fã nerdola, é muito bem-vinda. Sandman sempre foi uma obra inclusiva e diversa, os que não viam (ou ainda não veem isso) estão cobertos por um manto do conservadorismo e hipocrisia. Alguns episódios têm destaque: como os três últimos, o episódio sobre as asas da morte e a épica batalha no inferno.

Outros, fãs da obra original e que exigiam que ela mantivesse o caráter subversivo das HQs nas telas da Netflix, ficaram desapontados pela série mais leve que nos quadrinhos e por não aprofundar certas questões de caráter filosófico e existencial. Mas convenhamos, a linguagem do audiovisual não é a mesma da banda desenhada. O poder massivo e o alcance da Netflix são infinitamente maiores que o do selo Vertigo da DC, pensar em uma adaptação com toda subversão de Sandman seria impossível diante de uma audiência tão grande. Assim como o fã nerdola, esse tipo de comportamento e expectativa iria agradar uma parcela muito pequena de fãs.

E é aqui que está o pulo do gato em ter Gaiman na produção, The Sandman continua com seu caráter subversivo e inovador, mesmo em uma adaptação, mas não traz consigo seu caráter literal dos quadrinhos. Gaiman, a equipe de roteiristas, de produtores e direção fazem e trazem essas características de formas muito sutis e são pertinentes às obras audiovisuais. O bom e velho “mostre e não fale”. Nesse sentido, o seriado da Netflix é uma boa adaptação dos quadrinhos, quando se percebe que é um produto de uma cultura híbrida e se aceita como isso. Não é possível exigir algo que não se é capaz de entregar, isso seria loucura, ou para nos mantermos no universo de Sandman – um Delírio.

Dito isso, The Sandman é uma série boa de se ver e maratonar. As atuações são boas e as mudanças de roteiro e de personalidade de alguns personagens são adaptações bem-vindas e uma grata surpresa. Aos que reclamam da adaptação eu apenas posso sentir muito, pois perderam a chance de apreciar algo realmente bem-feito que é fiel e respeitoso à obra original, mantendo sua essência, mas acrescentando novas perspectivas. 


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