Hotel Artemis (2018) é o longa de estreia de Drew Pearce, que já havia co-roteirizado o fraquíssimo Homem de Ferro 3 (Iron Man 3, 2013) juntamente com Shane Black, e já traz logo nessa primeira empreitada o peso de um elenco de respeito e de uma ideia com grande potencial.
A ideia base do filme é realmente interessante. Hotel Artemis é uma instituição altamente secreta que tem como finalidade abrigar e tratar de criminosos. O Hotel funciona como um espécie de hospital/refúgio para bandidos de todas as classes, uma zona neutra onde esses caras maus vão quando estão com problemas (contanto que estejam com a anuidade em dia). Mas o lugar, gerenciado pela Enfermeira (Jodie Foster) que é auxiliada pelo gigante Everest (Dave Bautista), só se mantém minimamente estável porque existem regras rígidas básicas estabelecidas pela administração, como a proibição do porte de armas de qualquer tipo nas dependências do prédio, bem como de insultar ou ferir qualquer outro hóspede/paciente, entre outras.
A história que acompanhamos no filme inicia em um futuro não tão distante, numa Los Angeles assolada por inúmeras rebeliões populares que reivindicam a falta de água potável na cidade. Enquanto isso, um grupo de assaltantes de banco, se aproveitando do caos estabelecido na cidade, se envolve em uma troca de tiros com policiais, acabando com três membros do grupo feridos, que os obriga a se dirigirem para o Hotel. Ao chegarem e serem recebidos pela Enfermeira apenas dois deles conseguem entrar no estabelecimento, pois o terceiro não possuía o chip implantado no braço que provaria sua associação, e logo é convidado a se retirar. Os dois que conseguem entrar, logo recebem apelidos, para evitar a utilização dos nomes reais, que correspondem com os títulos das suítes em que irão se hospedar (todas com nomes de lugares turísticos paradisíacos). Waikiki (Sterling K. Brown) arrasta seu irmão quase morto, Honolulu (Brian Tyree Henry) para a mesa de operação, enquanto somos apresentados para dois outros hospedes, Nice (Sofia Boutella), uma assassina francesa que incorpora a clássica “dama fatal”, e Acapulco (Charlie Day), um traficante de armas falastrão e irritante. Estabelece-se assim o cenário para o jogo que se irá desenrolar durante todo o filme. Uma base com um potencial incrível, não é mesmo?
No entanto, infelizmente, este potencial é praticamente todo desperdiçado. Todos os problemas que vão se apresentando para desestabilizar o Hotel não parecem fazer sentido, demonstrando uma enorme falta de organização na estrutura do roteiro de Pearce. Ele cria uma grande expectativa conforme as ações vão acontecendo, incorporando novos elementos, como uma policial ferida que pede ajuda à Enfermeira, colocando em risco sua autoridade e revelando algo sobre seu passado e sua personalidade, ou a iminente chegada de um chefão da máfia ferido, anunciada por seu filho esquentadinho, e quando todos estes problemas se mostram, sim, conectados, já é tarde demais para que possamos aceitar, o que se agrava ainda mais com um desfecho mequetrefe para toda aquela enrolação.
Os criminosos nunca se mostram interessantes o bastante, ficando subaproveitados pela trama. Os backgrounds de cada um deles são apresentados de forma extremamente expositiva, através de diálogos e frases soltas. E até mesmo o clima tenso criado pelo decente desenho de produção do ambiente interno do Hotel e ajudado por uma fotografia quase sombria demais, não são o bastante para nos conectar com as reviravoltas que acontecem dentro do prédio, dificultada por uma direção confusa que constantemente parece se perder naqueles corredores.
É triste pensar em como esta ideia poderia ter sido muito melhor aproveitada se, talvez, ela em si tivesse sido desenvolvida e não apenas usada como base. Se as nuances de uma instituição como um hotel/hospital para criminosos, toda a mitologia que o cerca (inclusive fica claro que existem outros como o Artemis ao redor do mundo), todas as regras que regem aquele universo semi-pós-apocalíptico, tudo isso deveria ter sido melhor explorado. Consigo imaginar toda uma franquia de filmes interessantíssimos envolvendo esta ideia, com várias histórias diferentes sendo contadas dentro deste universo. Mas, infelizmente ela foi demolida pelo fraco desempenho de Pearce.
O que fica parecendo é que o diretor e roteirista teve uma bela e simples boa ideia, apoiado por um ótimo e potencialmente carismático elenco, mas não teve a segurança e a sagacidade para trabalhá-la. Como se alguém comprasse um avião à jato, mas não tivesse a menor ideia de como fazê-lo sair do chão. O resultado pode até ser divertido de ver, mas não é nada bonito.
Cineasta e Historiador. Membro da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema). É viciado em listas, roer as unhas e em assistir mais filmes e séries do que parece ser possível. Tem mais projetos do que tem tempo para concretizá-los. Não curte filmes de dança, mas ama Dirty Dancing. Apaixonado por faroestes, filmes de gângster e distopias.