O Diabo de Cada Dia – O mal está em todo lugar

O Diabo de Cada Dia (The Devil All the Time, 2020), produzido pela Netflix, dirigido por Antonio Campos e por ele escrito junto com seu irmão Paulo Campos, surge da adaptação do romance homônimo de 2011 escrito por Donald Ray Pollock. O longa destrincha um recorte de uma região no interior da América do Norte, gótica e noir, cadenciado por uma década sombria dos Estados Unidos. A produção conta com nomes de peso nas interpretações, como Tom Holland, Mia Wasikowska, Robert Pattinson, Bill Skarsgård e Haley Bennett, e o que o espectador acompanha  na trama são  os horrores físicos e psicológicos  ganhando  forma ao longo das gerações das personagens. E como as conexões, sejam tênues ou fortes, ficam presentes na construção da história pessoal de cada um deles.

O filme permaneceu no top 10 dos mais vistos na plataforma de streaming da Netflix no mês de sua estreia, setembro deste ano, gerando uma certa divisão pela apreciação da obra. Há os que amam e indicam e os que não se atraíram pelo ritmo da história. Eu pondero aqui a ideia de que cada história necessita de um tempo especifico para ser contada e entendida, portanto, O Diabo de Cada Dia não peca nesse quesito. Talvez a aceleração da vida atual nós faça espectadores ansiosos e relapsos para algumas histórias.

Logo no início da trama, vemos o regresso do traumatizado Willard Russell, (Bill Skarsgård), após sair da Segunda Guerra Mundial, tentar recomeçar a vida e iniciar uma família ao lado da doce garçonete Charlotte (Haley Bennett). O casal gera um único filho Arvin (Tom Holland).

A relação entre pai e filho, diante de diferentes tragédias e traumas por parte do Willard, molda a experiência de luto de Arvin ainda na infância, conduzindo a personalidade dele a partir de uma dureza e um entendimento de vida através do sacrifício.  A seguir, vamos sendo levados a compreender, através de outras tristes fatalidades, como serão compostas as novas personagens que interagem com Arvin, como a sua Irmã de criação, Lenora (Eliza Scanlen), que teve sua mãe (Mia Wasikowska) assassinada por um pastor (Harry Melling), dentre outras histórias, que compõem esse universo hostil entre as décadas que seguem 

A busca pelo impacto em cada uma das tragédias que será narrada, pode gerar em alguns uma sensação de banalidade nas ações, entretanto, imagine-se na posição de uma ouvinte diante de uma avô ou avó, com um passado cheio de pontos tristes, duros, e que causaram cortes na alma. Todavia, hoje já estão cicatrizados e podem ser falados de forma calma para ser bem entendido. 

É assim que a película vai se revelando aos nossos sentidos. Até mesmo a narração, feita pelo próprio Donald Pollock, que para uns pode soar como algo cansativa, para outros, pode ser compreendida como uma ferramenta que transmite o real sentimentos dos personagens acerca das situações vividas.

Toda a narrativa do filme fica com um sabor de lagrimas e sangue, pois a violência e as dores que acompanhamos está ali, vivendo e se relacionando direta e indiretamente entre todos, e ela não adormece, vive à espreita dos acasos. Seja na chegada de um pastor sem moral e aliciador de jovens inocentes, seja na corrupção da lei ou na perversidade de um casal de serial killers.  

Esse é um drama que alfineta um obscuro e triste período da realidade americana, ao passo que também nos alerta sobre o mal nosso de cada dia e como ele pode nos transformar. Caso esteja preparado para adentrar nessa atmosfera, fica a indicação e um aviso: As fatalidades, os dramas e as dores, tanto na vida real como nos filmes, precisam ser cadenciados para serem realmente digeridos.


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