Neste segundo filme iniciamos com uma sequência da fuga de Grindelwald do MACUSA quando seria transferido para a Europa e logo percebemos que seu poder de persuasão é uma de suas maiores armas ao trazer um funcionário do Ministério, Abernathy (Kevin Guthrie) para seu séquito de seguidores. Após a fuga, une-se à misteriosa Rosier (Poppy Corby-Tuech) para dar continuidade aos seus planos de dominação bruxa.
E aqui temos o foco deste texto. A metáfora que Rowling cria entre o início do poderio de Gellert Grindelwald e a ascensão do Nazifascismo de Adolf Hitler na Alemanha e seus planos de expansão territorial e ideológica pela Europa é bastante clara. Inclusive as ideias sobre uma raça superior que deve subjugar outros povos “para um bem maior” coincidem entre a ficção do mundo bruxo e a realidade, como também a época em que ambos os eventos, o real e o fictício, acontecem são equivalente, findando com a derrota nazista em 1945, mesmo ano em que Grindelwald deve travar seu famoso duelo com Dumbledore. E até mesmo o figurino preto de Grindelwald lembra muito o uniforme da SS, o grupo paramilitar que era o braço armado do partido nazista alemão.
No entanto, apesar de alguns escorregões técnicos no roteiro, JK, como sempre, tem a sagacidade de não deixar a metáfora apenas no plano do passado e traz à tona uma discussão extremamente atual, o reaparecimento de ideias de uma direita ultraconservadoras, que muitas vezes flerta com a escalada assustadora de um neonazismo, baseado em preconceito de raça, gênero e classe. Esta retomada, que pôde ser claramente observada na Europa e nos EUA, mesmo antes do governo de Donald Trump, mais recentemente têm mostrado mais veementemente as caras aqui pelo Brasil, com o discurso de ódio e preconceito esbravejado aos quatro ventos pelo, agora infelizmente eleito, candidato Jair Bolsonaro.
O fascínio por uma ideia de mudança ou melhoria disfarçando a real intenção de retorno a um tempo onde as liberdades das minorias, a tanto custo conquistadas, ainda eram negadas são a palavra de ordem dos discursos tanto de Grindelwald como de Bolsonaro, claro que com os devidos diferenciais. Grindelwald se utiliza de um certo charme e calma para fazer nascer a paixão em seus seguidores, enquanto Bolsonaro parte para uma maior agressividade que desperta em muitos de seus fãs um impulso perigosamente violento. Mas o que ambos tem em comum é o disfarce de suas reais intenções. Nos últimos dias de sua candidatura Jair Bolsonaro percebeu que maneirar o seu linguajar preconceituoso seria mais vantajoso e o levaria a vitória mais facilmente, ajudado pela enxurrada de notícias falsas que tiveram vez em sua campanha. Assim, o então candidato passou a “tolerar” pessoas LGBT, negros e pobres (e nordestinos) tentando mudar a imagem hostil que havia criado para si até ali. Da mesma forma Grindelwald, que em sua adolescência, após ser expulso da escola de magia de Durmstrong, envolveu-se com artes das trevas na busca pelas lendárias Relíquias da Morte citadas no último livro da série, passa a portar uma má reputação na comunidade bruxa, mas mesmo assim, consegue voltar à tona, através de um discurso apaziguador onde deixa claro que sua intenção não é exterminar os trouxas ou no-majs, mas colocá-los em seu devido lugar de inferiores, onde seriam, inclusive, úteis como serviçais. Se vale, assim, da situação em que os bruxos precisam viver, escondidos, para não causarem o medo, e com ele, a intolerância e a raiva dos humanos não mágicos, como já havia sido apresentado no primeiro filme através da Sociedade Filantrópica Nova Salém, liderado pela mãe adotiva de Credence, Mary Lou (Samantha Morton).
Cineasta e Historiador. Membro da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema). É viciado em listas, roer as unhas e em assistir mais filmes e séries do que parece ser possível. Tem mais projetos do que tem tempo para concretizá-los. Não curte filmes de dança, mas ama Dirty Dancing. Apaixonado por faroestes, filmes de gângster e distopias.