The Batman – O amadurecimento e as cicatrizes de um ícone

Filmes que adaptam quadrinhos às telas são sempre polêmicos e de difícil aceitação pelo público, principalmente quando se trata de um herói como o Batman, que tem um background como Bruce Wayne muito forte e que sempre é alvo de muitas comparações, tendo em vista que já existem muitas versões com diversos olhares sobre o personagem e todo seu universo. O fato é que Batman não existe sem Gotham e sem todos os outros personagens que fazem o herói ser um dos favoritos pelos fãs.

Matt Reeves teve a difícil missão de nos mostrar um Batman diferente do que já vimos em outros filmes. É um Batman com muito ódio e rancor guardados, e isso fica claro nas cenas de luta, que não copiam a fórmula John Wick, o que me agradou demais. São lutas brutais, secas, repletas de uma força que vem de um herói que ainda não sabe o seu lugar e que ainda não sabe dosar os seus próprios limites. Está sempre no limiar entre matar ou não.

Robert Pattinson nos traz um Bruce Wayne extremamente magoado, desesperançoso, com sede de uma justiça que se trata muito mais de vingança, e isso é claro desde os primeiros momentos do filme. Mas justiça pelo quê? Nem o Bruce consegue compreender. Nós acompanhamos um homem recluso, melancólico, cheio de cicatrizes que não conseguem curar, cicatrizes que são as únicas coisas que o personagem consegue sentir. Existe um vazio imenso, um vazio que quase engole completamente a vida do jovem Wayne. Pattinson consegue colocar toda essa carga dramática através do seu olhar, da forma como caminha, da forma com que o seu corpo se apresenta para o público. É um Bruce como nunca vimos antes em outros filmes, é um jovem adulto que ainda não conseguiu superar absolutamente nada do que aconteceu na sua infância. Mais um acerto do filme foi o de justamente não precisar retratar o trauma infantil vivido pelo personagem; ele existe, está ali, ele sabe, nós sabemos. Bruce Wayne é a sombra da morte dos seus pais.

É através do Batman, esse vigilante que busca fazer justiça com as próprias mãos, que Bruce Wayne se depara diversas vezes durante o filme com verdades escondidas sobre seus próprios pais, é olhando de verdade pra sua família, descobrindo que ela também é uma família que falha, descobrindo as fraquezas e inseguranças de Thomas Wayne, seu pai, que o nosso protagonista passa a compreender que uma verdade absoluta não existe. Que a busca incansável e insaciável por uma vingança cega, sem direção, não vai dar em lugar nenhum. Desfazer a imagem do pai perfeito é extremamente importante nesse filme. 

O Batman só está na ativa há dois anos no momento em que o filme se passa, então nós acompanhamos esse vigilante que ainda está aprendendo a lidar com a sua relação com o Alfred (Andy Serkis), figura tão importante para o personagem, mas que nesse filme está bastante em segundo plano, ainda não há a amizade e parceria como conhecemos. Esse não é um Batman brincalhão, piadista e que tem maturidade para lidar com esse laço que é o único que restou em sua vida. Acompanhamos a recém união do Batman com o Gordon (Jeffrey Wright). E, acho que é a minha parte favorita do filme, Matt Reeves consegue nos mostrar que, em Gotham, o Batman já é uma figura conhecida, as pessoas o temem, não o compreendem, e o medo ligado a sua figura é muito potente, conseguiram nos mostrar isso sem nem mesmo o Batman aparecer. É uma magia que fica toda no mérito da direção, trilha sonora – de Michael Giacchino – e o clima de tensão que está sempre no ar.

Esse filme é sobre as nossas cicatrizes, que também fazem parte de quem somos, que não se curam tão fácil e que todo dia precisam ser encaradas de frente, não apenas vistas, mas enxergadas. É preciso enxergar e lidar com as próprias dores. Vingança infundada não leva pra lugar algum. Filme forte, intenso, potente. Todos os atores estão bem em seus devidos personagens e apesar da duração, é o tipo de filme que te deixa querendo mais, mais Mulher-Gato (Zoë Kravitz), mais Pinguim (Colin Farrell), mais Charada (Paul Dano), mais Alfred e mais, muito mais, do amadurecimento do Bruce e do Batman.


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