Spoilers moderados de “You” abaixo
Quando o seriado You (2018 – 2025) estreou há sete anos atrás na emissora Lifetime e posteriormente resgatada pela Netflix a partir da segunda temporada, onde se tornou um fenômeno de audiência, muito se questionou se a série estava romantizando a figura dos serial killers na forma como a história era contada pelo ponto de vista de Joe Goldberg (Penn Badgley), que seduzia e matava diversas vítimas sem nenhuma punição.
A verdade é que a série criada por Greg Berlanti e Sera Gamble tentava mostrar como funcionava a mente distorcida de um assassino implacável trazendo a narração em off pela sua visão em relação aos relacionamentos e as pessoas que julgava de má índole, nunca se incluindo nesta equação.
Por cinco temporadas You foi um seriado bem desenvolvido que se apoiou em tramas envolventes e reviravoltas absurdas e as vezes até implausíveis para entregar um entretenimento que na maioria das vezes conseguiu capturar a atenção do expectador. Porém será que o público realmente entendeu a crítica da série?
Durante quatro temporadas vimos Joe se apaixonar por diversas mulheres e matar sem pensar duas vezes quem atravessasse seu caminho. A quarta temporada, quando o personagem vai para Londres atrás de sua amada Marienne Bellamy (Tati Gabrielle), após matar sua esposa Love Quinn (Victoria Pedretti), antes disso outras tantas incluindo uma das suas primeiras vítimas Guinevere Beck (Elizabeth Lail), foi uma tentativa de a série não soar repetitiva e não se desgastar.
Ainda que esta tentativa tenha sido bem sucedida, principalmente por introduzir personagens como Nadia Farran (Amy-Leigh Hickman), Phoebe (Tilly Keeper) e a bela Kate Galvin (Charlotte Ritchie) com quem Joe se casa no final da temporada e retorna a Nova York, se viu um desgaste que seria inevitável a Netflix não perceber, fazendo com que a locadora vermelha renovasse a série para uma última temporada.
A quinta temporada seria uma oportunidade para os criadores terminarem finalmente de contar a história de Joe e companhia. Pessoalmente, confesso que meu maior receio, após tantas vítimas e com Joe sempre arranjando um jeito de escapar de todas as acusações ileso, traria um final que não conseguiria satisfazer nosso desejo de justiça por tudo que o personagem fez durante toda a jornada da série.
É desta forma que este ano derradeiro de You, que estreou no dia 24 de abril com mais 10 episódios, totalizando cinquenta para finalizar uma trama que poderia em muitos aspectos cair no velho clichê de fechar da forma mais previsível possível. Porém, para a surpresa de todos, esta temporada conseguiu finalizar de uma forma surpreendente, usando uma arma inesperada: criticar o próprio público da série.
Veja bem, a série começa sua premiere, The Luckiest Guy In NY (5×01), mostrando Joe e Kate vivendo um conto de fadas em Nova York, ela uma rica empresária, popular e filantropa, ele um cavaleiro de armadura, sempre apoiando a esposa e servindo como um dos maridos mais cobiçados da metrópole. O passado de Joe foi simplesmente apagado, bem como todas as suas supostas acusações em Londres, com total cumplicidade de Kate, que assumiu o filho de Joe com Quinn como seu, mesmo o garoto criando um laço com o casal gay, com quem o Joe tinha deixado no final da terceira temporada.
Estava tudo perfeito, mas Joe é um assassino, não se contenta com pouco, logo o casamento entra numa espiral de desgaste e é aí que a narrativa do novo ano ganha fôlego. Os episódios Blood Will Have Blood (5×02) e Impostor Syndrome (5×03) servem como introdução da misteriosa Bronte (Madeline Brewer) que invade a antiga loja de livros de Joe, Moone’s, acabando por atrair sua atenção revelando atração mútua entre ambos.
A trama usa a briga familiar dos Lockwood pelo controle da empresa para movimentar a história, com Kate tentando se firmar como CEO enquanto sua irmã Reagan (Anna Camp), junto com seu tio tentam derruba-la a qualquer custo. Outros personagens como a outra irmã de Kate, Maddie (Anna Camp), gêmea de Reagan, Teddy (Griffin Matthews), irmão adotivo das irmãs, além do marido de Reagan, Harrison (Pete Ploszek) ajudam a compor o resto do elenco.
O fato é que este começo de You é basicamente um repeteco do que a série sabe fazer bem, familiarizar o expectador e nos atrair com uma história envolvente. Ao contrário da quarta temporada, que demora um pouco para engatar, a quinta é mais imediata ao trazer mortes inusitadas desde o começo e moldar a narrativa para algo que finalmente comece a deixar Joe sem saída.
O episódio My Fair Maddie (5×04) trabalha bem esta mudança de perspectiva ao encurralar o protagonista e fazer outros personagens acordarem para ameaça que Joe representa. Porém é no episódio Last Dance (5×05) que a série mostra a que veio, ao expor o assassino de uma forma genial conseguindo fazer uma crítica pontual sobre espetacularização da barbárie e como as redes sociais influenciam na redenção ou na condenação de uma pessoa, seja ela inocente ou culpada.
O debate que os roteiristas de You trazem à tona na reta final da série é de uma genialidade que ajuda não só a colocar os expectadores para pensar, como também expõe um problema atual da geração Z que vai de 8 a 80 na forma como consegue destruir na mesma intensidade que faz uma figura pública brilhar nos holofotes.
À medida que o seriado vai bebendo desta fonte, a série ganha ritmo, entregando ótimos episódios como The Dark Face of Love (5×06) e o excelente #JoeGoldberg (5×07), este último, inclusive, embasa tudo que mencionei no parágrafo anterior e ainda entra num caminho espinhoso de mostrar para o público a verdadeira natureza de Joe ao trazer personagens conhecidos das temporadas anteriores para um julgamento final.
A série aproveita este turbilhão narrativo para mostrar como assassinos conseguem ser persuasivos em esconderem sua verdadeira personalidade por trás de traumas, numa carapaça que faz com se torne armadilha para mulheres vulneráveis em busca de um amor e que acabam não vendo a figura misógina com quem estão se relacionando. Esta representação vem através da personagem de Bronte.
Aliás, o elenco é um dos pontos altos desta temporada, além da ótima Charlotte Ritchie no papel de Kate Galvin, temos o retorno de Amy-Leigh Hickman como Nadia e a participação mais que vinda de Tati Gabrielle no papel de Marienne, que entrega um dos diálogos mais sensatos e pontuais de toda a série mostrando a síntese de figuras como Joe.
De todas citadas, os dois grandes destaques ficam por conta de Penn Badgley no papel de Joe, o ator está melhor do que nunca, carismático e assustador na mesma medida, principalmente nos últimos episódios. Madeline Brewer é outro grande destaque que consegue entregar tudo aquilo que necessitávamos de uma personagem que é atraída pela teia de Joe, mas que vê a luz da claridade se tornando figura central para sua queda.
Falando neste desfecho, o episódio Trial of the Furies (5×09) é um dos episódios mais satisfatórios de toda série, daquelas catarses narrativas que esperávamos por anos e de longe o melhor da temporada. O segundo melhor é o episódio Finale (5×10), que sem rodeios finaliza a série com uma nota alta da forma correta que o expectador espera, se ele realmente entendeu o objetivo da série.
E será que o público realmente pegou a crítica? O último episódio de You é a coroação de cinco temporadas impecáveis que mostraram uma série envolvente que por mais que tenha ressalvas, conseguiu entreter e trazer características de seriados que sabem empolgar com ótimos ganchos e personagens bem desenvolvidos.
A última cena com uma fala em especifico joga a bola para o público que está assistindo, a crítica está exatamente ali, não estamos diante de uma vítima e sim de um assassino, e espero que os expectadores tenham entendido o recado dos criadores, não se pode romantizar atrocidades, não se pode romantizar quem comete crimes hediondos, nós temos o poder de fazer o certo em meio a banalização de mortes e misoginia que assolam nossa sociedade, só não podemos transformar isto em espetáculo midiático que beneficiem malfeitores e transformem vítimas em culpados. E nisto a série acerta muito em questionar, finalizando com um tiro certeiro.
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Round 6: 2ª Temporada – Mantendo excelente ritmo e qualidade na escrita

Engenheiro Eletricista de profissão, amante de cinema e séries em tempo integral, escrevendo criticas e resenhas por gosto. Fã de Star Wars, Senhor dos Anéis, Homem Aranha, Pantera Negra e tudo que seja bom envolvendo cultura pop. As vezes positivista demais, isso pode irritar iniciantes os que não o conhecem.