Doentes de Amor (Big Sick, 2017) é inspirado na história real de como o ator e comediante Kumail Nanjiani – um dos destaques do elenco da série Silicon Valley (2014-2017) – e sua esposa, Emily V. Gordon, se conheceram e se apaixonaram. A narrativa é assinada pelos dois e foi indicada ao Oscar 2018 na categoria de melhor roteiro original, aqui Kumail interpreta a si mesmo em situações que realmente aconteceram, junte isso com a direção leve e fluída de Michael Showalter e temos uma grata surpresa dentro de um gênero difícil de inovar como o de comédia romântica. Tudo é muito natural e, justamente por ser natural, torna-se encantador ao espectador.
Kumail divide seu tempo entre tentar progredir no ramo do stand-up comedy e fugir das pretendentes que sua família paquistanesa lhe arruma durante as visitas de fim de semana, neste meio tempo ele conhece a estudante de graduação, Emily. Os dois se apaixonam e começam a viver esse romance, mas suas culturas entram em conflito. Como se não bastasse, Emily adoece de maneira misteriosa e Kumail se vê envolvido por toda a situação.
Poderia ser somente uma história de amor previsível como tantas outras em que o casal se apaixona, briga no final do segundo ato e reata no fim do terceiro, mas o grande trunfo de Doentes de Amor, além de ser baseado em acontecimentos reais – é o elenco. Emily é vivida por Zoe Karan e confesso que desde que a vi em Ruby Sparks – A Namorada Perfeita (Ruby Sparks, 2012) tenho a tendência de gostar dos filmes em que ela participa e das personagens que ela interpreta, isso acaba acontecendo novamente aqui. Mas os atores coadjuvantes também se destacam, principalmente os pais de Emily, vividos por Ray Romano e Holly Hunter, a química entre eles funciona muito bem, eles simplesmente passam por um casal normal, com seus problemas e alegrias normais, críveis, assim como os pais de Kumail, Anupam Kher e Zenobia Shroff. O único núcleo que não funciona no filme é o dos amigos comediantes de Kumail, Bo Burnham e Aidy Bryant não parecem se encaixar muito bem nem nos momentos de drama nem nos de comédia do filme.
Quando comecei a pensar sobre o filme percebi que ele nos apresentava duas famílias, ou três casais como preferir, que de certo modo discutem a tradição e o respeito às culturas, os pais do nosso protagonista tiveram o casamento arranjado, como é o costume deles, mas contrariando o que poderia pensar o ocidente sobre essa prática, a união dos dois parece estável e feliz, o que facilmente seria fonte de piadas se o roteiro fosse escrito por alguém de fora, aqui é retratado até mesmo com respeito. Enquanto os pais de Emily, que se conheceram de acordo com o costume ocidental – e o modo como Beth (Holly Hunter) descreve o começo deles remete até mesmo à uma casualidade pouco romântica quando diz “eu gostei do cabelo dele” – passam por discussões e outros problemas no casamento, talvez isso seja um jeito de dizer que o “nosso jeito” de se relacionar também não é infalível. Durante o longa, Kumail apresenta um monólogo nos palcos sobre ser paquistanês, é evidente que ele sente orgulho de suas raízes mesmo que tente afrontar os pais para poder seguir também os costumes norte-americanos, para que ele possa se relacionar com uma garota que não seja paquistanesa e que não siga o islamismo sem ser excluído de sua própria família, mas o filme deixa bem claro que o que ele quer é uma união dessas duas realidades, uma cultura não é superior à outra, apenas diferente.
Em um diálogo do personagem principal com Terry e Beth entendemos que viver uma relação que não é completamente aprovada pelos pais e pela família é algo que pode acontecer com todo mundo, independente do contexto, e que de um jeito ou de outro a família deve sempre vir em primeiro lugar para que as desavenças sejam superadas, as escolhas precisam ser respeitadas. E essa é uma mensagem que se sobressaiu ao romance da trama para mim.
Doentes de Amor não é nenhuma revolução das comédias românticas, é previsível e preso às convenções e à estrutura do gênero, mas não por isso deixa de ser uma história genuinamente cativante e encantadoramente genuína. Kumail e Emily formam um casal carismático e é muito prazeroso torcer por eles, a melhor parte é que depois que o filme termina podemos continuar a torcer para que eles sejam felizes para sempre.
Roteirista e podcaster bacharel em Cinema e Audiovisual. Ex-potterhead. Escuta música triste pra ficar feliz e se empolga quando fala de The Last of Us ou Adventure Time. É viciado em convencer as pessoas a assistirem One Piece, apreciador dos bons clássicos da Sessão da Tarde e do Cinema em Casa e, acima de tudo, um Goonie genuíno.