Depois de quase dois anos de espera e dois anos depois do lançamento da versão bem sucedida da Disney de Mogli – O Menino Lobo (The Jungle Book, 2016), dirigido pelo diretor de Homem de Ferro (Iron Man, 2008), Jon Favreau, temos finalmente a oportunidade de conferir esta que é a quinta versão live action do universo criado por Rudyard Kipling, dirigido desta vez por Andy Serkis (Senhor dos Anéis e a trilogia Planeta dos Macacos) na aventura intitulada Mogli: Entre Dois Mundos (Mowgli, 2018)
Esta nova versão teve anos turbulentos entre mudanças constantes da data de lançamento, passando pela desistência da exibição nos cinemas, até cair nas mãos da Netflix, depois da mesma firmar uma parceria com a Warner Bros. (que financiou a produção) para exibição mundial em seu catálogo a partir do dia 7 de dezembro deste ano.
Mogli – Entre Dois Mundos chega cercado de curiosidade, não só por ser uma versão da mesma história já contada de forma exaustiva em produções da Disney e outros estúdios, mas porque a produção de Serkis prometia uma pegada diferente do que já tinha sido contado antes. Após assistir ao filme, percebi que há muito a se gostar nesta versão, é claro que não temos a magia Disney que encanta legiões de pessoas mundo afora, mas temos aqui uma versão mais suja e completamente mais próxima da versão literária de O Livro da Selva (The Jungle Book) do já citado autor Rudyard Kipling.
A história segue a mesma premissa já conhecida, no interior de uma selva na Índia uma família é brutalmente assassinada pelo tigre Shere Khan, restando apenas um bebê que é salvo por Bagheera, uma pantera negra que leva a criança em segurança para ser criada por uma alcateia de lobos, nasce assim à história de Mogli. A trama começa bem, pois possui um deslumbramento inicial (o visual é belíssimo) que nos leva a conhecer mais da convivência do pequeno garoto com os outros bichos da floresta.
O roteiro escrito por Callie Kloves estabelece muito bem como funcionam as regras da comunidade onde vivem lobos e outras espécies, neste momento fica claro como isso afeta diretamente Mogli (Rohan Chand) e seu amigo Bhoot (Louis Ashbourne Serkis), ambos considerados fracos, frágeis e diferentes dos demais, tendo que se provarem a todo tempo que são capazes de estarem naquele lugar. O enredo constrói paralelos interessantes sobre preconceito e bullying que fazem o protagonista se sentir um forasteiro entre aqueles que o criou.
O longa é feliz em estabelecer bem os personagens em seu primeiro ato, devo dizer que Bagheera (Christian Bale) é um dos que mais se destacam, ele tem uma figura paterna fundamental dentro da trama, mais evidente que Baloo (Andy Serkis) que tinha destaque nas outras versões com uma relação incrível de amizade com o garoto humano, mas aqui aparece bastante apagado e muitas vezes sendo até mais severo que o usual.
A cobra Kaa (Cate Blanchett) surge como uma figura mais mística e a narrativa parece se passar pelo ponto de vista dela, funcionando como os olhos da selva. Minha única ressalva aqui é a atuação de Rohan Chand como Mogli, que fica no meio termo, em cenas de ação ele se sai muito bem e nas partes que precisa mostrar um lado mais selvagem também, mas nas partes mais dramáticas, falta um pouco mais de emoção em suas expressões, em certos momentos ele parece um pouco travado e contido. O lado selvagem e perigoso do filme fica a cargo da figura de Shere Khan (Benedict Cumberbatch), um contraponto interessante para o crescimento de Mogli como personagem, um vilão que funciona como uma constante ameaça.
Neste aspecto Mogli: Entre Dois Mundos tem uma pegada bem mais madura e adulta, a narrativa não se contém quando tem que mostrar o instinto animalesco e a brutalidade da vida na selva, não só com o tigre Khan, mas outros animais também que se mostram um perigo constante para o pequeno humano. Porém, tudo isso é quase perdido quando a trama perde força na sua segunda metade, talvez a parte em que os humanos aparecem seja a mais fraca do filme, muito porque os personagens não são bem desenvolvidos e só servem como um paralelo para a narrativa inserir a divisão mental travada por Mogli, entre deixar a família selvagem e ficar com aqueles de sua própria espécie.
Essa divisão lidada pelo protagonista é acentuada pelo caçador vivido por Matthew Rhys, que apesar de não ser um vilão marcante, serve ao seu propósito dentro do contexto, aliás, uma das cenas entre ele e Mogli é um dos pontos altos do filme. No quesito produção, os efeitos visuais são bons, em alguns momentos podem parecer superficiais, mas em outros a expressão facial dos bichos são impecáveis devido a tecnologia de captura de performance. A fotografia é muito bonita e a direção de Serkis é bastante competente, ainda mais se tratando de seu primeiro grande trabalho em um blockbuster.
Mogli: Entre Dois Mundos no geral é um bom filme, não chega a ser espetacular, mas vale a pena pelo simples motivo de mostrar um algo a mais na história do menino lobo (você não verá nenhum animal cantando aqui), talvez seja um pouco violento para uma aventura infantil, mas é feliz em contrabalancear o mundo selvagem e o mundo humano, tanto em seus aspectos positivos, quanto em seus aspectos negativos, tudo isso servindo de dilema para Mogli aprender valiosas lições sobre família, sobre amizade, sobre aceitação e sobre o mundo, algo que nestes quesitos o filme acerta em cheio.
Engenheiro Eletricista de profissão, amante de cinema e séries em tempo integral, escrevendo criticas e resenhas por gosto. Fã de Star Wars, Senhor dos Anéis, Homem Aranha, Pantera Negra e tudo que seja bom envolvendo cultura pop. As vezes positivista demais, isso pode irritar iniciantes os que não o conhecem.