O novo Halloween, dirigido por David Gordon Green e por ele escrito em colaboração com Danny McBride e Jeff Fradley, traz de volta, exatamente 40 anos depois, um dos psicopatas mais icônicos do cinema de horror, criado em 1978 pelos visionários John Carpenter e Debra Hill em Halloween: A Noite do Terror (Halloween).
O novo filme da franquia – que parece levar em conta apenas os dois primeiros, ignorando outros seis filmes, além dos dois malfadados longas em que Rob Zombie tenta reiniciar a série – nos apresenta um Michael Myers já velho e grisalho, encarcerado todo este tempo em absoluto silêncio, na espera pelo momento oportuno em que voltará para Haddonfield e terminará seu objetivo inacabado. Enquanto isso, uma traumatizada Laurie Strode (Jamie Lee Curtis), ao contrário do que se poderia imaginar, passou todos estes anos se preparando, e mais ainda, esperando, o retorno de seu cruel algoz. Preparando tanto o ambiente em que decide se proteger quanto a si mesma e a filha, muito mais física do que psicologicamente, já que o medo que governou suas vidas durante tanto tempo acaba inevitavelmente por afastar mãe e filha, e consequentemente a neta de Laurie.
O primeiro motor do filme é exatamente a determinação de Laurie em vingar-se de Michael por tê-la feito viver temendo seu retorno e relembrando o que ele a fez passar décadas antes. Além disso, colocar como principal objetivo de Laurie a total aniquilação do psicopata, numa tentativa de se livrar deste constante temor. O filme, então, se propõe a colocá-la no mesmo patamar de Michael, até mesmo se indagando através da fala de um dos personagens: “é possível que um monstro possa criar outro?”. Assim, em vários momentos, a personagem de Curtis é colocada, literalmente, em lugares que antes foram de Michael e sua personalidade amedrontada beira, muitas vezes, a loucura, uma vez que chega a demonstrar um desejo quase maníaco de que Myers a reencontre para que ela concretize sua missão.
Mas fora isto, que poderia ser um caminho bem interessante de se observar, estruturalmente o filme não se mostra muito mais pretensioso, usando códigos clássicos do slasher, gênero cinematográfico que seu original ajudou a sedimentar, e usando este como principal referência, acaba por se repetir demasiadamente. Portanto temos os jornalistas curiosos (no caso podcasters) que atiçam o assassino, o policial meio atrapalhado encarregado da investigação, o médico misterioso que conhece a fundo o psicopata, a jovem babá, e muitas, MUITAS, escolhas idiotas por parte das futuras vítimas. Passamos, então, toda a primeira metade do filme esperando ansiosamente até que o reencontro inevitável aconteça, enquanto nos distraímos com algumas sequências interessantes do rastro de sangue que Myers deixa pelo caminho – e aqui é preciso parabenizar o bom trabalho da equipe de efeitos práticos do filme.
Neste sentido, tecnicamente o filme é competente dentro do gênero, mas sem muitas inovações, e é perceptível a interferência do histórico de comédia que os três roteiristas têm no currículo, o que talvez cause alguns dos maiores escorregões no roteiro. Por outro lado a direção de Green toma algumas decisões interessantes que enriquecem o clima de tensão necessário tanto nas sequências mais calmas quanto nas mais ligeiras. O uso que Cody Carpenter faz da imortal trilha musical criada por seu pai em 1978 é bastante coerente, modernizando-a quando necessário, tornando-a mais suave e lenta, e referenciando a original nos pontos altos do filme.
E por ponto alto obviamente quero dizer o momento final do encontro entre Michael Myers e sua irmã Laurie Strode, desta vez preparada para o embate, e de fato temos uma boa sequência, mas novamente nada de especial ou memorável, que levantaria a franquia ao patamar das grandes obras de terror da atualidade. No entanto, é preciso dizer que a performance de Jamie Lee Curtis é o que realmente aquece o coração do espectador durante todo o longa, com uma convincente aparência de senhora de idade, com rugas e cabelos grisalhos (a atriz de 60 anos aparenta na vida real ser muito mais jovem do que é), sua Laurie vai muito além de um Bryan Mills de Busca Implacável (Taken, 2008) em sua versão feminina, demonstrando uma clara fragilidade em meio a todos aqueles anos de preparo físico, contribuindo para a credibilidade que dispomos na personagem, mas ao mesmo tempo demonstrando a força inimaginável que uma mãe/avó emprega para proteger suas crias (e a si mesma), que logo me fizeram lembrar uma Sarah Connor.
Halloween acaba sendo, sim, uma divertida volta aos personagens que um dia fizeram História no slasher e um representante competente do gênero, além de uma interessante nova continuação para a franquia, mas não muito mais do que isto.
Cineasta e Historiador. Membro da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema). É viciado em listas, roer as unhas e em assistir mais filmes e séries do que parece ser possível. Tem mais projetos do que tem tempo para concretizá-los. Não curte filmes de dança, mas ama Dirty Dancing. Apaixonado por faroestes, filmes de gângster e distopias.