É complicado encerrar uma série sem algum tipo de desgaste, poucas séries são imunes a isto e normalmente este fato está atrelado a temporadas serem maiores ou menores e com muitos ou poucos episódios. How To Get Away With Murder (2014 – 2020) exibiu ontem seu “series finale” ou “final de série”, encerrando uma trajetória composta de seis temporadas e noventa episódios ao todo. É claro que este último ano foi marcado por um desgaste da fórmula, mas a série criada por Peter Nowalk e Shonda Rhimes conseguiu ao menos atiçar seu público do início ao fim neste último ano com boas reviravoltas e um episódio final no mínimo digno.
“Mulher, Negra e Bissexual”, estas foram as três palavras que Annalise Keating (Viola Davis) se definiu em algum momento deste último episódio durante suas considerações finais no julgamento que definiria sua vida para sempre. Essas palavras são chaves para entender como o último episódio do seriado explora o lado mais humano de sua protagonista exibindo suas melhores qualidades e características e como isto se torna vital para que o desfecho desta jornada seja satisfatório.
A sexta temporada foi bastante focada em Annalise sendo perseguida pelo FBI, a família Castillo e pela governadora Lynne Birkhead (Laura Innes), colocando seus antigos aliados: Michaela (Aja Naomi King), Connor (Jack Falahee), Laurel Castillo (Karla Souza), Oliver Hampton (Conrad Ricamora), Gabriel (Rome Flynn) e Nate Lahey (Billy Brown) no olho do furacão sendo usados como peças de manobra para colocar Keating atrás das grades por crimes que ela não cometeu.
Este último episódio é centrado exatamente no desfecho deste grande plano para pegar a protagonista numa conspiração perigosa, colocando Annalise Keating versus “O Sistema” num julgamento que teve seus altos e baixos, que nem sempre foi justo, mas que agora finalmente chegaria ao seu fim. O grande trunfo do episódio foi se apoiar exatamente na figura da advogada como mulher preta, forte, guerreira, que tem sim seus defeitos, mas que luta com afinco para provar sua própria inocência sendo a melhor na sua área.
A narrativa acompanha o julgamento em tempo real, enquanto usa os flashbacks (além de alguns flashfowards também) para mostrar alguns desfechos de personagens, ao mesmo tempo evidencia um plano sendo montado para que Annalise consiga contra atacar com argumentos no presente e assim derrubar seus algozes. O roteiro assinado pelo próprio Peter Nowalk, não traz grandes novidades, mas se apoia naquilo que deu certo na série, se preocupando em dar um fim coerente ao julgamento, enquanto em paralelo a trama é preenchida com elementos cruciais que servirão posteriormente para fechar a série como um todo.
Talvez a maior qualidade deste “series finale”, seja deixar que Viola Davis tome conta do espetáculo. Querendo ou não, Annalise Keating sempre foi um ícone de personagem e sempre foi o maior chamariz da série (Viola ganhou um Emmy por esta atuação), então foi justo a narrativa privilegiar a personagem focando no seu lado mais humano. Davis se mostra em plena forma, mesmo que o roteiro tenha esgotado suas frases de efeito durante seis anos, a atriz consegue tirar leite de pedra ao se mostrar sensível, apaixonante e extremamente eloquente nos seus argumentos no papel da advogada, mostrando que é impossível não torcer para que a mesma tenha um final feliz.
O terceiro ato de “Stay” foi guardado para surpreender e acredito que consegue isso em parte. Após o desfecho do julgamento, a trama ainda tem um último fôlego para trazer alguns momentos inesperados e eles funcionam, a morte de alguns personagens no processo, servem coerentemente para mostrar que nada na vida de Annalise vem fácil e que toda ação gera uma consequência, na verdade esse sempre foi o cerne de How To Get Away With Murder e isso é provado aqui mais uma vez.
Os outros personagens, como: Connor, Laurel, Oliver e Michaela, tiveram pouco tempo de tela, mas todos com desfechos bem definidos e todos atrelados ao resultado do julgamento. Enquanto os três primeiros conseguiram certa redenção, a última foi uma das que teve um final mais triste e isolado dos outros personagens, mas ainda assim conseguindo seus objetivos almejados. Nate finalmente viu a justiça ser feita, Tegan Price (Amirah Vann) teve um momento tocante e apaixonante com Annalise, mostrando uma boa evolução em pouco tempo de série. Bonnie (Liza Weil) e Frank (Charlie Weber) tiveram os desfechos mais interessantes, sem dar muitos spoilers, acredito que não teria como ser diferente, ambos os personagens sempre acabaram sendo usados como efeitos colaterais das tramas da série, aqui mais uma vez foram usados como trunfo de roteiro para atingir diretamente Annalise e em consequência impactar o público que acompanha o seriado.
De uma forma geral, este episódio ironicamente mostra que para escapar de um assassinato no final das contas é preciso sempre mostrar que você é uma pessoa íntegra, por isso funciona. A série sempre foi calcada nos termos técnicos das leis e como um advogado as usam a seu favor para livrar ou escapar de um crime, tudo isso amplamente discutido e usado por Annalise e seus pupilos, mas neste último episódio recorre ao clichê da boa índole humana para mostrar que no final das contas, se você for uma boa pessoa, a justiça sempre estará ao seu lado, mesmo que isso pareça impossível as vezes.
Longe de ser o que foi um dia, How To Get Away With Murder se mostra coerente e respeita tudo aquilo que construiu num episódio final em que todos os elementos que amamos na série estejam presentes sendo usados para dar ao público um desfecho respeitável. Talvez não surpreenda os mais exigentes, mas ainda assim o roteiro de Peter Nowalk merece elogios por colocar sua protagonista num pedestal e torná-la eterna como a personagem memorável que sempre foi. Os minutos finais podem soar bregas como uma novela, mas a última cena é uma bela releitura da primeira cena do piloto com Annalise, mas aqui trazendo uma participação surpresa que soa como um ótimo fechamento de ciclo e a preservação de um belo e lindo legado.
Engenheiro Eletricista de profissão, amante de cinema e séries em tempo integral, escrevendo criticas e resenhas por gosto. Fã de Star Wars, Senhor dos Anéis, Homem Aranha, Pantera Negra e tudo que seja bom envolvendo cultura pop. As vezes positivista demais, isso pode irritar iniciantes os que não o conhecem.