O filme Atômica (Atomic Blonde, 2017) tem direção de David Leitch, que foi co-diretor de um dos melhores filmes de ação da última década, De Volta ao Jogo (John Wick, 2014). Só essa informação referente ao trabalho anterior do diretor fez com que as minhas expectativas sobre Atômica estivessem grandes. Essas expectativas aliadas ao trailer de tirar o fôlego ao som de Sweet Dreams fez com que o filme se torne um dos mais esperados do gênero espionagem/ação. Infelizmente isso não se cumpriu, por uma série de fatores que vão desde um roteiro confuso e previsível até falta de empatia pelos personagens.
Primeiro ponto de se tocar aqui é a falta de ritmo que o filme possui, as constantes voltas a sala de interrogatório em meio as cenas de ação acabam se tornando um tiro no pé do filme, o que veio para ser um diferencial, acabe se tornando um fardo, fazendo com que constantemente pegasse me perguntando se faltava muito para o final da sessão.
As personagens não são desenvolvidas, não temos um background, elas são terrivelmente mal escritas, planas e sem perspectiva de mudança dentro da narrativa, não há um fato que nos faça se apegar a personagem principal, nenhuma ligação que gera empatia ou que nos faça torcer por ela. A única parte que chega a se aproximar disso é quando a agente francesa é morta, mas umas duas cenas depois, isso já foi esquecido. Além disso, a única atriz que merece destaque nesse filme é a Charlize Theron que claramente se esforça (fisicamente inclusive) para entregar uma personagem crível dentro desse universo. O resto das atuações são caricatas e esquecíveis no final do filme.
Além disso o roteiro, por conta dos flashbacks e flashfowards que cortam a ação, é confuso e óbvio podendo ser facilmente decifrado no meio do filme. O público é preparado constantemente para o desfecho toda vida que algum personagem fala: “não dá para confiar em ninguém nessa cidade”, esse argumento foi repetido pelo menos umas sete vezes durante o filme tirando qualquer possibilidade de uma virada interessante no final.
O uso da música dos anos 80 poderia ser um recurso interessante se tivesse sido usado de forma correta, há pouco menos de um mês tivemos Em Ritmo de Fuga (Baby Drive, 2017) que usa o elemento sonoro de forma primorosa, utilizando a batida da música para dar ritmo ao filme. Já em Atômica, a música aparece apenas como pano de fundo para sequências de ação ou apresentação de personagens o que faz com que o filme ganhe um ar de clipe gigante.
Contudo nem tudo é ruim no filme, as poucas cenas de ação são bem dirigidas e coreografadas, há um claro trabalho de corpo da Charlize Theron para as lutas e tiroteios, o que dá ao filme um charme e o diferencia da maioria dos filmes de ação. A cena de maior destaque para mim é uma luta que acontece atrás de uma tela de cinema, na qual os personagens estão envoltos em uma penumbra e se torna quase uma luta de sombras. O plano sequência (para quem me conhece sabe que eu amo esse tipo de plano) está completamente fora de contexto aqui, é utilizado apenas por um fetichismo visual e ainda muito mal executado com a câmera colada na personagem e girando muito, tornando assim confuso em algumas partes, talvez esse recurso pudesse ser melhor aproveitado se a câmera tivesse um distanciamento maior e pudêssemos contemplar a ação por completa e não vários vultos e giros de câmera.
Atômica tinha tudo para ser um dos melhores filmes de ação do ano, mas sua soberba de se levar a sério demais fez com que ele nem fosse um bom filme de espionagem e nem um bom filme de ação. Por momentos parece que o filme tem vergonha desses gêneros e procura um distanciamento, quando o natural seria abraçá-los e desenvolvê-los.
Atual Vice-presidente da Aceccine e sócio da Abraccine. Mestrando em Comunicação. Bacharel em Cinema e formado em Letras Apaixonado por cinema, literatura, histórias em quadrinhos, doramas e animes. Ama os filmes do Bruce Lee, do Martin Scorsese e do Sergio Leone e gosta de cinema latino-americano e asiático. Escreve sobre jogos, cinema, quadrinhos e animes. Considera The Last of Us e Ocarina of Time os melhores jogos já feitos e acredita que a vida seria muito melhor ao som de uma trilha musical de Ennio Morricone ou de Nobuo Uematsu.