Amar ou odiar um trabalho cinematográfico. Apontar os piores e eleger os melhores. Satirizar uma produção ou endeusa-la. Afinal, o que representa para nós essa indiscutível sede de classificação, que engessa os filmes em um lugar do subconsciente como merecedores de glórias ou símbolos de escárnio? Seria uma necessidade humana de alimentar esse senso maniqueísta, e por isso cultivamos a obrigação de aprisionar tudo que consumimos em caixas de metal sob classificações de “sensacionais” e “intragáveis”?
Historicamente, sabemos que a premiação do Oscar, a maior do cinema mundial, teve sua primeira edição em 11 de maio de 1927 – Já sua versão em zombaria, “Framboesa de Ouro”, foi criado em 1980 e suas indicações vem de jornalistas, cinéfilos e internautas. Deixaremos as discussões enaltecedoras que recebem os filmes indicados ao Oscar um pouco de lado nesse momento, e nos voltaremos aos termos pejorativos que se destinam as produções indicadas ao Framboesa de Ouro. Dentre todas que se aplicam, uma delas muito me chamou a atenção recentemente, o termo em questão é a palavra “pretensioso”, que vejo ser usado com tom de rebaixamento e menosprezo por parte dos apontadores de críticas da sétima arte.
Para compreender minha atenção especial sobre o termo citado acima, se faz necessário fazer o trabalho sutil de reflexão sobre o ato de receber a experiência um filme. Note aqui, que uso as palavras “receber a experiência”, com a ideia de que cada filme é uma experiência única e individual, por mais que seja compartilhado em salas de cinema, a sala da sua casa ou mesmo de forma online. Some a esse pensamento a premissa de que um filme traz em si bagagens diferentes, assim como também exige coisas diferentes de quem está assistindo, que agregadas de sensações psicológicas, fisiológicas do expectador e a outros fatores simples, porém cruciais para uma fiel experiência, tais como: Ruídos de pipocas sendo trituradas por bocas insaciáveis; Flash de celulares irritantes que desejam exibir a todos que alguém está “assistindo” um filme; Conversas de interesse único sobre a última briga com uma vizinha que entram em nosso campo auditivo, mesmo sem nosso interesse e por aí vai…Que, ao final de tudo, o expectador traça um linha, faz um soma e expressa a todos seu julgamento: “ Amei” ou “Odiei”.
Fato esse que é inquestionável, afinal é apenas o resultado de onde a obra conseguiu te levar. Entretanto, ultrapassamos! Talvez por considerar muito pouco o poder de nossas opiniões (quando perguntadas) e nesse admirável mundo novo, onde todos podem vaidosamente se considerar produtores de conteúdo, vemos o termo “pretensioso” vir à tona e preencher discussões calorosas sobre o que se destina ao paraíso do Oscar ou ao ostracismo do Framboesa. Todavia, a arte nasce de pretensões! O cinema vive de pretensões! Compramos um ingresso para sentir experiências de coisas, que pretende ser muito além da vida real. Seja entre heróis com capa que lutam contra o crime e lugares inacreditáveis, ou ficções psicológicas que apresentam inquietações internas de um (a) diretor (a), somos todos guiados a sair da pura e lógica realidade e a testemunhar as aspirações, ambições e pretensões de quem escolhe apresentar suas ideias em um filme.
A vida, a rotina e todas suas infindáveis sequências precisam de seres pretensiosos, para que não se produza sempre “o mais do mesmo”. Sair do comum e se lançar às incertezas, não apenas nas questões das inseguranças internas, como o medo de falhar, mas abarcando também as de ordens financeiras: Como baixa bilheteria, custos de produção e outras dívidas acarretadas no momento em que se assume compartilhar uma história no cinema, me fazem ter cada dia mais orgulho e desejar vida longa aos novos e antigos diretores que, sonhadores e pretensiosos, não deixam que nossas experiências após um filme sejam apenas pele morta das emoções do passado.
Assistir um filme, ter uma relação individual com ele e após isso: Aclamar, xingar, colocar na sua lista de geniais ou na lista de intragáveis. Que tipo de pretensiosos tudo isso faz de nós? E que tipo de prêmios merecemos por isso?
Pisciana, web-jornalista, filósofa, social media, editora, aspirante à mochileira, dramaturga, maquiadora de efeitos especiais e viciada em fazer monografias. Sabe fazer malabares com objetos, mas joga bem melhor com as palavras. Detesta vestir roupa, filmes redublados e não pode comer abacaxi, mas adoraria.