Cenas que mais me marcaram no Cinema – Parte 7 | Mylla Fox

O cinema, para mim, é uma grande máquina de experiências e eu procuro assistir diferentes filmes com diferentes propósitos, mas não existe nada melhor do que um filme que se prova muito mais do que é. Muito mais do que entretenimento ou exercício estético, a obra se torna parte de você, você se envolve e vive cada segundo do que está em tela e a partir disso pode sentir coisas que são impossíveis para a vida humana, como voar, viver embaixo d’ água ou atravessar um buraco negro, por exemplo. Podemos também aprender e melhorar como pessoas com as histórias sem que tenhamos que passar por determinadas situações, tais como preconceito ou injustiça social. Ou seja, o cinema também é uma máquina de empatia.

Pois bem, quando essa série de textos começou eu achei que seria uma tarefa fácil. Ledo engano. Mesmo agora em que vou fechar uma lista eu sei que pouco depois vou ficar chateada de não ter incluído alguma cena específica. Escolher apenas dez cenas em vinte e tantos anos de cinefilia é um baita exercício de desapego, principalmente porque já foram escolhendo muitos dos que eu escolheria – se ao menos eu não tivesse demorado dois meses pra entregar, não é mesmo? – Bom, agora não adianta mais chorar pelo filme listado, vamos à lista! Eu optei por fazer um recorte de cenas que me provocaram, me emocionaram, me tiraram do meu lugar comum de alguma forma. Cenas icônicas do cinema ficaram de fora, mas é a vida.

“Mad World”
Começando pelo famigerado Donnie Darko (2001), um filme que as pessoas amam odiar. Donnie Darko marca uma época na minha adolescência em que eu me desafiava e me aprimorava o tempo todo, bem aquela prepotência típica da idade, lia livros densos, assistia filmes “considerados cults”, esse tipo de coisa. Nesse tempo eu costumava ir toda semana a uma locadora de DVDs que ficava próxima à minha casa, o que expandiu muito os meus horizontes com relação ao cinema. Eu assisti Donnie Darko pela primeira vez em DVD, a versão do diretor (talvez por isso o filme nunca tenha sido confuso pra mim) e sou completamente apaixonada pela melancolia da trama. Escolhi essa cena, já próxima do final, dos personagens acordando no momento em que Donnie cumpre sua missão, embalada pela música “Mad World”, porque se sacrificar por aqueles que amamos sempre foi uma ideia que eu romantizei muito e essa sequência, o filme e toda a trilha sonora mexem muito comigo.

“chuva de sapos”

 

 

Se tem uma coisa que eu gosto no cinema é quando ele extrapola o real e o normal e me pega totalmente de surpresa. Curiosamente assisti Magnólia (Magnolia, 1999) no mesmo dia que assisti Donnie Darko, porque aluguei os dois juntos. E lembro de ter ficado completamente chocada com a chuva de sapos, não ter entendido absolutamente nada e ter pesquisado o que aquilo poderia significar numa comunidade do finado Orkut. Assim como a Larissa disse na lista dela, também não revi Magnólia muitas vezes na vida, mesmo gostando muito. Não posso dizer que já sei o que diabos significa essa chuva de sapos, mas posso dizer que até hoje continuou gravada na minha mente.

Suavizando um pouco a lista, mas nem tanto, vamos para um dos filmes da minha vida. O clássico da sessão da tarde e o filme ícone de todo Millennial, Curtindo a Vida Adoidado (Ferris Bueller’s Day Off, 1986). Essa cena meio que serve de respiro dentro da trama, não tem diálogos, só o instrumental de “Please Please Please Let Me Get What I Want”, do Smiths. Uma anedota é que eu sempre amei muito essa cena e essa música e mesmo assim, eu nunca tinha percebido que a música era essa, muitos anos mais tarde, gravando um podcast sobre o filme é que eu fui descobrir isso. Cabeças explodiram nesse dia. De todo modo, aqui a melancolia, a solidão de Cameron (Alan Ruck) e a agonia de ser retraído pela própria família sempre me levou às lágrimas, mesmo que nada seja dito na cena, e acho que a escolha de colocar a música sem a letra é o que torna tudo tão sutil e bonito.
Mikey’s speech”
Os Goonies (The Goonies, 1985) é um filme aventuresco e que pode significar absolutamente nada para muita gente. Ele pode ser bobo e infantil, mas, moldou meu caráter de tal forma que seria impossível não entrar nessa lista. Eu fui uma criança que mudei várias vezes de casa, de escola e de cidade, é ótimo para o seu desenvolvimento, mas é péssimo para o seu emocional, quando a gente é novo tudo parece uma grande calamidade e sempre me identifiquei muito com o líder dos Goonies, Mikey (Sean Astin), que está completamente desesperado para ter uma grande aventura antes de se separar de seus amigos e precisa convencê-los a irem com ele, uma aventura que talvez pudesse salvá-lo desse terrível destino que seria sair das docas Goon. Então, eu amo o discurso de Mikey nessa cena.
“O pior banheiro da Escócia”

 

 

O mergulho de Renton (Ewan McGregor) é uma das coisas mais nojentas, repugnantes e agonizantes que eu já tive que assistir na vida. E eu adoro como o filme brinca com a nossa sensibilidade e ao mesmo tempo cria metáforas que tornam a coisa toda menos indigesta. Trainspotting: Sem Limites (Trainspotting, 1996) tem algumas cenas marcantes, dentre elas a maneira como se traduzia o pico da droga, com os personagens afundando no chão, mas dentre todas elas essa foi a que eu escolhi porque é a que faz com que eu me sinta mais ativa do filme, realmente querendo evitar que aconteça o inevitável. Eu revi a cena antes de colocar na lista, eu sei o que acontece e mesmo assim eu fiquei me retorcendo na cadeira, é incrível que um filme consiga isso e não vou sofrer sozinha.

“o culto ao escritor”

 

 

Mãe! (Mother!, 2017) é outro desses filmes que todo mundo quer ter uma opinião sobre, ainda mais ultimamente que as opiniões são sempre polarizadas. Quer você odeie o filme ou não, não tem como fingir que ele passou despercebido. Eu escrevi uma resenha aqui no site bem vaga porque eu queria mesmo é que as pessoas fossem assistir e nunca mais voltei para realmente destrinchar cenas e simbologias ou algo assim, também não me interessa muito fazer isso porque acredito que grande parte da graça do filme é o que enxergamos nele. Participei de um podcast a respeito, se quiser ouvir, clica aqui e me dá um feedback depois. Mas, de toda forma, Darren Aronofsky é um dos meus diretores favoritos, ele me inspira de várias maneiras e, nesse filme em particular, ele consegue descrever exatamente o que eu penso e o que eu sinto a respeito da natureza do ser humano de um modo que nenhum outro diretor fez até hoje (pra mim). E essa cena é a que as coisas começaram a galopar exatamente para onde eu achava que iria e quanto mais o caos ia tomando conta, mais eu gostava.
“Diva Plavalaguna”

 

 

Fazendo uma guinada drástica no tom da lista, trago uma cena de um dos meus filmes favoritos da infância. O Quinto Elemento (The Fifth Element, 1997) é icônico pra mim, tanto pelo visual excêntrico da trama como um todo, quanto por ter visto dezenas de vezes, por conta dessa época de cinefilia por DVD que me permitia alugar o mesmo título de novo e de novo (para o desgosto do meu pai que achava um desperdício). De qualquer forma, esse filme tem muitas cenas que eu poderia colocar, mas essa em particular é uma das melhores e a que eu lembro com mais carinho, inclusive de gravar numa fita cassette o número de Diva Plavalaguna (Maïwenn) com minha irmã e escutar em outros momentos com ela, quando fazíamos faxina na casa, por exemplo. Não poderia não entrar na lista.
“Regina escreve o nome dela mesmo no livro do Arraso”

 

 

Imagino que agora você deve estar pensando “sério que ela vai colocar Meninas Malvadas (Mean Girls, 2004) na lista de cenas marcantes?!” Sério. Seríssimo. Meninas Malvadas é um jovem clássico sim e só é menosprezado pelas pessoas porque além de ser uma comédia, é um filme “de menina”. Infelizmente para essas pessoas, é impossível negar o impacto que esse filme tem na cultura pop. Como qualquer outra obra importante, Meninas Malvadas é referência para outros filmes, clipes, memes e datas comemorativas. Escolhi essa cena porque realmente acho um plot twist muito interessante que desencadeia num clímax que eu não estava esperando quando vi o filme pela primeira vez, eu estava esperando um típico filme adolescente sobre competição feminina em que uma sai por cima e outra se dá mal e Meninas Malvadas não é sobre isso, se destacando portanto e ocupando seu lugar de direito nessa lista. Se você não leva ele à sério mesmo depois de tudo isso, então you can’t sit with us.
“O Nada”

 

 

Não existe nada que me aterrorize mais do que a ideia da não-existência, do nada que um dia engolirá a tudo e a todos. É realmente um pensamento que me assola até hoje e dentre tantos filmes de monstros e contos de terror, a ameaça do Nada, de A História Sem Fim (The NeverEnding Story, 1984) sempre foi a que mais se impregnou na minha mente. O maior e pior vilão de todos.
“A Morte”

 

Isso contrasta com a última cena da lista, do filme Fonte da Vida (The Fountain, 2006), também do Aronofsky, provavelmente o filme mais esquecido dele. Fonte da Vida fala sobre amor, vida, tempo e morte. E essa cena que escolhi não seria tão boa não fosse a música “Death is the Road to Awe”, última trilha da OST inacreditável assinada por Clint Mansell. Quando eu penso na morte e entro em crise existencial, é esse filme e essa cena que me dá o conforto que eu preciso, muito mais do que qualquer outra mensagem de espiritualidade que já tenha visto na vida. De certa forma, essa cena é minha religião.