Um pouco tarde para a festa, O Rei do Show é exatamente o que se propõe a ser: um show, um espetáculo, mas que derrapa ao tentar trabalhar com temas que fazem parte da nossa contemporaneidade, como a luta das minorias – algo já trabalhado em exaustão pelo menos nos últimos cinco anos. O longa de estreia de Michael Gracey quer contar a história de P.T Barnum (vivido aqui por Hugh Jackman), um personagem real, o homem que revolucionou o conceito de entretenimento, trazendo à vida o que possivelmente conhecemos hoje como circo – com uma grande tenda de listras vermelhas e brancas. A proposta é acompanha-lo desde quando era um pobre filho de alfaiate, até sua ascensão como um “showman” propriamente dito, passando por seu romance com Charity (Michelle Williams) e seu relacionamento conturbado com a sociedade que nunca lhe aceita de fato.
A trilha sonora se mantém praticamente a mesma ao longo do filme. As mesmas progressões, mesmos sentimentos e com letras similares. Ainda bebe diretamente da onda de incluir Hip Hop e R&B em musicais, que se mostrou efetiva no grandioso musical “Hamilton”, de Lin-Manuel Miranda. Mas isso não se torna um grande problema quando todos os números musicais são realizados para serem grandiosos, por mais simples que possam ser. O maior mérito do filme é como transforma cada música não só para um desenvolvimento narrativo, mas para criar números intensos e de uma qualidade impecável, tornando cativar o público uma tarefa não muito difícil. E esse lugar é justamente o onde o filme cresce, se deixando usar e abusar de efeitos de transição, coreografias grandiosas. Em “A Million Dreams”, a primeira e talvez a melhor performance do filme, é quando o filme joga na sua cara suas pretensões: ele quer entreter, ele quer dar um frio na barriga e lhe emocionar. A música, que constantemente retorna para o filme, evoca esses exatos sentimentos, da forma mais efetiva possível.
Os maiores méritos param por aí quando percebemos que tudo o que sobra para além dessas performances são um roteiro superficial e apressado, deixando tudo com uma sensação de que, bom, foi tudo meio que feito às pressas. Não tenho dúvidas de que P.T. Barnum possa ter sido uma pessoa cativante e com uma grande história, mas infelizmente o filme peca em mostrar isso. Isso é até previsível logo no começo do filme, quando percebemos o quanto que durou algumas performances, e olhamos para a minutagem do filme, com apenas 105 minutos – algo um pouco compacto para um musical com grandes pretensões. É decepcionante ver a rapidez com que o filme se desenvolve depois de sua metade. Vários conflitos são apresentados, mas nenhum tratado de forma concreta, o que acaba gerando um sentimento conflitante de que certas coisas deveriam ser emocionantes, mas acabam não sendo só porque não há uma oportunidade para que elas sejam exploradas.
As consequências desse roteiro é que quando ele tenta abordar assuntos mais sérios como traição, desigualdade e luta pela diferença, tudo soa extremamente batido e mal aproveitado. Se comparado a outros musicais – do teatro à tv – isso tudo fica ainda mais evidente, já que podemos perceber alguns chavões já usados à exaustão nos últimos anos, principalmente quando o tema é desigualdade. O que me causou certo desconforto foi que o filme, além de ser sobre a vida de Barnum, se propunha a falar sobre um grupo de pessoas marginalizadas pela sociedade que se unem para formar um show grandioso, mas isso acaba sendo pouco explorado pelo filme, e pior: quando é, é feito de forma completamente genérica. É triste, pois imagino que o filme poderia crescer muito bem com esse núcleo sendo mais desenvolvido.
No saldo final, O Rei do Show talvez seja um dos filmes mais bonitos e cativantes desse ano. Com suas performances grandiosas e com personagens divertidos, ele acaba sendo um bom filme para ver nesse fim de ano por evocar um bom sentimento de esperança e fascínio, próprio dessa época. Você verá performances cativantes, e um bom final feliz, dando ao público algo para sair suspirando ao fim da sessão. Apesar dos pesares, o filme é muito bom em entreter, e mostra isso do início ao fim.
Graduado em Cinema geminiano com ascendente em escorpião. Conhece muito de tudo, faz de tudo um pouco. Fã de carteirinha de Xavier Dolan, John Green e Steven Universe. Leitor inveterado, Ilustrador, escritor e atrasado para tudo.