Rose e Maria – Uma poesia de liberdade

Gostaria de iniciar este texto parabenizando a realizadora, Magi do Carmo, estudante do Curso de Cinema e Audiovisual da Unifor, pela coragem e abordagem de tantas temáticas delicadas em meio a um curta metragem. O curta lésbico aborda a relação das duas personagens título, interpretadas respectivamente por Amorfas e por Luiza Nobel, mulheres negras com uma bela amizade que, ao longo do filme é capaz de desabrochar como um romance sinônimo de libertação e parceria. A obra de 2024 ainda é uma entre algumas (não tantas quanto poderiam existir) onde temos uma travesti negra como lésbica, além de referenciar a importância cultural para a libertação de muitas mulheres negras e sapatonas afetadas pela existência da política e ativista assassinada em 2018 – Marielle Franco. É importante não só para mim, enquanto pessoa LGBTQIAPN+, mas a nível de escrita textual pontuar estas quatro mulheres no nosso início do texto para celebrar quanto mulheres negras no cinema são e sempre serão uma importante fonte de criação e multiplicação de histórias, no audiovisual, no jornalismo, em diversas linguagens artísticas.

Não haveria cinema sem mulheridades negras. Isso, para mim, não é um achismo mas uma certeza absoluta.

Magi do Carmo, realizadora de Rose e Maria.

Não estarei aqui abordando uma qualidade estética ou meramente técnica, mas sim a importância de como o cinema negro e feminino parte de lugares de afeto, de inquietações. Maria é uma mulher casada que vende sanduíches na praia e tem uma amizade com Rose, que na praia mora em sua van repleta de livros, responsável não apenas por incentivar Maria a ler, mas também por incentivar sua liberdade. A amizade entre as duas está lá, o romance está nas entrelinhas à medida que o filme começa, entre os olhares, os toques e a admiração uma pela outra. Outra lógica bem importante para os pontos positivos do curta é como aborda mulheres diferentes entre si, de diferentes lógicas de vida, diferentes visões de mundo e também diferentes visões de si mesmas e da outra. Mesmo trazendo o maior foco na libertação de Maria desta relação que a sufoca e oprime de formas extremas, o filme estabelece em sua pouca duração a personagem de Rose como essa figura politizada e militante, capaz de iluminar a vida de Maria a todo contato. Ambas as atrizes são ótimas em seus papéis, a naturalidade de Amorfas como Rose e a entrega de Luiza como Maria durante sua jornada caem como uma luva na obra.

O filme Rose e Maria se permite ser muitas coisas, algumas destas lutam às vezes para de encaixar numa obra de menos de vinte minutos mas, mesmo com isso é capaz de ecoar mensagens absurdamente importantes, mesmo em 2025. Magi do Carmo mostra em sua direção uma bela compreensão da importância de sua narrativa, atravessa por obstáculos reais de uma sociedade não apenas machista, mas também transfóbica e racista, criando em meio a esse mundo que oprime uma carta de libertação e amor negro e lésbico. Que Rose e Maria possa ser uma obra referenciada, estudada, sobre suas nuances sociais e relevância social, capaz de reverberar em diversos corpos em meio a uma sociedade. Parabéns não só a toda a equipe do filme, mas também à curadoria do festival For Rainbow pela inclusão de um filme cearense tão potente em meio a sua mostra nacional.


Este texto faz parte da cobertura do 19º For Rainbow – Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual e de Gênero, realizada pelo Só Mais Uma Coisa.


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