A Garota da Foto – Uma teia de crueldade e injustiças

Como boa fã de conteúdos de True Crime, corri para assistir A Garota da Foto (Girl in the Picture, 2022), novo documentário lançado pela Netflix, que é a rainha desse tipo de conteúdo. A história vai nos contar como um jornalista que olhava um site de pessoas que morreram sem identificação, foi atingido pela curiosidade e pela necessidade de descobrir o nome real e a família de uma garota que chegou a morrer em um hospital após um suposto atropelamento na década de 80.

A Netflix optou por contar, primeiramente, uma série de investigações em diferentes estados dos EUA que envolviam mortes, pedofilia, sequestro, violência doméstica e sexual. Em certo momento, percebemos que essa mesma garota da foto encontrada pelo jornalista, está envolvida em todos esses acontecimentos em todos os estados. Franklin Floyd se passava por pai e também por esposo de Sharon, uma garota inteligente, dedicada, que fazia amigos por onde passava e que causava curiosidade em todo mundo que passava por sua vida, tendo em vista que ela era extremamente reservada e pouco falava sobre a sua vida privada.

Ao longo do documentário, assistimos entrevistas com vários ex colegas e amigos de Sharon, que ao longo dos anos e a depender de qual estado estava, tinha nomes diferentes e tinha funções diferentes. Desde filha dedicada e que dava orgulho ao seu pai passando em uma faculdade de prestígio, até esposo que oferece a sua companheira para ser garota de programa e trocar seu corpo por dinheiro. Não bastando isso, havia o fato de Sharon já ter engravidado três vezes e ninguém saber ao certo o que tinha acontecido com essas crianças e quem eram os pais.

Vamos ficando cada vez mais angustiados ao perceber que, na realidade, Franklin Floyd era um pedófilo que sequestrava crianças, as usava e abusava o máximo que podia. Em um estilo meio Lolita, sua obsessão por Sharon foi maior que por qualquer outra, tendo em vista que, mesmo após Sharon chegar quase aos 20 anos, Floyd não a libertou do seu cruel destino. Sofreu desde os 4 anos de idade, quando foi sequestrada e abusada física e sexualmente. Acompanhamos relatos de uma amiga de Sharon que chegou a vê-la ser abusada, mas que na época era uma criança, não entendia bem o que estava acontecendo e tinha medo desse predador, que se dizia pai de Sharon, mas que usava o seu corpo de uma forma não convencional para uma criança que possui uma criação dentro dos padrões em casa.

Séries de investigações procuravam por Floyd e tentavam entender qual a real ligação do mesmo com Sharon. Após abandoná-la atropelada em uma estrada, Floyd fugiu com o filho dos dois, que antes desse acontecimento, havia sido adotado por uma família que chegou a ficar 4 anos cuidando, dando amor e protegendo esse novo filho. Eu sei que esse texto parece uma bagunça, mas a história é realmente complexa, cheia de reviravoltas, injustiças e tristezas por ver crianças perdendo a sua infância, sua esperança no mundo e sua liberdade.

O repórter que se sentiu tocado pela foto de Sharon, chegou a ir entrevistar Floyd na prisão, após a promotoria conseguir condená-lo a alguns crimes como sequestro e porte ilegal de armas, mas ele não dava qualquer sinal de que em algum momento contaria a verdade sobre quem era Sharon, como ele a sequestrou e o que tinha feito com o filho dos dois. Através de uma insistência mais firme por parte do FBI, Floyd assumiu que matou seu filho com Sharon e o enterrou, e através do DNA coletado por uma outra filha de Sharon, foi possível descobrir sua origem, o que havia acontecido nos momentos que antecediam seu sequestro e onde estava sua família.

Não temos aqui um final tão feliz. Sharon conseguiu seu verdadeiro nome em sua lápide e também reunir uma família, que pode criar novos laços e trocar lembranças daquela garota bonita, esperta, inteligente e que fez de tudo para que seus filhos não tivessem um destino parecido com o seu.

Mas o que mais me perguntei ao assistir o documentário, foi: se fosse uma criança negra, haveria tanta comoção? Diversos estados lutariam durante anos para compreender o que havia realmente acontecido e tentado prender os culpados dessa série de abusos? Há justiça também para as crianças pretas?


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