Em De Repente Uma Família (Instant Family, 2018) Sean Anders, diretor de filmes como Sex Drive: Rumo ao Sexo (Sex Drive, 2008), Este é o Meu Garoto (That’s my Boy, 2012) e Pai em Dose Dupla (Daddy’s Home, 2015), dá uma pausa em sua fábrica de comédias pastelão para trabalhar em um roteiro mais “feel good movie“.
O filme trata sobre o casal Pete (Mark Wahlberg) e Elle (Rose Byrne) que, após serem bem sucedidos em colocarem em prática seus planos de vida juntos, botando para frente um ótimo negócio de reformas de casas antigas, percebem que ainda há um vazio em suas vidas para ser preenchido. O casal, já na casa dos 30 anos, nunca tinha colocado em seus planos a ideia de terem um filho, e decidem que adotar uma criança seria uma ótima alternativa, já que ao mesmo tempo em que supriria uma necessidade dos dois ainda ajudariam alguém.
Assim, o filme, que é baseado em uma história real, já mostra sua intenção logo de cara: apresentar as dificuldades da situação em que o casal se coloca ao adotar, não uma criança apenas, mas uma adolescente de 15 anos, Lizzy (Isabela Moner) – uma faixa de idade que sabemos ter uma maior dificuldade de aceitação por pais adotivos – que, como se não bastasse, precisa estar junta de seus dois irmãos menores, Juan (Gustavo Quiroz) e Lita (Julianna Gamiz).
O filme é bastante competente em construir uma expectativa em sua primeira parte, quando Pete e Elle precisam passar por uma espécie de treinamento antes da adoção propriamente dita, e aqui a excelente química entre Mark Wahlberg e Rose Byrne é fundamental para que seus personagens cativem o expectador, mesmo que (e talvez por isso mesmo) compunham quase um estereótipo do pai meio bobão e super legal e da mãe mais controladora, mas igualmente simpática, muito vistos nesse tipo de filme, como por exemplo em Extraordinário (Wonder, 2017). Também fundamentais para o filme funcionar são as personagens de Tig Notaro e Octavia Spencer, espécie de tutoras e treinadoras de pais adotivos do abrigo, e que funcionam muito bem na lógica de “good cop, bad cop”, além do heterogêneo grupo de pais que se forma nesta fase e que irão se reencontrar em alguns momentos num grupo de apoio e acompanhamento durante todo o longa.
E chegamos ao ponto principal, as crianças. Enquanto a mais novinha, Lita, é mais espalhafatosa, Juan se mostra extremamente distraído e se colocando sempre na defensiva, e a mais velha, Lizzy se comporta como uma mãe substituta dos dois, o que é justificável já que a ausência da mãe biológica em sua criação, envolvida em tráfico de entorpecentes e atualmente presa, fez com que os pequenos precisassem estarem sempre unidos e cuidando uns dos outros. O trio de atores está muito bem e nos faz acreditar realmente que são irmãos, especialmente Isabela Moner, em quem sou capaz de apostar que terá um futuro como grande atriz (e possivelmente cantora, já que interpreta muito bem a música dos créditos finais do filme).
Desta forma, o filme consegue, com um excelente timing de humor na leveza certa, tocar em um tema tão importante e delicado, sem chegar ao ponto extremo de ser panfletário demais, alcançando inclusive outros temas mesmo que de forma periférica, como por exemplo o racismo, já que o casal é branco e as três crianças têm origem latina, ou a adoção por pais homossexuais, demonstrando uma preocupação com temas infelizmente ainda considerados tabus na sociedade e que precisam ser discutidos com urgência, especialmente no momento de alavancamento de um ultraconservadorismo retrógrado em que vivemos.
Cineasta e Historiador. Membro da ACECCINE (Associação Cearense de Críticos de Cinema). É viciado em listas, roer as unhas e em assistir mais filmes e séries do que parece ser possível. Tem mais projetos do que tem tempo para concretizá-los. Não curte filmes de dança, mas ama Dirty Dancing. Apaixonado por faroestes, filmes de gângster e distopias.