Nos anos 2010 o terror deu passos ambiciosos e várias tendências foram se formando e se consolidando até hoje. Em algum lugar, o que se está em evidência são filmes de terror que se levam bastante a sério e que tem pretensões consideráveis, muito diferente da onda slasher do final dos anos 90/início dos anos 2000. O que A Morte Te Dá Parabéns (Happy Death Day, 2017) faz é reviver os códigos do slasher, misturando com o conceito nada novo no cinema americano de reviver um mesmo dia várias vezes, vide Feitiço do Tempo (Groundhog Day, 1993), e até mesmo o recente Antes Que Eu Vá (Before I Fall, 2017). Uma mistura que tinha uma grande possibilidade de dar errado, mas que aqui funciona ao ponto de levar o filme para um patamar acima da média.
No filme de Christopher B. Landon, escrito por Scott Lobdell, a protagonista é uma universitária chamada Tree, que em seu aniversário tem um dia excepcionalmente ruim, que culmina em seu assassinato. O que ela não esperava era que, ao morrer, ela voltaria para aquela mesma manhã, na mesma hora em que havia acordado. Então, Tree passa a entender que está vivendo o mesmo dia, retomando os mesmos eventos, e que de uma maneira ou de outra será assassinada pela mesma pessoa. A partir desta tomada de consciência da personagem é que o filme começa a ganhar camadas cada vez mais interessantes, fazendo com que ele percorra caminhos não muito esperados – ao menos para o público de hoje.
Acredito que o filme se venda propositalmente como terror tanto por ser época de Dia das Bruxas – a melhor fase para o gênero –, quanto por beber diretamente da fonte de alguns filmes – a comparação com o icônico Pânico (Scream, 1996), de Wes Craven, é inevitável. Isso só não soa mal para o filme porque ele é bastante autoconsciente disso, mas o que encontramos na realidade é uma mistura de gêneros que para você que está lendo este texto pode parecer uma bagunça, mas que funciona. Tudo bem que nenhum gênero cinematográfico é exatamente puro, mas A Morte Te Dá Parabéns mais parece em uma revisão final como um híbrido bem misturado entre thriller, comédia e um filme da Sessão da Tarde – da melhor forma possível.
A vantagem de não exatamente se levar a sério demais é que isso dá vazão para que essas experimentações de gênero, até mesmo de dramaturgia, se desenvolvam de uma forma orgânica e pouco forçada. O filme é feito como uma homenagem a esses filmes de terror da primeira metade dos anos 2000 de forma divertida, e isso transparece claramente em momentos que a protagonista decide reagir às situações que lhe são impostas. A melhor parte é que o filme faz tudo isso de forma despretensiosa, mas não abre mão de gerar uma narrativa interessante e que instigue o espectador, o que certamente o coloca em meio das melhores experiências cinematográficas do ano.
A Morte Dá Parabéns certamente não é o melhor filme do gênero, muito menos o primeiro a representa-lo de forma cômica, mas tudo o que ele propõe, até seu humor irreverente, é feito de uma maneira tão genuína e honesta que é impossível de não colocá-lo acima da média. É um filme que diverte não só pela comicidade, mas por ser instigante e sempre deixar o espectador tenso e atento pelo que vem a seguir. Uma vez que você deixa de esperar grandes momentos do filme e passa a aproveitá-lo pelo que ele é, não tem volta. Sair desse filme com um sorriso de satisfação talvez não seja o que você esperaria à primeira vista, mas provavelmente é o que irá acontecer.
Graduado em Cinema geminiano com ascendente em escorpião. Conhece muito de tudo, faz de tudo um pouco. Fã de carteirinha de Xavier Dolan, John Green e Steven Universe. Leitor inveterado, Ilustrador, escritor e atrasado para tudo.