Eu sempre achei muito incrível como desenhos animados tiveram um força enorme na construção da minha personalidade. Sempre fui muito de ver animações, como toda ou quase toda criança e, como a maioria, nunca me contentava em vê-las apenas uma vez, mas repetia incessantemente (naquele época rebobinava a fita VHS) até o momento de devolver o filme na locadora e, como se não bastasse, na semana seguinte, era capaz de alugar o mesmo filme novamente. Por conta disso sei várias e várias falas de meus desenhos preferidos decoradas, mas além dos diálogos uma das coisas que mais me marcaram nessas animações foram as lições que elas traziam em seu desenrolar.
É algo que já é tradicional em animações infantis, e que, muitas vezes, se torna algo meio jogado de qualquer jeito, de uma forma rasa. Mas posso garantir que as lições que aprendi em muitos dos filmes que assistia (não só animações, mas alguns live actions também) levo até hoje para a vida e foram, em grande parte, responsáveis pela pessoa que sou e tento ser hoje em dia. Se eu for listar aqui o texto vai ficar enorme, são lições de amizade e companheirismo presente em várias (destacando Toy Story, Mogli: o Menino Lobo, O Gigante de Ferro e O Caminho Para o El Dorado), lições de humildade e compreensão (Aladdin, A Nova Onda do Imperador), lições de coragem e valorização de si mesmo (Hércules, Spirit), lições de família (Lilo & Stitch, Tarzan), a importante lição de aprender com o passado de O Rei Leão… enfim, são inúmeras as coisas que aprendi assistindo esse inocentes filminhos.
E fico muito feliz quando vejo, agora já como adulto, filmes recentes que mantêm essa tradição de dar boas lições para as crianças, e senti isso com muita força assistindo o bonito Abominável (Abominable, 2019), nova animação da Dreamworks Animation em co-produção com a Pearl Studio, dirigida por Jill Culton e Todd Wilderman.
Em algum lugar de Xangai, maior cidade da China, um ser grande e peludo foge de um laboratório e se esconde no terraço de um dos vários edifícios da cidade. Neste prédio vive Yi, uma adolescente que acabara de perder o pai e vive com a mãe e a avó, fazendo vários bicos no intuito de juntar dinheiro para fazer a grande viagem que planejava com seu pai antes deste falecer. A premissa do filme, daí em diante, é muito simples, Yi descobre que a criatura, que acaba se mostrando muito fofinha, foi capturada de seu habitat natural, no monte Everest, lá no Himalaia, a milhares de quilômetros de distância de onde estão, e decide levá-la de volta. A dupla acaba tento acidentalmente ajuda nesta jornada do animado Peng e do mauricinho Jin, primos que vivem no mesmo edifício de Yi.
E nesta jornada, onde ainda precisam despistar os responsáveis pela captura de Everest (como passam a chamar a criaturinha), aprendem várias das lições que citei acima presentes nos filmes da minha infância. O valor da amizade, a superação e o aprendizado com o passado, a humildade, e ainda uma pegada de cunho ambiental. E, por mais que possa parecer exagero, esse acúmulo de aprendizados acaba se encaixando na missão deste grupo de forma muito orgânica se mostrando bastante eficaz em um roteiro simples, e com a ajuda de personagens extremamente cativantes, fazendo desta jornada muito mais do que apenas uma aventura comum, mas uma daquelas aventuras onde a vida daqueles personagens muda para sempre, fazendo o pequeno expectador, público alvo do filme, certamente refletir sobre tudo que aquele simpático time viveu naquela uma hora e meia de filme.
Além destes importantes ensinamentos, que são o ponto alto do filme, sem dúvidas, o longa nos proporciona boas risadas em vários momentos de um humor leve e descompromissado típico dos filmes infantis. E ainda nos presenteia com um belo visual composto das incríveis paisagens em que os personagens vão transitando no caminho até a terra natal do monstrinho.
Abominável é um daqueles filmes em que podemos levar nossos filhos, sobrinhos, afilhados, etc, para ver e que acabaremos, nós mesmos, aprendendo várias lições preciosas e nos emocionando, como aconteceu várias vezes durante nossa infância, além, é claro, de proporcionar ótimas conversas com nossos pequenos sobre o que aprendemos.
Cineasta e Historiador. Membro da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema). É viciado em listas, roer as unhas e em assistir mais filmes e séries do que parece ser possível. Tem mais projetos do que tem tempo para concretizá-los. Não curte filmes de dança, mas ama Dirty Dancing. Apaixonado por faroestes, filmes de gângster e distopias.