É isso que é The 100 (2014 -). Ou é melhor, é o que a série sabe ser. Se até semana passada a irregularidade da temporada estava inegável, aqui, no 7×08, fomos arrebatados por um dos melhores momentos de todo esse legado televisivo que acompanhamos por seis anos. A sensação de quando a produção utiliza o potencial que tem, é de tirar o chapéu. O calor não se compara; empolga e nos deixa vidrados por fazer parte. Sem dúvidas, Anaconda chegou ao fim imperando um gostinho de querer mais.
O vislumbre do que seria a junção das peças aqui, foi mostrado no polêmico Thirteen (3×07), aquele em que nos despedimos de uma personagem inesquecível: Lexa (Alycia Debnam-Carey). Apesar de ter sido uma fase de crescimento da mitologia, o episódio possibilitou a movimentada discussão que denunciou outras várias séries que matavam personagens LGBTQ+ e negros, assim perdendo o apreço do público (vide a avaliação da temporada no site IMDB), tal capítulo foi responsável pela narrativa sagaz de morte e vida. De início e fim. Enquanto Lexa emocionava com seus últimos minutos de vida, entendíamos como se deu a trajetória da primeira comandante: Bekka Pramheda (Erica Cerra). Brevemente, vimos sua chegada na terra pós-apocalíptica.
Em outra ponta, no 4×03 (The Four Horsemen), então conhecemos a figura de William ‘Bill’ Cadogan (John Pyper-Ferguson), o líder por trás do Segundo Amanhecer, culto que previa a chegada do apocalipse nuclear e prometia proteger aqueles que alcançassem os doze níveis do fundamento, e para despistar os que não conseguiram, construiu um bunker de fachada, salvando, então, apenas uma parcela da população. Ou seja, seus seguidores. Já em The Warriors Will (5×10) mais uma vez o tirano foi citado, quando através das memórias de Becca, na chama implantada na cabeça de Madi (Lola Flanery), sabemos que a pioneira foi queimada viva ao ter seus conhecimentos rejeitados por aquele que queria ser o único reconhecido e adorado pelos seus membros.
Dito isso, chegar no 7×08 é um triunfo. The 100 pegou esses três acontecimentos e nos cedeu uma nova perspectiva antes do que veio a ser o primeiro ataque nuclear, após e também outras cartas na manga. Para tal feito, voltamos 97 anos, de novo. Antecedendo o delicioso flashback, Bill foi finalmente apresentado ao nosso grupo, e, principalmente, a ela, ficando cara a cara com Clarke (Eliza Taylor). O que ele tanto quer com Wanheda, é o que não conseguiu com Becca: os últimos dois códigos para acessar a pedra. Assim, realizaria a transcendência que superaria um povo a fim de atingir a geração final. O encontro entre ambos foi uma mistura de tensões. Faz tempo que não apreciamos essa artimanha, combinando uma perigosa emoção de oposição. Clarke está se atualizando com o “novo” inimigo agora, mas atuou bem em prol da enrolação, conhecendo suas intenções para resgatar seus amigos. Tarefa que não será fácil, mas estamos só começando.
Agora, 97 anos antes (2052). Foi incrível como o episódio se mostrou um forte exemplo de quando uma trama sabe o que quer apresentar. Contando com personagens poderosos, encaramos de perto a sociedade que seguia e que também se rebelava ao líder Cadogan. Entre crer ou não, adaptar-se aos prenúncios de Bill só instaurou caos, uma vez que promovia a ideia de um povo ideal para adentrar ao espaço limitado do abrigo contra o Praimfaya. Com 80% ocupado para um número total de 1200, suas inclinações se mostraram duvidosas quando ainda priorizava o critério de doze níveis para merecer estar no bunker, fases essas que priorizava pessoas de alta classe. Ele estava certo sobre o apocalipse, daí a Anaconda, o código de segurança dele para quando as bombas nucleares fossem lançadas, mas seus princípios só causavam divisão.
Então chegamos ao núcleo familiar. A ativista ambiental e persistente Callie Cadogan (Iola Evans) é o principal motor que se opõe as ideias do pai: sendo sobrevivência o que está em jogo, será seu objetivo zelar. Mesmo com o apoio maternal de Gemma (Crystal Balint), as rachaduras surgem ainda mais graças ao irmão Reese (Adain Bradley), que, sem pensar duas vezes, se alinha aos pensamentos paternos, trazendo, então, uma discreta alusão ao trágico caso de Caim e Abel. Em um dado momento, Callie até expõe que nem apelando para as ordens extremistas do pai, Reese o agradará mais. Em apenas quinze minutos, fica claro que o afastamento de Bill para se dedicar às pesquisas e aprimoramento dos seletos membros, ocasionou no péssimo relacionamento entre ele e a filha, além da discordância dos irmãos. Até chegar o praimfaya. Trazendo o fogo consumindo todos os cantos em poucos segundos, foi o suficiente para demonstrar a destruição liberada por A.L.I.E 1, já que o ponto forte se concentrava no atrito social de sobrevivência no abrigo. Tendo espaço, por que não permitir mais pessoas? Mas se não ascendeu para o nível doze, não era aprovado.
Nesse meio, entre agradar e contrariar o pai, fica ali o desenho do conflito dos irmãos. Um jogo de superação que corrói suas motivações. Ambos individuais, mas que se atrelam ao preto e branco de tender para o lado ruim da coisa: a lealdade cega (de Reese) e a sobrevivência universal sem barreiras (de Callie). Além disso, Bill então apresenta seu tesouro achado que garante a exploração de outros planetas em nome da sobrevivência, a pedra da anomalia, com o adendo de que não sabe como decifrá-la.
Dois anos depois (2054), eis que tivemos mais de quando Becca chegou à Terra após fugir de Polaris e dar de cara com alguns membros do Cadogan, vestidos de trajes contra a radiação do praimfaya. Atiçando logo a admiração de Callie, não demora muito para a inteligência da cientista (que já tinha A.L.I.E 2 implantada na cabeça) incomodar Bill, em modo de cordeiro querendo extrair o necessário para seu projeto. Se ser a mente por trás da chama/chave, primeira comandante não foi pouco, Becca também destravou a pedra, e para pontuar ainda mais esse momento, ela omitiu de William os dois códigos restantes. O que é compreensível. Passar pelo perrengue com A.L.I.E 1 e depois se colocar como recipiente da segunda versão para não se desfazer do que acreditava, pensando no melhor jeito de assegurar o futuro da sociedade, não ceder para o líder fanático foi inteligente.
Nas últimas palavras de Becca, ela gritava sobre William afirmar que quer salvar seus membros, mas na verdade os levará para o fim. O que leva a crer que a dita transcendência se trata de sacrificar seus fiéis e constituir um novo corpo de seguidores. Não se sabe como, mas é questão de tempo para ele submeter Clarke ao m-cap, e então acessar as memórias que apontam para os códigos que procura — já que ele acredita que ela está com a Chama, quando descobrir que não, acredito que usará a tecnologia do m-cap e não vai achar nada, pois a última comandante foi Madi. Qual será a guerra vindoura?
Para evoluir Polis a Bardo sem sua família, enquanto permanecia numa cápsula criogênica, Bill passou por muitos seguidores, confiando em líderes como “Anders” para manter as diretrizes dos doze níveis e seguir a risca a busca por quem possui os códigos – o que deve ter possibilitado o m-cap, já que a Chama estava longe de suas mãos. Se foi capaz de deixar a esposa a mercê do perigo da radiação e abrir mão de se relacionar com a filha, um lado de sua máscara já está caída, a outra só aguarda mais caos.
Chegando na metade da temporada, The 100 cela o que precisava para engrenar sua fase final, apresentando o misterioso pastor desse culto de morte. O episódio foi rico e épico. Orquestrado devidamente para não dar todas as respostas, é certo que acompanharemos o desfecho de Clarke e companhia de forma dolorosa, com um gancho bem bolado do que este universo ainda pode entregar. Anaconda foi só a ponta do rabo da serpente, ainda precisamos chegar na cabeça!
Últimos comentários:
100: como foi o preparar de Bill para um ataque nuclear? Como Callie começou o idioma Grounder ainda criança se inspirando no latim? Como foi a transição de Becca após A.L.I.E 1 e a criação da segunda? Quem foi a segunda comandante? Como foram as passagens de Callie sendo a primeira guardiã da Chama? Pai vs Filha, um caçando poder e adoração e a outra salvar. Como se deu os primeiros clãs da terra?. Seria muito bom se a CW aprovasse o spin-off da série.
99: a protagonista já tem mais que fervor garantido. Iola Evans cativou demais na pele de Callie. Não deve demorar para estrelar outros projetos teens ambiciosos.
98: relembrar como Becca morreu — sendo a forma mandada por Bill para fazer a Chama sair da cabeça dela —, me fez entender porque Madi tem vislumbres de um culto: memórias de outras comandantes. É bem provável que ela se conecte mais com as lembranças de Becca e auxilie no fim de Bill.
97: a chave é Madi. Pobre Bill.
96: falando em coisa ruim, suspeito que alguma informação ainda irá vir sobre Shiedheda.
95: por um momento no final do episódio achei que Clarke atiraria na cabeça de Bill e partiria numa busca desesperadas por seus amigos. Ainda bem que nunca foi burra.
94: com certeza Bill vai ser informado onde Gaia e Bellamy estão e vai usar os sentimentos de Clarke para que ela ceda o tour por suas memórias.
93: que a partir daqui, The 100 não afrouxe sua narrativa. Faltam mais oito episódios. Sanctum precisa avançar no seu diálogo, pois em Bardo o bicho vai pegar. Até semana que vem!
Ama ouvir músicas, e especialmente, não cansa de ouvir Unkle Bob. Por mais que critique, é sempre atraído por filmes de terror massacrados. Sua capacidade de assistir a tanto conteúdo aleatório surpreende a ele mesmo, e ainda que tenha a procrastinação sempre por perto, talvez escrevendo seja o seu momento que mais se arrisca.