Morte no Nilo – Sem nenhum segredo

Agatha Christie foi uma das mais proeminentes escritoras de romances policiais da história, publicando mais de oitenta livros e se tornando um dos nomes mais populares da literatura mundial, merecendo ainda em vida a alcunha de Rainha do Crime. Christie criou, entre suas várias obras, alguns personagens que ganharam fama desvendando crimes os mais mirabolantes possíveis, e entre estes está o detetive Hercule Poirot. Muitas de suas obras, entre elas as aventuras do detetive belga, ganharam adaptações para o cinema e para a TV, já que o formato de sua narrativa sempre coube bem no equivalente do gênero no audiovisual, os filmes de crime e investigação sempre foram bastante populares ao segurar a curiosidade do público e muitas vezes levando-o a tentar desvendar os mistérios junto com os personagens, desconfiando de tudo e de todos, com teorias e mais teorias para descobrir quem matou a vítima da vez.

Em 2017, com nenhuma surpresa, um clássico da autora entrou no radar do ator e diretor Kennet Branagh, habituado a comandar adaptações de clássicos da literatura e do teatro, e com um elenco bastante expressivo e o próprio Branagh no papel de Poirot, tivemos a sua versão de Assassinato no Expresso do Oriente (Murder on the Orient Express, 2017). O filme teve uma recepção bem acanhada, e acabou não trazendo grandes surpresas, deixando ao final uma última dica de que haveria um desejo do diretor em adaptar um outro clássico da Rainha do Crime protagonizado pelo famoso detetive bigodudo, e foi assim que neste ano de 2022 tivemos a estreia de Morte no Nilo (Death on the Nile).

Nesta nova “aventura” Hercule Poirot se vê envolvido em uma trama amorosa entre amigas que disputam o mesmo homem. Linnet Ridgeway (Gal Gadot) é uma riquíssima herdeira que está no Egito para comemorar o casório com Simon Doyle (Armie Hammer), antes noivo de sua ex-amiga Jacqueline de Bellefort (Emma Mackey), que os persegue desde então, como uma ciumenta sombra sempre a espreita para melar os planos do casal. Entre alguns convidados, amigos do casal, empregados, parentes e antigos amores, Poirot acaba em uma luxuoso barco onde todos farão um percurso no grandioso Rio Nilo junto à lua de mel dos recém-casados. Até que o já aguardado crime acontece e o detetive convenientemente presente novamente em um ambiente fechado e em movimento como no filme de 2017.

Para quem já está familiarizado com este tipo de narrativa, fica fácil descartar prontamente as suspeitas mais óbvias, logo todos os presentes são suspeitos (com uma estranha exceção à tripulação do barco, que existe, mas não são interpretados por atores importantes o bastante para serem suspeitos). Dali em diante vivemos uma sequência desritmada de descobertas de pistas e pretensas surpresas, acompanhadas de um monótono monólogo do presunçoso detetive que, mesmo após a deslocada cena inicial do longa, que parece sem sucesso querer nos dar informações sobre o passado do protagonista a fim de causar algum grau de empatia, deve ser o detetive mais sem carisma da história do cinema, praticamente repetindo sua personalidade do filme anterior.

Morte no Nilo é apenas uma repetição de seu predecessor, deslocando-se apenas o local da trama e os atores a interpretarem vítimas e suspeitos. A direção de Brannagh não nos traz nada de novo além de uma utilização morna da paisagem Egípcia (computador). O elenco é competente em sua maior parte, mas parecem presos a estereótipos que creio que nem mesmo Agatha Christie faria tão engessados e a resolução do mistério, apesar de satisfatória, não tem nenhuma força em sua conclusão. O fato é que a melhor adaptação recente de Agatha Christie continua sendo Entre Facas e  Segredos (Knives Out, 2019), que ironicamente não se baseia em uma obra da Rainha do Crime.


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