Amor e Sorte – Episódio 3: Territórios – O melhor lugar do mundo

 

Dirigido por Patrícia Pedrosa e Ricardo e Spencer, com roteiro de Jô Abdul e Adriana Falcão, o terceiro episódio da minissérie antológica da Rede Globo, Amor e Sorte (2020), volta a aprofundar as relações e seus desafios durante esta época em que muitos de nós fomos levados ao confinamento e a convivermos uns com os outros de formas completamente diferentes do que estávamos acostumados. Em Territórios conhecemos o casal Clara (Fabiula Nascimento) e Francisco (Emilio Dantas) que, pouco antes do início da pandemia, se vê em vias de um término motivado pela traição de um deles, mas que antes de se separarem espacialmente, com alguém saindo de casa, como é comum acontecer nestes casos, a recomendação médica de que fiquem isolados onde quer que estivessem os pega de surpresa, ainda mais quando Clara é possivelmente diagnosticada com a doença.

Temos então o surgimento de um dilema: os dois se veem em um ponto onde geralmente os casais preferem tomar um distanciamento um do outro, o que se torna impossível, já que dividem a mesma casa. Uma passivo-agressividade se torna quase inevitável, mas de uma forma onde o passivo, ainda que com alguma dificuldade, se sobrepõe ao agressivo, pois o sentimento por parte dos dois é mais o de uma decepção, que faz nascer uma raiva não violenta, e sim triste. E é algo com o que pessoalmente me identifico bastante, certas decepções me levam a uma melancolia, como se sentisse que algo deu errado, o que me leva a buscar ou uma solução para consertar esse algo, ou ao menos uma explicação para que tenha seguido aquele caminho.

O tom de comédia romântica leve escolhido pelas roteiristas, com um ritmo compassado de uma montagem certeira, se mostram perfeitos para contar esta história que poderia ser extremamente pesada se apresentada de outra forma, mas carrega desde seu início um respiro que nos trás uma esperança. Esperança não necessariamente de que o casal se resolva e reate o relacionamento, mas que ao menos ambos fiquem bem, já que passamos a nos importar com os dois igualmente, quase como se estivéssemos presenciando o término de um casal de amigos de quem gostamos muito. É triste? Claro que sim. Mas pode ser uma experiência necessária para os dois.

A química perfeita entre Fabiula e Emilio, que são de fato casados, deu a Clara e Francisco o gostinho que precisávamos para realmente acreditar naquele casal, e de lamentarmos aquele possível fim. E o breve flashback onde somos levados pela memória dos dois ao momento de um de seus primeiros encontros, em uma quarta-feira de cinzas, nos comove ainda mais, ao som da belíssima Aqui e Agora de Gilberto Gil, música que servirá de mote para todo o episódio.

Mesmo separados dentro de sua própria casa e com as tentativas de arrumarem algum motivo besta para uma intriga, seja a lembrança do famigerado dentista, pivô da traição, seja a “sinceridade” sobre o péssimo cafuné de um ou a pouca habilidade para a dança de outro, fica óbvio que o casal não quer se separar, e é muito lindo perceber isso através da sutileza nas interpretações de Fabiula e Emilio, um sorrisinho ali, uma olhadinha de lado aqui. E o momento em que chegam a conclusão de que o relacionamento jamais “deu errado”, já que viveram juntos muitos e muitos momentos felizes, é o que nos faz pensar que, mesmo uma experiência decepcionante, ainda assim é uma experiência, e elas existem para que aprendamos.

Não é fácil tirar algo bom do lugar em que uma crise de saúde mundial nos colocou, não mesmo. Nossas cabeças não estavam preparadas para um acontecimento tão grandioso e desagradável – para usar de um eufemismo – que exige de nós forças que nem sabíamos que tínhamos. Mas talvez se olharmos bem, depois de respirarmos, de fazermos um carinho em nossos cães e gatos, de brincarmos um pouco com nossos filhos ou jogarmos um joguinho online com nossos amigos, no meio de tanta barbárie e provação que infelizmente estamos vivendo, talvez ouçamos lá no fundo Gil nos dizendo que o melhor lugar do mundo é aqui e agora.