Algumas obras são mais fáceis de serem adaptadas do que outras, mas sempre foi consenso que as obras de H.P Lovecraft não seriam fáceis de passar por esse processo. Adaptar para o audiovisual elementos indescritíveis que ficam na imaginação do leitor é uma responsabilidade complicada. Mas em uma nova tentativa temos A Cor que Caiu do Espaço (Color Out of Space, 2019), filme que adapta um conto de 1927 de mesmo título, onde um meteorito cai na fazenda de uma família do interior, trazendo uma cor misteriosa e desconhecida que começa a afetar de todas as formas o ambiente ao seu redor.
Decidi assistir o filme primeiro sem ler o conto, para tentar analisa-lo como filme por si só e depois li a obra original. Então para aqueles mais preocupados com fidelidade, já fica aqui registrado que o filme é muito fiel ao conto, claro, toma suas liberdades até porque a história do filme se passa nos dias atuais e a do conto em 1882 (e conhecemos a história através de alguém, que ouviu de alguém, que ouviu de alguém), mas os pontos principais, a essência da história se mantém.
No elenco temos o nosso polêmico favorito de Hollywood: Nicolas Cage, que se sai muito bem na verdade, tirando seus momentos de exagero que tornam as cenas mais engraçadas do que tensas, mas o filme parece lidar bem com isso, afinal quando ele foi chamado para o papel de patriarca da família, já se sabia disso. Mas pra mim Joely Richardson como Theresa é o verdadeiro destaque, a progressão de sua personagem é uma das melhores e talvez as cenas mais bizarras contem com ela. Como os filhos do casal temos um incrível Julian Hilliard, vindo de A Maldição da Residência Hill (The Haunting of Hill House, 2018 -) mostrando que tem muito talento para o terror, uma boa Madeleine Arthur que consegue roubar a cena quando aparece e um pobre Brendan Meyer que passa a maior parte do filme esquecido no churrasco.
E uma escolha interessante que seria Elliot Knight como Ward, que seria o equivalente ao narrador do conto, um enviado por uma empresa que pretende fazer uma represa na região. Alguns sites e blogs mais dedicados à obra de Lovecraft repararam que a escolha chama atenção, por Knight ser negro e Lovecraft ter sido como muitos sabem, um homem racista. A escolha teria sido um acaso ou pensada na hora do casting? Fica aqui essa dúvida.
Mas o que todo mundo quer saber de verdade, como é a tal cor? A escolha foi partir para uma pegada psicodélica, uma cor predominantemente rosa metálico que se mistura com outras se comportando de modos estranhos e que chega a passar bem a ideia de doença que o meteorito espalha pela terra, e que combinada com a fotografia, rende momentos belíssimos.
O diretor Richard Stanley sabe trabalhar bem os momentos de terror conforme a cor vai contaminando toda a terra, água, fauna e é claro, a família. Rendendo momentos tensos e bizarros, alguns mais simples do que outros, usando mais a atuação do elenco e os diálogos em alguns e usando efeitos prático para momentos mais gráficos, muito bem usados inclusive, ainda mais juntamente com os efeitos visuais. Talvez ele só não saiba lidar bem com os momentos de alívio cômico, que nos faz rir mais de nervoso do que realmente achando engraçado, mas diante de toda aquela situação bizarra, parece até se encaixar.
No fim fica tão em aberto quanto no conto o que realmente aconteceu ali. Se o meteoro ou mesmo a cor teriam consciência, se pensa e sabe o que está fazendo ou só trouxe microrganismos alienígenas. Não se sabe exatamente, a única certeza é que a cor é a chave de tudo, ela toma conta de tudo que toca mexendo com a matéria de diferentes modos, assim como afeta a família de diferentes modos, evidenciando algumas relações e conflitos enquanto eles definham.
Mesmo esquecendo o filho mais velho e tendo momentos chatos durante o segundo ato, o filme é uma boa adaptação que consegue retratar bem o famoso horror cósmico, e se depender dos produtores Elijah Wood (Senhor Frodo!!!) e Daniel Noah, não será o único. Já existe o projeto de começar um “universo” de adaptações de H.P Lovecraft, o próximo já escolhido seria O Horror de Dunwich, livro de 1929, que conta a história de um bebê que cresce incrivelmente rápido e quando adulto decide ir atrás do famoso Necronomicon, com certeza com intenções bizarras.
Resta esperar para ver se a ideia vai dar certo!
Bacharel em Cinema e Audiovisual, roteirista, escritora, animadora, otaku, potterhead e parte de muitos outros fandoms. Tem mais livros do que pode guardar e entre seus amigos é a louca das animações, da dublagem e da Turma da Mônica. Também produz conteúdo para o seu canal Milady Sara e para o Cultura da Ação TV.