Em 2008 a
Marvel Studios, ainda em seu período pré-Disney, tendo seus filme distribuídos pela Paramount, lança o segundo de uma das maiores empreitadas já realizadas por um estúdio Hollywoodiano especializado em
blockbusters,
O Incrível Hulk (The Incredible Hulk, 2008), antecedido em alguns meses pelo sucesso absoluto de bilheteria
Homem de Ferro (Iron Man, 2008), dando continuidade ao que depois ficaria conhecido como
Marvel Cinematic Universe (MCU).
O gigante esmeralda dos quadrinhos da Marvel foi criado por Stan Lee e Jack Kirby na década de 60, e desde lá foi adaptado inúmeras vezes para o audiovisual, sendo a mais famosa delas a série estrelada por Bill Bixby e Lou Ferrino transmitida entre as décadas de 70 e 80, sucedida por alguns filme para TV. Após isso, o monstrão aparece em algumas séries e longas animados, para apenas em 2003 fazer uma tentativa em grande estilo de retorno em
live action com
Hulk (2003), dirigido por Ang Lee e com Eric Bana no papel de Bruce Banner. O filme não é de todo ruim, mas o público não aceitou bem a versão do “herói” fofinho e cheio de
daddy issues, além dos bizarros doguinhos gama, levando o filme a um grande fracasso nas bilheteria e colocando-o na lista negra dos fãs mais fervorosos do personagem.
Cinco anos depois, o novo chefão da Marvel Studios, Kevin Feige, contrata o diretor de filmes de ação Louis Leterrier e o roteirista Zak Penn para um novo longa do Hulk, desta vez associado a seu projeto de universo compartilhado de heróis da Marvel, deixando bem claro que este não seria uma continuação e não teria qualquer ligação com o fracasso de 2003. Assim, Edward Norton, declarado fã dos quadrinhos, é chamado para viver o aflito doutor Banner nesta nova versão, tendo contribuído inclusive na finalização do roteiro, tentando fazer com que, diferente do filme de Ang Lee, este novo longa se aproximasse um pouco mais de suas referências base nos quadrinhos e na série de TV, o que felizmente, de certa forma, conseguiram.
O filme inicia com a sábia decisão de não se alongar contando a história de origem do Hulk, fazendo apenas uma rápida montagem na sequência de abertura e depois saltando diretamente para o refúgio de Bruce Banner na Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, anos depois de seu incidente com radiação gama, que depois ficamos sabendo, aconteceu ao se tentar recriar um projeto antigo do Exército Americano conhecido como Super Soldado, iniciando ligações futuras para o projeto do MCU. Banner vive oculto no Brasil intercalando sua vida em tentar encontrar uma cura para seu pequeno probleminha de raiva e tentar controlar seu humor através de técnicas de meditação esquisitas, enquanto se disfarça de operário em uma fábrica de refrigerantes. Um pequeno acidente na fábrica envolvendo seu sangue e Stan Lee acaba reavivando sua caçada liderada pelo tirano General Ross (William Hurt), que agora conta com a ajuda do agente especial britânico Emil Blosky (Tim Roth) para capturar sua almejada presa.
Assim, o filme se desenrola em uma série de fugas e embates, gerando boas sequências de ação, com destaque para os efeitos de captura de movimento e de criação de um novo Hulk que se aproximasse mais do que seria real se uma besta verde como aquela existisse, com uma pele mais escura e músculos protuberantes (quase estourando) é claro o avanço em relação ao filme anterior, além do que sabiamente Leterrier escolhe por esconder o monstro o maior tempo possível, seja nas sombras ou na fumaça de bombas de gás, contribuindo tanto para torná-lo uma ameaça mais perigosa, já que quase não é vista apesar de seu tamanho, quanto para ocultar as imperfeições nos efeitos especiais. No meio disto tudo, como já era de se esperar, ainda há espaço para o romance entre Bruce e a filha de seu antagonista, a doutora Betty Ross (Liv Tyler), com direito a algumas cenas de alívio cômico e referências ao clássico King Kong.
Tim Roth encarnou bem o vilão que depois sabemos ser o Abominável, uma espécia de Hulk mais forte e do mal, apesar de o personagem ter motivações simplistas demais e servir apenas como um grande empecilho para o “herói”. O filme deixa inclusive uma ponta solta para uma possível continuação ao revelar que o contato que estava se comunicando com Bruce enquanto este estava no Rio se tratava de Samuel Sterns (Tim Blake Nelson) que, para quem conhece os quadrinhos, se trata do vilão Líder que recebe sangue do Hulk na cabeça afetando o tamanho de seu cérebro e aprimorando sua inteligência, e a última aparição de Sterns no filme é exatamente depois de sofrer algo parecido em um plano que vemos uma bolha crescer em sua cabeça (só peguei essa referência muito tempo depois de ver o filme pela primeira vez).
Mesmo com alguns problemas o filme teve uma boa recepção do público e introduz bem uma das personagens chave dos Vingadores e do MCU, além de um dos “heróis” mais interessantes e amados da Marvel e até a saída de Edward Norton das aparições posteriores do Verdão, alegando que não desejava interpretar o mesmo personagem várias vezes, foi benéfica já que abriu espaço para que Mark Ruffalo o substituísse anos depois em The Avengers: Os Vingadores (The Avengers, 2012) nos entregando um Bruce Banner mais carismático e mais cômico, totalmente diferente do que o de Norton. O Incrível Hulk talvez seja o filme que mais se afasta do espírito dos longas do MCU, mais duro e sério e exatamente por isso teve um papel de importância como balança na criação deste universo, estudando o tom que os filmes posteriores iriam tomar, seguindo mais o modelo de Homem de Ferro.
A cena pós-crédito, que se tornaria marca registrada dos filmes do MCU, neste Hulk é uma das mais estranhas de todas, contando com uma aparição de Tony Stark/Homem de Ferro (Robert Downey Jr.) encontrando o General Ross para falar sobre a iniciativa que Nick Fury (Samuel L. Jackson) havia lhe convidado. Estranho que Tony tenha procurado o general e não o próprio Bruce. Será se já estavam preparando terreno para os eventos da “Guerra Civil” oito anos depois? Não duvido.
Cineasta e Historiador. Membro da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema). É viciado em listas, roer as unhas e em assistir mais filmes e séries do que parece ser possível. Tem mais projetos do que tem tempo para concretizá-los. Não curte filmes de dança, mas ama Dirty Dancing. Apaixonado por faroestes, filmes de gângster e distopias.