Depois de um longo hiato de quase 3 anos, a Amazon Prime trouxe de volta a série animada Invencível (Invincible, 2021 –). Uma difícil tarefa de manter a qualidade da temporada anterior, mesmo depois de tanto tempo, e de segurar a audiência, ainda que essa temporada tenha sido dividida em 2 partes – com uma distância e 3 meses entre elas.
Seguimos acompanhando a vida e os dilemas de Mark Grayson (Steven Yeun), o herói que dá nome à série, que é um “híbrido” de terráqueo (por parte de mãe) e viltruviano, raça do planeta ao qual seu pai pertence. Entre esses dilemas, os esforços divididos entre ser um adolescente normal e tentar tocar o namoro e a faculdade em paralelo à vida de super-herói. Além disso, provar para si e para o mundo que, apesar de ser filho do Omni-Man (J. K. Simons), o maior herói e, ao mesmo tempo, o maior traidor da raça humana, ele não seguirá os passos do pai.
Nesse meio tempo nós também somos apresentados às tramas dos personagens secundários que têm histórias tão interessantes quanto a de nosso protagonista. Seja a Eve Atômica (Gilliam Jacobs), que não quer resumir seu heroísmo a derrotar bandidos, mas fazer verdadeira diferença na vida das pessoas, seja a equipe dos Guardiões Globais que, em sua inexperiência, sofre baixas o tempo todo, triunfa de maneira capenga em suas missões e ainda se desentendem como amigos e parceiros de romance.
Tudo isso envolto em muito sangue. Sempre!
Invencível é sobre adolescentes, mas é para adultos
Talvez uma de suas características mais marcantes seja o conteúdo gore que a animação apresenta. É claro que, se você acompanha este site, ou mesmo os textos que escrevo, ou se, simplesmente, você é um desses adultos que ama animações, você já deve saber que nem todo desenho animado é para crianças. Isso não é uma questão.
O que talvez seja importante pensar é que Invencível tem muito mais camadas do que simplesmente “sangue e cabeças explodindo”. Mas pode ser um problema que, no seu primeiro episódio, de sua primeira temporada, esse seja o fator que mais chama atenção. Porque, isso, certamente, pode causar uma impressão errada.
De fato, se você continuar por causa disso, você não vai se decepcionar. Não falta criatividade quando se pensa em como a vida de super-herói pode não ser tão glamurosa como a gente vê nos quadrinhos da Marvel e da DC, onde quase ninguém morre ou, se morre, certamente voltará algumas edições mais tarde, caso seja um personagem importante demais pra continuar morto.
Mas os quadrinhos de Robert Kirkman e Cory Walker vão muito além disso ao colocarem em perspectiva adulta e, na medida do possível, realista, as vidas de pretensos heróis que são jovens demais para assumirem tanta responsabilidade. E essas dores são demasiadamente pesadas para essas pessoas – e acabam se tornando para nós, como expectadores, de acordo com a empatia e identificação que desenvolvemos com eles.
Portanto, não se engane: não é uma “Malhação” com superpoderes. Na maior parte do tempo é chocante, dolorido e trata de temas como depressão, luto, senso de dever e responsabilidades familiares. Inclusive, faz isso de maneira melhor e mais aprofundada nessa segunda temporada.
O herói que é vilão, mas é herói
No caso de, assim como eu, você ser um leitor antigo de histórias em quadrinhos, esse tema certamente não será novidade pra você. Todos conhecemos Magneto, Hera Venenosa e Arlequina, Soldado Invernal, Feiticeira Escarlate e tantos outros personagens que trafegam entre serem, ora mocinhos, ora vilões. Em Invencível, é a figura do Omni-Man que tenta confundir nossas sensações.
Ora pois, se terminamos a primeira temporada odiando o vilão pelo assassinato de seus companheiros de equipe e pela surra que ele dá em seu filho, na segunda temporada a animação nos põe em xeque! Depois de descobrir para onde o pai de Mark foi quando fugiu da Terra, nós conhecemos um redimido Nolan Grayson, que formou uma nova família e pede ajuda ao filho para consertar as coisas.
Redenção que é duramente retaliada pelos outros de sua espécie, quando estes descobrem que Omni-Man não cumpriu sua missão de subjugar a Terra. E é nesse ponto da trama que trabalhamos nossa capacidade de julgamento. Há uma mistura de emoções quando a gente pensa que Nolan precisa pagar por todos os seus crimes, ao mesmo tempo que não queremos vê-lo morto, uma vez que só ele pode proteger nosso planeta daqueles a quem ele serve. Eu, particularmente, não o perdoei. Mas entendo o esforço do roteiro para inserir essa dubiedade e tentar nos mostrar que nada na vida é simplesmente preto ou branco. E que as pessoas são complexas, inconstantes e aptas a mudar seus pensamentos quando isso envolve as pessoas que elas amam.
Mas, às vezes, o choque é pelo choque mesmo
Ainda assim, não se torna impossível pensar que, às vezes, algumas coisas poderiam ser amenizadas. Não sou contra violência gráfica, que fique claro. Só fico pensando na necessidade, ou no que acrescenta, determinados takes que, vez por outra, parecem que estão lá apenas pra fazer a audiência se contorcer.
Afinal, seria mesmo tão impossível assim se sensibilizar com determinadas mortes, caso elas não fossem tão graficamente impactantes? Eu posso entender que essa pode ser uma característica essencial da série. Mas, ao menos para mim, soa como uma artimanha sorrateira para manter o espectador atento. Como se nos dissesse “cuidado, algo horrível está sempre prestes a acontecer!”
Desnecessário! Em uma segunda temporada, já não é surpresa para o público que ninguém está imune. E isso se constata, mais uma vez, quando dois dos mais carismáticos personagens de Invencível são mortos do nada! Não apenas é cruel, como é grotesco e violento. Certamente um dos momentos em que mais me contorci em frente a TV. Não satisfeitos, a violência segue com ares de tortura física e psicológica, que culmina com um tiro seco na cabeça de um personagem.
Fica a pergunta: pra quê?
Invencível (T2) tem saldo positivo
Seja como for, Invencível faz bem seu trabalho. Supondo que consigamos passar ilesos por tanto sangue e tripas, o roteiro consegue intrigar, prender e ser imprevisível em todos os episódios. Não há um sequer em que não haja uma surpresa! Terminamos essa temporada sem cansaço e imaginando o que mais pode acontecer até o final da história. Como não li os quadrinhos originais de onde a série foi tirada, fico sempre dando pequenos pulinhos no meu sofá e levando as mãos até a boca.
Existem algumas pequenas falhar nas animações de movimentos e com bastante aproveitamento de cenas estáticas. E, veja só, nem isso passou ileso pelos criadores, uma vez que, em determinado episódio, a própria série tira sarro disso. Mesmo assim, é muito mais um preciosismo de gente chata do que algo que estrague a experiência.
O que, pra mim, é o maior dos empecilhos, é o caráter “capitulesco” da animação, como se tentasse fechar cada episódio em sua própria trama, mas deixando pontas soltas como ganchos. É como se fossem vários pequenos arcos que fazem a gente esquecer o arco maior. Na verdade, é um jeito de cozinhar a audiência. Seria um problema se esses arcos impedissem a história de andar, ou fossem indiferentes para a evolução dos personagens. Felizmente, não é o caso.
Terminei essa temporada satisfeito. Aguardo ansioso pela próxima que, a essa altura, já está completamente dublada. O aviso da Amazon Prime é que a espera para a próxima temporada será bem mais curta do que foi a espera pela segunda. Bom, oremos! Eu não gostaria de esperar novamente.
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Gay, Nerd, jornalista e podcaster. Chato o suficiente pra achar que pode se resumir em apenas quatro palavras. Fã de X-Men e especialista em Mulher-Maravilha. Oldschool – não usa máquina de escrever, mas bem que poderia. There’s only one queen, and that’s Madonna!